Luiz Eduardo Rocha Paiva
Na 2ª Guerra Mundial, quando o Brasil combatia junto aos aliados contra o Eixo nazifascista, fevereiro, março e abril de 1945 marcaram a sucessão de relevantes vitórias da FEB (Força Expedicionária Brasileira) sobre a Wehrmacht (forças armadas da Alemanha nazista).
Em 1942, o Brasil rompera relações diplomáticas com os países do Eixo, após o ataque japonês aos EUA em Pearl Harbor, cumprindo acordo de mútua solidariedade assumido pelos países americanos na Conferência de Havana, em 1940. A reação nazista foi o torpedeamento de navios mercantes brasileiros, matando mais de 2.500 irmãos.
O Brasil não estava preparado para ir à guerra, mas a dignidade nacional exigia tal resposta, pois não bastaria ceder bases militares aos aliados para lavar a honra da pátria. O envio da FEB ao front e seus feitos em campos de batalha italianos mostraram o valor de nossa gente e projetaram globalmente o país.
Há quem deprecie as vitórias da FEB por não terem sido decisivas na derrota do Eixo. Ora, ela era apenas uma das 69 divisões combatentes, considerando apenas as dos EUA na Europa, e atuava em um teatro de operações (TO) secundário. Seus objetivos foram compatíveis aos de uma divisão de infantaria a pé, sem blindados, e eram importantes para o IV Corpo de Exército (IV CEx) dos EUA, ao qual se subordinava.
O nível da FEB, como de qualquer divisão, era tático, e não estratégico. É louvável o Brasil de 1943 ter mobilizado, em um ano, 25 mil combatentes para enfrentar a poderosa Wehrmacht. Hoje, uma força de paz de mil militares para o Haiti, onde a ameaça é de gangues armadas apenas de fuzil, é preparada em seis meses.
A FEB venceu ingentes desafios até se tornar um eficaz instrumento de combate. Os EUA só entregaram o equipamento e armamento na Itália, pois eram necessários às forças aliadas em operações e era uma incógnita o envio de tropas brasileiras ao front.
Ela entrou em combate com preparação incompleta, substituindo duas divisões aliadas veteranas. Os reveses sofridos pelo exército dos EUA – quando empregado em condições semelhantes na Tunísia em 1943 – indicavam que isso teria um custo para a FEB.
A respeito da infeliz experiência norte-americana, o General Eisenhower escreveu: foi a inexperiência, particularmente dos comandantes / As divisões americanas não foram beneficiadas com os programas de treinamento intensivo / permaneceram separadas de seu armamento e de grande parte de seu equipamento durante um longo período / Os comandantes e as tropas evidenciaram os efeitos dessa anomalia / embora não lhes faltasse a coragem e o caráter sua eficiência inicial não se compara com a demonstrada / depois de um ano de treinamento.
As batalhas
A FEB atuou em um TO montanhoso, que permite a defesa com forças reduzidas, ainda mais de um inimigo aguerrido, bem equipado e experiente, considerado o exército mais profissional do mundo. Após os êxitos iniciais na aproximação dos montes Apeninos, foi empregada contra a poderosa Linha Gótica para conquistar o Monte Castelo. O fracasso anterior da ofensiva anglo-americana contra Bolonha indicava a necessidade de uma parada tática, e o início do inverno aconselhava esperar o fim da estação para retomar as operações de movimento.
O comando americano avaliou mal o valor defensivo do terreno e o poder de combate exigido para derrotar o inimigo e os efeitos das condições climáticas. O efetivo empregado nos quatros ataques a Monte Castelo, em novembro e dezembro de 1944, era insuficiente – como alertava o general Mascarenhas de Morais, comandante da FEB –, fato agravado quando um contra-ataque alemão desalojou a tropa americana que protegeria nosso flanco esquerdo.
Atacar, recuar em ordem e permanecer na frente sem ser substituída foi um mérito da FEB. Aliás, no front ocidental, poucas divisões aliadas superaram os 239 dias ininterruptos da FEB em contato com o inimigo. É claro que os reveses em Monte Castelo, os dois primeiros sob comando americano, também se deveram à nossa inexperiência e preparação incompleta.
Tais deficiências foram superadas em dezembro de 1944 e janeiro de 1945 nos confrontos entre pequenas frações no front, e não em campos de instrução à retaguarda. A conquista do Monte Castelo em 21 de fevereiro de 1945 despertou a confiança na FEB, consolidada nas vitórias de Castelnuovo, Montese e Fornovo, onde ela aprisionou a 148ª Divisão Alemã, primeira força de tal magnitude a se render na Itália.
A grande batalha da FEB foi a da Linha Gótica, rompida de fevereiro a abril de 1945. Batalhas duram semanas ou meses, e muitos desconhecem que são uma sucessão de combates, não apenas um, com avanços, interrupções temporárias e, às vezes, recuos.
Monte Castelo, um dos pontos fortes no limite avançado da Linha Gótica, foi um dos duros combates para rompê-la. Por ser apenas uma divisão, a essência da história da FEB teria de ser o combate de pequenas frações, subunidades e unidades. Soldados, cabos, sargentos, tenentes, capitães e comandantes de unidades venceram o maior desafio do guerreiro – enfrentar o fogo inimigo com equilíbrio emocional, competência e coragem.
É preciso conhecer doutrina, tática e história militar para avaliar o desempenho da FEB sem cair na servidão intelectual de aceitar, sem questionar, opiniões colhidas em fontes de metrópoles culturais. As do lado aliado, eventualmente dissimulam erros de seus comandos e, do lado ariano, relatórios costumam omitir os feitos de forças mestiças nos reveses sofridos.
A FEB mostrou a importância do culto aos valores cívicos. O amor à pátria, o sentimento do dever e a camaradagem, forjados nos riscos comuns, uniram e fortaleceram os pracinhas, impondo-se às diferenças e preconceitos de cor, credo, classe social e ideologia. Infelizmente, esta história é desconhecida dos brasileiros, confirmando as palavras do Padre Antônio Vieira (1608-1697): se servistes à pátria que vos foi ingrata, vós fizestes o que devíeis, ela o que costuma.