Woloszyn – A AUTONOMIA NO POLICIAMENTO OSTENSIVO: uma questão de sobrevivência institucional

Nota DefesaNet

O Analista de Assuntos Estratégicos André Luis Woloszyn traz mais um ponto sobre o o brete que resoluções do Superior Tribunal  de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) estão impondo às missões de Policiamento e Segurança Pública.

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O Editor

A AUTONOMIA NO POLICIAMENTO OSTENSIVO: uma questão de sobrevivência institucional

André Luís Woloszyn [1]

 

É imperioso retornar a discussão acerca de algumas decisões recursais no âmbito da justiça brasileira que, nas últimas décadas, vêm colidindo frontalmente contra o arcabouço doutrinário das práticas utilizadas no policiamento ostensivo, apregoadas nas escolas de formação.

Citando apenas três exemplos concretos mais recentes, o primeiro ocorrido na Bahia e julgado no STJ recaiu na necessidade da existência de elementos objetivos para a suspeita e busca pessoal, ação esta que se constitui em um dos pilares do princípio preventivo para a manutenção da ordem e tranquilidade pública. (Habeas Corpus nº 158.580 – BA)

O segundo, julgado no TJ-RS, envolvendo a Polícia Rodoviária Federal (PRF) foi a desclassificação de tentativa de homicídio qualificado quando de disparos de arma de fogo contra policiais militares durante perseguição policial ou fuga com o intuito de evitar a prisão, desde que ausente o ato de apontar ou mirar a(s) arma(s) diretamente contra estes, situação que caracterizaria a intenção (dolo) de matar. (Habeas Corpus nº 598.051 – RS)

Nesta, em particular, se considerarmos a dificuldade da mira em alvos em movimento, seja tripulando veículos em fuga ou mesmo a pé, então, nestes casos, basta uma declaração dos criminosos de que dispararam a esmo com a intenção de dificultar a abordagem policial para afastar tal qualificação, consequentemente, para um delito de menor sanção, desconsiderando o testemunho e as alegações dos policiais, desqualificando sua atuação. Poderíamos citar ainda, outras práticas atualmente desconsideradas no âmbito judicial como a figura da ofensa verbal contra a autoridade policial, denominada desacato.

O terceiro e último exemplo recaiu em decisão recursal do TSJ em caso acontecido no estado de São Paulo (Habeas Corpus nº 561.988 -SP)em que foram alunadas as provas encontradas em uma residência relacionadas ao tráfico de drogas após denúncias anônimas, pela falta de mandado judicial, portanto, configurando a invasão de domicílio. Na oportunidade, foram apreendidas grandes quantidades de maconha e uma balança de precisão além dos policiais declararem terem visualizado, da casa vizinha, uma estufa no interior do pátio da residência em questão.

Nos dois primeiros casos, restou anulada a condenação por tráfico de drogas em primeira instância, baseada na inexistência de elementos objetivos para as suspeitas. A pergunta que se faz necessária é qual a motivação destas decisões que vão de encontro aos discursos de redução da violência e criminalidade no Brasil? A única resposta de argumento lógico seria o pressuposto do emprego da violência e arbitrariedade das instituições policiais em relação a violação dos direitos fundamentais, uma questão recorrente dos críticos do atual modelo de polícia ostensiva no Brasil e das polícias ostensivas em todo o mundo.

Outra hipótese plausível para esta conjuntura é o colapso de vagas no sistema prisional brasileiro por crimes relacionados a drogas ilícitas, conforme comprovam as estatísticas oficiais anuais, o que sugere uma mudança da lei infraconstitucional. Há, ainda, os que defendem a tese de que este contexto é a reformulação de uma antiga campanha para a criação de uma nova polícia ostensiva desmilitarizada que não deverá fugir deste mesmo “modus operandi”.   

O problema é que, ao se tornarem jurisprudência, tais decisões reduzem em muito a autonomia das instituições de polícia ostensiva em favor da criminalidade acarretando um desequilíbrio de forças. Se de um lado existe uma ética de atuação das polícias, do outro, é a falta desta mesma ética que fomenta e movimenta os atos delituosos.

Ao se retirar a autonomia das polícias ostensivas esta perde uma de suas principais características de atuação aproximando-se rapidamente da polícia judiciária cuja missão se inicia somente após a ocorrência do delito, na coleta de provas técnicas e investigação de autoria.

A tendência desta conjuntura é um estado de desordem e intranquilidade pública a médio e longo prazo com fortes impactos políticos, sociais e econômicos além de um volume insuportável de processos criminais na justiça brasileira.

 


[1] Analista de Assuntos Estratégicos, Mestre em Direito, diplomado em Inteligência Estratégica pela Escola Superior de Guerra e em Segurança Digital pela Organização dos Estados Americanos (OEA)

 

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