Exercício multinacional evidencia a evolução do treinamento aéreo e o papel estratégico do Indo-Pacífico nas operações conjuntas da OTAN.
Por Ricardo Fan – Especial para Defesanet
Durante um exercício militar realizado no Oceano Pacífico, imagens que mostravam um caça F/A-18 da Marinha dos Estados Unidos aparentemente “engajando” um F-35B britânico, operando a partir do porta-aviões HMS Prince of Wales, circularam amplamente nas redes sociais, alimentando especulações sobre um possível incidente real.
Entretanto, conforme esclarecido pelo UK Defence Journal, tratava-se de um treinamento de simulação de combate, parte de um exercício de Treinamento de Combate Aéreo Dissimilar (DACT, na sigla em inglês – Dissimilar Air Combat Training) — prática consagrada na aviação militar moderna que visa elevar o realismo e a interoperabilidade entre forças aliadas.
O significado do DACT
O DACT consiste em confrontar aeronaves de diferentes gerações, capacidades e doutrinas operacionais, permitindo que os pilotos explorem as táticas, limitações e pontos fortes de seus oponentes em condições controladas.
Essa metodologia surgiu ainda nos estágios finais da Guerra do Vietnã, quando os Estados Unidos perceberam a necessidade de treinar seus pilotos contra oponentes que replicassem o comportamento e as táticas de aeronaves inimigas — originando escolas como o lendário programa Top Gun.
Com o tempo, o DACT evoluiu para incorporar não apenas o dogfight visual, mas também elementos de guerra eletrônica, sensores em rede e furtividade, refletindo o ambiente operacional do século XXI. Atualmente, esses exercícios são essenciais para preparar pilotos a operar em cenários cada vez mais complexos e tecnologicamente integrados.
Quarta geração versus quinta geração
O confronto simbólico entre o F/A-18 — um caça de quarta geração — e o F-35B — uma aeronave furtiva de quinta geração — ilustra a integração entre doutrinas clássicas e modernas.
Para os pilotos britânicos do F-35, o desafio é evitar detecção e engajar inimigos sem se expor, enquanto os pilotos americanos do F/A-18 aprendem a detectar, rastrear e atacar aeronaves stealth em condições simuladas.
Além do ganho técnico, esses treinamentos fortalecem a interoperabilidade entre forças aéreas e navais aliadas, especialmente em operações conjuntas envolvendo diferentes plataformas embarcadas e sistemas de armas integrados.

O contexto estratégico do Pacífico
A escolha do Oceano Pacífico como cenário do exercício não é casual. A região tornou-se o epicentro das tensões geopolíticas envolvendo a expansão militar chinesa, especialmente com o avanço de seus porta-aviões e caças furtivos J-20.
Tanto os Estados Unidos quanto o Reino Unido buscam reforçar sua presença dissuasória e demonstrar capacidade de operação conjunta em cenários de alta intensidade.
Ao operar o HMS Prince of Wales lado a lado com unidades navais norte-americanas, Londres reforça sua intenção de permanecer um ator relevante no Indo-Pacífico, enquanto Washington reafirma sua liderança em coalizões multinacionais e seu compromisso com a estabilidade regional.
O episódio viral do suposto “engajamento” do F/A-18 ao F-35B britânico é, na verdade, um retrato do realismo crescente dos exercícios aéreos contemporâneos. Mais do que uma curiosidade de internet, o evento ilustra como as forças da OTAN estão adaptando suas doutrinas para os desafios do combate moderno — um ambiente onde furtividade, informação e integração entre plataformas são tão decisivos quanto a potência de fogo.
O DACT, portanto, continua sendo um dos pilares do treinamento aéreo avançado, reafirmando que a superioridade aérea do futuro será conquistada não apenas pela tecnologia, mas pela compreensão profunda do inimigo — real ou simulado.

Entenda o DACT – Treinamento de Combate Aéreo Dissimilar
Tática criada no Vietnã permanece essencial na era da furtividade e da guerra em rede.
O DACT coloca em confronto aeronaves de tipos e gerações diferentes — por exemplo, um F/A-18 enfrentando um F-35 — para que pilotos aprendam a combater adversários com características distintas das suas próprias aeronaves.
O conceito surgiu no final da Guerra do Vietnã, quando os EUA enfrentaram perdas significativas contra caças MiG norte-vietnamitas. A resposta foi a criação de programas como o TOPGUN (US Navy) e o Red Flag (USAF), que introduziram a simulação realista de combates aéreos entre aeronaves “inimigas”.
Hoje, o DACT abrange cenários de combate além do alcance visual (BVR), guerra eletrônica, e operações em rede, envolvendo múltiplas plataformas e aliados da OTAN.
Mais de cinquenta anos depois, o DACT segue sendo um dos instrumentos mais eficazes de preparo de pilotos e de integração tática entre forças aéreas ocidentais.
Glossário Técnico
Dissimilar – Dissimilar Air Combat Training
Origem: Inglês
Significado: “Diferente”, “não semelhante” ou “de tipos distintos”.
Uso militar: No contexto do DACT, refere-se a exercícios entre aeronaves de modelos, gerações e capacidades diferentes, simulando combates contra oponentes com doutrinas e tecnologias distintas.
Em contraste, o “Similar Air Combat Training” ocorre entre aeronaves idênticas, com foco em táticas padronizadas.





















