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Michel Temer – No tempo eleitoral, um chamado à pacificação


Michel Temer
Presidente da República
publicado 05 Agosto 2018


Não há hoje, em toda a agenda política nacional, um tema mais premente que a paz. Tanto quanto o progresso econômico, ou o combate à desigualdade, a grande prioridade, neste momento, há de ser a reconstrução de clima de concórdia, pressuposto necessário para o encaminhamento dos demais problemas do País.

O ambiente dos últimos anos, marcado pela intransigência, se parece muito pouco com as tradições de nosso jogo político. Sempre se privilegiou a negociação.

Não é preciso a perspicácia para entender uma verdade elementar: este ambiente turbulento não é adequado para a solução das grandes questões nacionais. O Brasil não pode enfrentar eleições nesse clima, nem delas emergirá o país que queremos. Agora, na disputa eleitoral, devemos um diálogo honesto sobre a pacificação do País. Engajemo-nos nessa reflexão com o espírito desarmado, buscando ver no adversário de hoje o parceiro possível de amanhã. Quando as urnas se pronunciarem, os eleitos deverão trabalhar juntos pelo Brasil, buscando garantir a segurança das relações mediante a aplicação do disposto na Constituição.

Faço estas observações na condição de homem público a quem as circunstâncias fizeram presidente da República. E com a autoridade de quem optou por retirar-se da disputa eleitoral para dedicar-se ao esforço de recolocar o Brasil no trilho do progresso.

A História julgará acerto ou desacerto dessas opções. Sei apenas que, em circunstâncias que distavam muito do ideal, demos passos decididos para vencer a inflação e recuperar a saúde das contas públicas.

É possível e legítimo que outros atores preferissem uma mescla diversa de políticas públicas para promover idênticos objetivos. De minha parte, reconforta-me a certeza de que fiz as opções que me pareciam as corretas e contavam com maior respaldo nas tribunas livres do Congresso Nacional e da imprensa independente.

Se, a esta altura, o crescimento ainda não veio tão forte como se esperava nem a recuperação do emprego tão intensa quanto necessitamos, nada disso haveria de surpreender-nos. Ao lançar o documento Ponte para o Futuro, já advertíamos que a recuperação seria lenta e gradual. O fundamental é a convicção de que as dificuldades não nos desviarão do rumo.

Dito isso, convido o País a engajar-se na reflexão com que iniciei este artigo. Em outubro, elegeremos novo presidente da República. Renovaremos as duas Casas do Congresso Nacional, a continuidade ou renovação nos governos estaduais e nas Assembleias Legislativas. Ingressamos, portanto, no tempo eleitoral, que com o tempo administrativo perfaz as duas faces da política. É da natureza mesma da democracia que, neste momento, se agudizem os contrastes entre partidos e atores, na medida em que é aí que se oferecem ao eleitorado alternativas para o futuro do País.

Numa democracia, isso não é preocupante. Esse corrige excessos que se tenham cometido ao optar por um receituário em lugar de outros. Ocorre, no entanto, que em nosso país tem vicejado a tentação de substituir a boa pela má política. Naquela, a oposição percebe-se e é percebida como a alternativa legítima, na medida em que, a partir dos atos de fiscalizar e contrapor, ajuda na governança, enquanto constrói a plataforma que lhe permita chegar ao poder por delegação do povo. Em contraste, na política como deformação, predomina a lógica expressa de maneira tristemente célebre por Carl Schmitt para quem “toda ação e motivação política pode reduzir-se à distinção fundamental entre amigo e inimigo” (O Conceito de Político, 1932).

No Brasil, neste momento de crispação dos ânimos, um dever há de impor-se às lideranças políticas e aos detentores de outros cargos e responsabilidades. O dever de refletir se, por nossas palavras, gestos e omissões, contribuímos para que prevaleça a boa política, que dos contrastes faz emergir as soluções, ou a política como deformação, que aposta justamente no acirramento dos ânimos e do ódio para tão somente favorecer o amigo e aniquilar o inimigo.

Apostar na primeira das opções, a boa política, não é ingênuo nem avesso à natureza fundamental dos partidos (termo que, em sua acepção pura, quer dizer apenas “parte” num processo político). Pelo contrário: com a experiência acumulada em três décadas de cargos eletivos e com o respaldo de meio século de vida dedicado ao Direito Constitucional, não tenho dúvida em afirmar que o caminho é o da construção da paz. Para além da excitação das convenções partidárias, há algo que deve unir-nos num vínculo: a noção de Pátria, que urge recuperar.

Esta não é reflexão que se impõe só aos detentores de cargos eletivos. Ao concitar os brasileiros à pacificação, incluo naturalmente todos aqueles que têm por dever moral ou de ofício zelar pela harmonia que perpassa todo o edifício construído pelos constituintes de 1988.

Neste particular, falo com a autoridade de quem ajudou a construir a Carta que há 30 anos nos orienta na construção de um país mais próspero e mais justo. Como constituinte, sei bem que a pedra de toque de todo o sistema é a harmonia, que, como valor, deve sobrepor-se até mesmo aos freios e contrapesos.

Construir a desarmonia é violar a Constituição. Esta consideração deve presidir a ação de todos os agentes públicos, neste momento delicado da vida de nosso país. Mas, se o bom constitucionalismo não bastar para convencer-nos, há ainda constatação adicional, que deve calar fundo nos que, em outubro, se apresentarão ao eleitorado: o Brasil rejeita a política da discórdia e do descompromisso programático. O reflexo disso está no juízo reprobatório expressado em cada pesquisa de opinião, sobre o funcionamento de nossas instituições. Da correta compreensão desse juízo dependerá a própria legitimidade dos mandatos conquistados.

Daí porque conclamo os brasileiros e os que aspiram a dirigir o País que, após o tempo eleitoral, todos se unam no tempo administrativo para continuar a construir um Brasil cada vez melhor.

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