SIM – O Congresso deve passar a delimitar terras indígenas?

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SIM – Heresias jurídicas

Osmar Serraglio
Deputado federal (PMDB-PR) e relator da PEC
(proposta de emenda constitucional)
215/00, sobre terras indígenas.

É incompreensível que, passados 25 anos da promulgação da Constituição cidadã, ainda tenhamos controvérsias provocadas por interpretações equivocadas que ameaçam a independência dos Poderes e prejudicam o desenvolvimento socioeconômico sustentável brasileiro.

Há alguns anos, assistimos aos governos cometerem grave incompreensão do texto constitucional ao tratar de um tema fundamental: a competência para demarcação de terras indígenas. Impõe-se fazer correção urgentemente, a fim de dar segurança jurídica ao setor produtivo rural e às próprias comunidades indígenas, muitas delas guiadas por arautos de posições infundadas, boa parte deles a serviço de organizações transnacionais interessadas em brecar o crescimento do país.

O Legislativo não pode mais deixar de exercer o seu papel, sob o risco de vir rotulado de omisso. A Constituição estabelece que cabe ao Congresso dispor sobre bens da União, como são definidas as terras indígenas. Essa não é uma atribuição do Executivo. Tanto é assim que o texto constitucional diz, em seu artigo 49, inciso XVI, ser competência exclusiva do Congresso "autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais". O Congresso não só tem a atribuição de estabelecer os limites das terras indígenas, mas também de definir sobre a exploração do que nela se contenha em potencial hídrico e mineral sem sequer se submeter à sanção do Executivo.

A Constituição é igualmente clara ao preconizar que compete privativamente à União legislar sobre populações indígenas. Quando se diz que "não há índio sem terra", reconhece-se cristalinamente que, se sobre a população indígena legisla-se, atuando, portanto, o Poder Legislativo, não se pode desconectar a legislação do índio daquela da sua terra. Foi no exercício dessa competência que o Congresso aprovou o Estatuto do Índio e a instituição da Funai (Fundação Nacional do Índio).

Mas isso não é tudo. A Constituição proíbe a remoção de grupos indígenas de suas terras, salvo com o referendo do Congresso. Paralelamente, o texto diz que a administração pública obedecerá ao princípio da legalidade. Significa que o Executivo nada pode fazer se não autorizado por lei. Logo, falar que cabe a órgãos técnicos ou à Funai definir os limites das terras indígenas, atribuindo-se ao presidente da República apenas a homologação das reservas, é heresia jurídica. Se os órgãos técnicos têm alguma atribuição, é porque o Congresso lhes atribuiu.

Não se nega ao indígena o direito à terra. Ao contrário. A PEC (proposta de emenda constitucional) 215, de 2000, busca justamente garantir o pleno direito à terra. A delimitação dessas áreas é atribuição do Congresso, cabendo ao Executivo demarcá-las, o que é um ato administrativo. E não há como se demarcar o que, antes, não se delimitou.

É um equívoco se falar em ofensa ao princípio da separação de Poderes quando se insiste na exclusividade do Executivo para criar reservas indígenas. Não há dispositivo constitucional que isso afirme.

A competência da União para demarcar as terras indígenas precisa ser conciliada com outra regra, a de que as terras devolutas pertencem aos Estados. Isto é, estabelecer reserva indígena impõe, na maioria das vezes, a fixação de limites de terras devolutas. Por isso, quando sabiamente a Constituição atribui à União –e não ao Executivo– essa prerrogativa e quando preconiza que legislação é que se disporá sobre populações indígenas, está a prestigiar o preceito federativo.

Não resta dúvida sobre a competência do Congresso para legislar sobre a demarcação de terras indígenas. O resto é falsa polêmica, alimentada, às vezes financiada, com o intuito de prejudicar o Brasil.

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