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GHL – Lula e Maduro reafirmam irmandade Castrochavista

Lula da Silva recebe Nicolás Maduro, dia 29JAN2023 no Palácio do Planalto. Agência Brasil

Edgar C. Otálvora
Especial para DefesaNet



A última vez que Lula da Silva e Nicolás Maduro se encontraram, pelo menos publicamente, foi em Cuba. Raúl Castro convocou os filhos prediletos da revolução cubana espalhados pelo Continente para homenagear Fidel Castro, cujas cinzas seriam depositadas no dia seguinte, 04DEZ2016, no cemitério Santa Ifigênia, em Santiago de Cuba.

Nota DefesaNet

Relatório Otálvora: Lula e Maduro vão trocar informações de espionagem

O editor

Em 29NOV2016, o “ato de massas” de despedida do falecido Castro aconteceu na Plaza de la Revolución, em Havana, e contou com a presença de delegações estrangeiras, reis, líderes, chanceleres, embaixadores, ex-presidentes. Mas a cerimônia fúnebre da “família” aconteceu em Santiago de Cuba em 03DEZ2016 presidida por Raúl Castro, que teve Nicolás Maduro sentado à sua esquerda e Lula da Silva à sua direita.

No dia seguinte, após colocar o caixão do irmão na cova, Raúl Castro realizou uma reunião da qual participaram Lula, Maduro, Evo Morales, Rafael Correa, Dilma Rousseff, e para a qual a delegação brasileira se encarregou de deixar o devido apoio fotográfico. Com Dilma Rousseff afastada da presidência há alguns meses, Lula planejou sua volta ao poder nas eleições de 2018 sem levar em conta que os processos judiciais por corrupção que a justiça brasileira já seguia o tirariam da disputa eleitoral quando foi preso em 07ABR18. Após uma sequência de decisões judiciais de contestadas pelo petista, Lula deixou sua confortável cela no dia 08NOV2019 e imediatamente iniciou a campanha para concorrer às eleições de 2022. Em julho daquele ano, havia sido criado no México o Grupo de Puebla, uma aliança de esquerda, autoqualificado como “progressista”, no qual se congregavam as principais cabeças da esquerda continental. A ausência de Lula no início do Grupo Puebla foi coberta por Celso Amorim, que havia sido ministro das Relações Exteriores de Lula, ministro da Defesa de Dilma Rousseff e que se tornara o principal operador internacional do Lula preso.

Raúl Castro cercado por Nicolás Maduro e Lula da Silva em 03DEZ2016 na cerimônia de despedida da família Castro de Fidel. Foto: Presidência Venezuelana.

Para sua posse no dia 01JAN2023, Lula fez um convite ao camarada Maduro e ainda conseguiu que o governo cessante de Jair Bolsonaro revogasse as medidas que impediam a entrada do ditador em território brasileiro. A paranoia reinante entre os altos dirigentes do chavismo, sobre os quais pesam os mandados de captura emitidos pelo governo dos Estados Unidos, aconselhou Maduro a desistir de viajar a Brasília, onde não seria possível mobilizar seu esquema de segurança habitual.

Apenas duas semanas após a posse, Lula já havia enviado o embaixador Flavio Maciera à Venezuela, como Encarregado de Negócios, para reabrir a sede da embaixada em Caracas e restabelecer relações diplomáticas com Maduro. Desde então, várias delegações oficiais brasileiras foram recebidas no Palácio de Miraflores. Por lá passou o enviado de Lula para mudanças climáticas, o embaixador Luiz Figueiredo. Uma enorme “delegação multidisciplinar” chefiada pelo diretor da Agência Brasileira de Cooperação, embaixador Ruy Pereira, também chegou. Além dos embaixadores oficiais do Itamaraty, chegou ao palácio do governo venezuelano um velho amigo da casa e escudeiro de Lula: o chefe do MST João Pedro Stedile.

Lula da Silva e Nicolás Maduro em 03DEZ2016 em Santiago de Cuba. Ao fundo Dilma Roussef e à esquerda, João Pedro Stedile. Foto: Presidência da Venezuela

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Após a chegada à Brasília de vários voos que transportavam seguranças e membros do governo chavista, na noite de 28MAIO2023, Nicolás Maduro desembarcou na capital brasileira. Nem o Palácio do Planalto nem o Itamaraty haviam informado à mídia sobre a chegada de Maduro, que só figurava na lista de prováveis ​​participantes da cúpula sul-americana convocada por Lula para 30MAI2023.

A organização da viagem de Maduro à Brasília foi acertada no dia 08MAR2023, quando o agora “assessor especial da Presidência” Celso Amorim visitou Caracas. Desde o mês de março, a diplomacia paralela de Lula planejava realizar em Brasília um grande evento sul-americano que permitiria a retomada da agenda regional. Inicialmente, teria sido avaliada a possibilidade de convocar uma cúpula da UNASUL para confirmar seu renascimento. Esta opção teria sido deixada de lado, preferindo-se um esquema genérico de “reunião presidencial sul-americana“, em formato restrito a uma “aposentadoria” dos presidentes e sem pauta prévia, o que permitiria a Lula obter a presença de todos os líderes regionais com a desculpa genérica da integração.

Maduro desembarca na noite de 28MAIO2023 em Brasília DF

No último minuto, o Itamaraty informou aos participantes que a reunião não seria um “retiro”, mas uma reunião com a presença de presidentes, chanceleres e delegações da qual sairia também uma declaração que seria chamada de “Consenso de Brasília “.

A decisão de Lula e Maduro foi fazer o reencontro oficial coincidir com a cúpula sul-americana. Além de demonstrar a natural aliança política entre dois filhos da revolução cubana, o plano permitiria a Lula fornecer a Maduro um luxuoso tapete para seu retorno aos espaços diplomáticos regionais dos quais estava excluído desde a criação do Grupo de Lima, em 08AGO2017, como consequência da ruptura da ordem democrática na Venezuela.

A presença de Maduro em Brasília teria, então, um caráter duplo: visita oficial na segunda-feira, 29MAIO2023, e participação na cúpula sul-americana, dia 30MAIO2023. O convite a Maduro e o texto elaborado pelo Brasil como rascunho de declaração causaram desconforto entre os líderes do Equador, Uruguai e Paraguai que chegaram a Brasília reclamando da pressão de Lula para declarar o renascimento da UNASUL e obrigá-los a assumir compromissos claramente ideológicos.

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Quando Maduro desembarcou em Brasília, esperava-o sua vice-presidente executiva Delcy Rodríguez, que atua como a verdadeira gestora das relações exteriores do regime. Rodríguez e o chanceler nominal, Yvan Gil, já haviam percorrido o Caribe e chegado a Brasília como parte dos preparativos para a visita de seu chefe, até então mantida em sigilo.

Na manhã do dia 29JAN2023, Lula e sua esposa receberam Nicolás Maduro e sua esposa Cilia Flores no alto da rampa do Palácio do Planalto, que chegaram com um notável esquema de segurança. A programação incluiu uma sessão de fotos da recepção e uma sessão privada entre Lula e Maduro.

A reunião de trabalho parecia uma reunião de família e não um evento oficial.
Foto @NicolasMaduro

Um fato inusitado ocorreu na reunião de trabalho das delegações. A primeira-dama do Brasil, Janja de Lula, estava sentada à mesa de reunião à direita do marido, substituindo o chanceler Mauro Vieira. Do outro lado, Maduro sentou sua esposa Cilia Flores à sua direita e seu filho Nicolás Maduro Guerra colocou algumas cadeiras à direita. Parecia uma reunião de família e não um evento oficial. Na reunião concordaram em realizar futuras reuniões setoriais em diversas áreas, em nível ministerial, sem que haja realmente acordos específicos. A visita teve caráter político e assim foi confirmada.

Após a “reunião de trabalho” houve uma “coletiva de imprensa” que durou mais de uma hora, na qual Maduro e Lula fizeram longos discursos e responderam apenas a algumas perguntas. A “coletiva de imprensa” foi o principal evento do dia. Lula aproveitou para defender seu camarada Maduro. Mais tarde, na habitual rotina brasileira, Lula ofereceu almoço a Maduro e sua comitiva no Palácio do Itamaraty.

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Em suas intervenções à imprensa em 29MAIO2023, Lula afirmou que Maduro foi vítima de uma “narrativa” elaborada por seus inimigos. Ele atacou o agora extinto governo interino de Juan Guaidó, a quem descreveu como um “impostor“. Ele não fez nenhuma referência à violação dos Direitos Humanos na Venezuela. Ele confessou ter feito representações a seus “amigos europeus” e aos Estados Unidos para que desistissem das sanções impostas a altos dirigentes chavistas e empresas estatais. Em um momento de alucinação, afirmou que pretendia retomar a compra de energia venezuelana para abastecer o estado amazônico de Roraima, esquecendo ou ignorando que o fornecimento de energia foi suspenso devido à incapacidade do governo Maduro de garantir o funcionamento da rede venezuelana sistema elétrico. Em algumas de suas palavras, Lula também anunciou que pretende promover um novo acordo sul-americano de defesa como o criado no âmbito da UNASUL. Por enquanto, o ministro venezuelano Vladimir Padrino López se reunirá com seu homólogo brasileiro José Mucio Monteiro.

As expressões de felicidade de Maduro durante a entrevista coletiva revelaram o sucesso da visita. Seu camarada Lula, na irmandade criada e abençoada por Fidel Castro, reincorporou o ditador da Venezuela na arena política continental. Os eventuais acordos de “cooperação”, a promessa de recalcular a dívida que o regime mantém com o Brasil, os anúncios de futuros acordos em matéria energética ou agrícola são questões secundárias. Lula não costuma ver as violações de direitos humanos e o caráter ditatorial do governo cubano, nem da Venezuela, e como aconteceu no passado nos tempos de George Bush e Hugo Chávez, o brasileiro já se ofereceu para servir de ponte entre o Casa Branca e seu irmão Nicolás.

No dia seguinte ao encontro Lula-Maduro, foi publicada uma “Declaração Conjunta” sobre 55 temas. Algumas delas beiram o absurdo, como o ponto 54, onde se comprometem a “apoiar a promoção e proteção dos direitos humanos”. Outros, como o ponto 38, que parece imitar o esquema que a ditadura venezuelana está usando para se infiltrar nas agências de segurança e inteligência colombianas com a permissão do governo do Petro. Lula e Maduro prometeram “aumentar a conexão (usaram a palavra articulação) dos órgãos de inteligência” e “fortalecer as redes de informação“. [Ressaltamos a necessidade de aumentar a articulação dos dois órgãos de inteligência e fortalecer as redes de informação dos países]

Nota DefesaNet Declaração Conjunta de Brasília entre o Presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva e o Presidente da República Bolivariana da Venezuela, Nicolás Maduro Moros

Assinatura da Declaração Conjunta no dia 30MAIO2023 Foto @NicloasMaduro

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