Cosme Degenar Drummond
Diretor de Redação Defesa Latina
José Cândido era uma figura extraordinária, modesto, ético, amigo, justo e honesto. Ele jamais admitiu que a Tecnologia e Defesa fugisse de sua linha editorial. Na primeira grande crise enfrentada pela revista, em meados de 1985, ele me consultou se deveria fechar a publicação, ainda feita na ocasião em Preto & Branco, com capa em tons alaranjados e pretos e a marca totalmente em negrito. Disse que deveríamos continuar com a revista. Ele topou.
Convidados então um jornalista, professor da Faculdade Cásper Líbero, Aurélio de Abreu, de saudosa memória, e começamos a mudar gradualmente o padrão gráfico-editorial de Tecnologia e Defesa. Foi uma época muito difícil para tocar a revista, pois o segmento de defesa começava a enfrentar a enfrentar uma discriminação política sem precedente no Brasil. Publicávamos a revista com enorme atraso, perdendo assim a periodicidade regular de suas edições.
Em pouco tempo, veio a segunda grande crise na revista. Não é difícil imaginar como era o cenário no setor de defesa no Brasil, a partir dos movimentos que culminaram com a derrubada do Muro de Berlin! Com equilíbrio e determinação, José Cândido ainda conseguiu publicar mais alguns números da revista até que, para complicar, a Editora Aquarius, proprietária do título, quebrou no mercado editorial. Mesmo assim, em 1988 Tecnologia & Defesa foi consagrada pelos organizadores da DEFENDORY – Feira Internacional de Defesa realizada bienalmente na Grécia, em Atenas, como uma das 10 melhores revistas do mundo no gênero. José Cândido não viu mais futuro para Tecnologia e Defesa e decidiu transferir para mim a responsabilidade pelas edições da revista, e foi ministrar aulas de sua formação e especialidade e cuidar de outros interesses da família Fonseca. Peguei o pião na unha, apoiado por companheiros jornalistas – aliás, a revista revelou grandes talentos, ainda hoje atuantes nesse setor –, como Nelson During, hoje editor do DEFESANET, excelente portal de defesa.
A situação no mercado tornou-se era mais dramática. Em 1990, piorou bastante no Brasil. A Embraer, a Avibras e a Engesa, empresas que apostavam no potencial da revista, entraram em dificuldade financeira. Mesmo com a ajuda dos velhos amigos, a situação da revista não se normalizou. As poucas edições de Tecnologia e Defesa continuaram saindo com grande atraso.
Em meados de 1990, convidei um então técnico em Contabilidade, estudante de jornalismo na Cásper Líbero, para ser meu sócio na revista. Estilizamos a marca Tecnologia & Defesa e o meu sócio achou por bem modificar as capas das revistas, experiência que durou apenas quatro edições, publicadas num espaço de dois anos, pois o novo jeitinho não dera certo. Praticamente a revista passou a ter periodicidade semestral.
O mercado melhorou, mas a revista não dava lucro. O meu sócio tinha uma atividade adicional; era gerente de uma empresa que fabricava válvulas industriais. Eu vivia da minha parte nas vendas em bancas da revista. Novos colaboradores surgiram. Tecnologia & Defesa ganhou maturidade. Em dezembro de 2008, deixei a revista.
Um grupo de amigos que conheci no setor de defesa me incentivou a permanecer no jornalismo setorial. Convidado pela Editora de Cultura, que publica os meus livros, decidi enfrentar o novo desafio. Com base na minha experiência profissional, com a ajuda da jornalista Mirian Paglia, reformulamos o projeto e lançamos a revista DEFESA LATINA, uma nova modalidade de retratar o setor de defesa.
Ao longo dos anos, visitei o José Cândido em sua residência, na zona norte de São Paulo. Ele estava feliz, como professor. A partir de certo momento, entretanto, não o vi mais; ele mudara de endereço. Num encontro casual com sua esposa, numa agência bancária, eu soube por ela que ele tinha falecido em agosto de 2012. Deitara-se para dormir e nunca mais acordou, pois seu coração parou. Morreu dormindo.
Bons sonhos, meu amigo! Tenha a certeza de que você foi um grande mestre! Muitas passagens sobre a nossa convivência profissional, inclusive em feiras internacionais, estão registradas e permanecem vivas comigo. Quem sabe um dia eu as possa tornar públicas em livro!
José Cândido da Silva Fonseca, até algum dia!