Considerações para a base industrial de defesa no Brasil

TC Cav Rodrigo Schmidt Rodrigues

Desde a publicação da Estratégia Nacional de Defesa o Brasil pôde identificar objetivos claros em torno das necessidades relacionadas aos aspectos de Segurança e Defesa. A definição de Entorno Estratégico, bem como a atribuição de tarefas específicas a cada uma das Forças Singulares (a Marinha com o setor nuclear; o Exército com a cibernética; e a Força Aérea com o setor aeroespacial), foram fatores que puderam nortear os objetivos para o incremento de uma mentalidade de defesa no País. Ademais, a definição de objetivos claros sobre o tema trouxe demandas para a definição de ações estratégicas, bem como o entendimento de que a Defesa se constitui em assunto de Estado, agregando toda a intuitiva multidisciplinaridade que permeia o tema.

Com efeito, no ano de 2016, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) desenvolveram em parceria o Mapeamento da Base Industrial de Defesa, que traz um conjunto de informações estratégicas para o setor. O resultado desse esforço se consubstanciou em um compêndio pujante, versando sobre armas leves e pesadas; explosivos; sistemas de Comando e Controle; plataformas naval, terrestre e aeronáutica militares; sistemas espaciais voltados para a defesa; e equipamentos de uso individual. Como se pode observar, a mentalidade de Segurança e Defesa do Brasil tem passado por significativo amadurecimento. A consciência da pujança do território brasileiro – com mais de 8,5 milhões de km2, com mais de 16 mil km de fronteiras, com 10 países da América do Sul e com extensão superior a 7.000 km de litoral sobre o Oceano Atlântico – ensejou entendimento sobre o aspecto imperioso do desenvolvimento de uma consciência de Segurança & Defesa. Assim, o incremento da Base Industrial de Defesa (BID) surge como elemento capaz de fornecer às forças singulares as ferramentas necessárias à defesa da soberania nacional, bem como oportunidades de geração de riquezas por intermédio da interação entre as Forças Armadas, o empresariado e a academia.

No que concerne às Forças Armadas, atentas ao cumprimento de suas missões constitucionais, uma indústria de defesa competitiva representa elemento indutor de transformação, agregando capacidades operativas, evoluindo de acordo com o desenvolvimento da arte da guerra, e ratificando a sua inserção na Era do Conhecimento, em contraste com o formato pregresso da Era Industrial.

Para o empresariado, uma BID fortalecida oportuniza a circulação de riquezas por intermédio da geração de empregos e da lucratividade em torno de produtos que contribuirão para a Segurança Nacional.

A Academia, por sua vez, se ocupa de colimar a multidisciplinaridade já mencionada, posto que integra civis e militares no desenvolvimento de produtos de defesa necessários ao cumprimento da missão constitucional das Forças Armadas, conformando capacidade de entregar à indústria nacional projetos para a produção de Sistemas de Materiais de Emprego Militar.

Contudo, cabe trazer em consideração o monopsônio como obstáculo à sinergia ora descrita. A especificidade dos produtos de defesa podem gerar situação na qual empreendedores se sintam desencorajados a investir vultosos recursos para comercialização com as Forças Armadas, de forma exclusiva.

Com vistas a evitar tal situação, faz-se mister observar as seguintes recomendações:

  • A busca por tecnologias duais é fator capaz de fomentar a BID, uma vez que pode oferecer produtos aplicáveis tanto à defesa quanto a fins diversos comuns à sociedade, possibilitando continuidade em uma cadeia produtiva;
  • Observância ao trabalho consolidado do Mapeamento da Base Industrial de Defesa, levado a efeito pela parceria entre o IPEA e a ABDI, utilizando-o como elemento norteador para o desenvolvimento da capacidade de defesa no Brasil; • Promoção de interação crescente entre a Academia e estudiosos de Defesa das Forças Armadas, a exemplo do que vem sendo desenvolvido pelo Instituto Meira Mattos da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), que congrega pesquisadores civis e militares em prospecções científicas em gestão de defesa e estudos da paz e da guerra;
  • Observância à Lei nº 12.598/2012, que estabelece mecanismos de fomento à indústria brasileira de defesa, favorecendo a constituição de arranjos institucionais híbridos, corroborando as participações da iniciativa privada e das Forças Armadas no desenvolvimento de produtos de defesa, assistidos por permanente pesquisa conduzida pela Academia;
  • Incremento da mentalidade de segurança e defesa como tema de Estado, e não-privativo das Forças Armadas, oportunizando as interações ora descritas, bem como a sinergia capaz de, a um só tempo, gerar riqueza e incrementar capacidades operativas para a defesa nacional; e
  • Manutenção das atividades de visitas de militares a nações amigas, buscando a absorção de conhecimentos relacionados à doutrina e à obtenção de SMEM, quer por pesquisa e desenvolvimento, quer por aquisição de sistemas de prateleira.

Por fim, é essencial desenvolver o entendimento de que transformar as Forças Armadas significa disrupção, ou seja, obter novas capacidades operativas, em acréscimo aos processos de modernização e de repotencialização.


TC Cav RODRIGO SCHMIDT RODRIGUES, Natural de Porto Alegre/RS, é nascido em 30 de setembro de 1978. Incorporou às fileiras do Exército em 1996, na Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx), em Campinas/SP. Foi declarado Aspirante a Oficial da Arma de Cavalaria em 25 de novembro de 2000, na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN). Realizou o Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO), em 2009. Concluiu o Curso de Comando e Estado-Maior da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME) em 2019. Como oficial de Estado-Maior, desempenhou as funções de Chefe da 3ª Seção da 3ª Brigada de Cavalaria Mecanizada e Comandante do 5º Regimento de Cavalaria Mecanizado. É mestre em ciências militares, pela esao, e doutor em ciências militares pelo instituto meira mattos, da eceme, sendo autor da tese transformação militar na Alemanha: condicionantes iniciais, resultados preliminares e contratendências atuais. O TC Schmidt é pesquisador em Estudos Estratégicos Internacionais com ênfase nos temas Transformação Militar, Pensamento Estratégico de Defesa da Alemanha e Base Industrial de Defesa. Atualmente, serve na 4ª Subchefia do Estado-Maior do Exército.


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