CREDN – Audiência Pública – 18 )utubro 2001

Ata de Audiência Pública da Comissão de Relações Exteriores e

de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados.

( Brasília 18 Outubro 2001 )

Notas Defesanet: Texto integral das respostas como fornecido pelo Serviço Taquigrafia da Câmara. Marcações e negritos feitas por Defesanet .

Assunto: Debate sobre política industrial na área de defesa nacional – Programa F-X

Autoridades Presentes:

  • Tenente-Brigadeiro-do-Ar CARLOS DE ALMEIDA BAPTISTA – Comandante da Aeronáutica
  • Dr. HENRIQUE RZEZINSKI – Vice-Presidente de Relações Externas da Empresa Brasileira de Aeronáutica — EMBRAER
  • Tenente-Brigadeiro-do-Ar REGINALDO DOS SANTOS – Diretor do Departamento de Pesquisas e Desenvolvimento da Aeronáutica
  • Dr. VICENTE BICUDO – Assessor para Assuntos Estratégicos da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil — CGT
  • Brigadeiro-do-AR FERNANDO ANTONIO FERNANDES CIMA – Presidente da Comissão Coordenadora do Programa de Aeronave de Combate
  • Engenheiro JOÃO VERDI de CARVALHO LEITE, Presidente da AVIBRÁS Indústria Aeroespacial ( Convidado a participar da Mesa pelo Presidente ao longo da Reunião)

 

O SR. PRESIDENTE (Deputado Hélio Costa) – Bom dia, senhoras e senhores. Havendo número regimental, declaro abertos os trabalhos da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional. Esta reunião de audiência pública realiza-se a requerimento do Deputado Marcelo Barbieri, com a presença dos senhores: tenente brigadeiro-do-ar Carlos de Almeida Baptista, comandante da Aeronáutica, do Sr. Henrique Rzezinski, Vice-Presidente de Relações Externas da EMBRAER, do senhor tenente brigadeiro-do-ar Reginaldo dos Santos, Diretor do Departamento de Pesquisas e Desenvolvimento da Aeronáutica, do Dr. Vicente Bicudo, Assessor para Assuntos Estratégicos da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil — CGT, e do senhor brigadeiro-do-ar Fernando Antonio Fernandes Cima, Presidente da Comissão Coordenadora do Programa de Aeronave de Combate.

Inicialmente, concederei a palavra ao Sr. Carlos de Almeida Baptista, comandante da Aeronáutica, que terá o prazo de 20 minutos para promover sua exposição.

O SR. CARLOS DE ALMEIDA BAPTISTA Muito obrigado, Sr. Presidente. Sras. e Srs. Deputados, sinto-me dignificado pela oportunidade de mais uma vez representar aqui a Força Aérea. Falaremos sobre uma atividade que durante todos esses anos nos trouxe grande prazer e muito orgulho, qual seja, a de levar o nosso complexo científico-tecnológico ao ponto em que se encontra. Acompanham-me aqui o brigadeiro Reginaldo dos Santos, Diretor do Departamento de Pesquisas e Desenvolvimento, cargo que tive a honra de assumir há alguns anos — o oficial também trabalhou como meu vice-chefe —, e o brigadeiro Cima, Diretor do Subdepartamento de Programas e Projetos. Portanto, o brigadeiro Cima, como coordenador principal, poderá contribuir para o melhor esclarecimento das questões que V.Exas. com certeza formularão a respeito do programa.

Sr. Presidente, elaborei um estudo generalizado sobre nossas atribuições com relação ao assunto da política industrial, mas efetivamente vou ficar preso aos vinte minutos destinados à exposição. Distribuirei o texto completo, mas vou pular alguns itens que talvez não interessem objetivamente à reunião de hoje. No entanto, solicito a V.Exa. que inclua na ata da reunião o teor completo da minha exposição, para esclarecimento dos demais Parlamentares. Seria bom que todos tomassem conhecimento do texto, que contém informações interessantes.

Feito este preâmbulo, passo ao objetivo final da minha apresentação, antes agradecendo ao Exmo. Sr. Deputado Marcelo Barbieri a oportunidade de mais uma vez comparecer a esta Comissão, agora com a finalidade de participar do debate a respeito da política industrial na área de Defesa Nacional. Esse tema, em tão boa hora levantado por V.Exa., é de grande importância para o Ministério da Defesa, em particular para o Comando da Aeronáutica, que, como Arma essencialmente tecnológica, tem no fortalecimento da indústria de defesa e da indústria aeroespacial, bem como do complexo científico-tecnológico, as bases de sustentação da Força Aérea Brasileira.

Cito a importância do complexo científico-tecnológico porque, na visão da Aeronáutica, a discussão da política industrial para a área de defesa passa obrigatoriamente pela discussão também de uma política de pesquisa e desenvolvimento que forneça os alicerces seguros para a sustentação e o crescimento dessas indústrias.

Inicio esta apresentação citando a Constituição Federal, que, no seu art. 218, preconiza:

Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas.

Dentro da Política de Defesa Nacional, em sua orientação estratégica, também podemos encontrar elementos que indicam que não falta em nosso arcabouço legal fundamentação para que o Estado participe com vigor do incentivo ao setor industrial de defesa nacional, como podemos verificar:

É essencial o fortalecimento equilibrado da capacitação nacional no campo da defesa, com o envolvimento dos setores industrial, universitário e técnico-científico.

O desenvolvimento científico e tecnológico é fundamental para a obtenção de maior autonomia estratégica e de melhor capacitação operacional das Forças Armadas.

Essa política também inclui o seguinte objetivo:

Buscar um nível de pesquisa científica, de desenvolvimento tecnológico e de capacidade de produção de modo a minimizar a dependência externa do País quanto aos recursos de natureza estratégica de interesse para a sua defesa.

Srs. Deputados, há vários eventos históricos que nos trazem muito orgulho, como, por exemplo, a história da criação da Aeronáutica e a atuação do Marechal Casimiro Montenegro Filho e do então tenente Nélson Freire Lavenére-Wanderley, que saíram do Rio de Janeiro e chegaram a São Paulo conduzindo a primeira mala postal brasileira. O Marechal Casimiro também foi o homem responsável pela implantação do Instituto Tecnológico da Aeronáutica — ITA. Tais fatos deram origem a toda a capacidade industrial no Vale do Paraíba.

Cito também algumas conquistas em termos de fabricação de aviões, para chegar finalmente ao EMBRAER 145, vendido no mundo inteiro. Neste momento, em algum lugar do globo, com certeza está decolando um produto nacional, seja um avião Bandeirante, seja um Brasília, seja um EMBRAER 145. Atualmente, as indústrias do setor aeroespacial brasileiro, tais como: EMBRAER, AVIBRÁS, MECTRON, CELMA, AEROELETRÔNICA, HELIBRÁS, ATECH e outras de menor porte, situadas principalmente na área geográfica de influência do CTA, em São José dos Campos, produzem aeronaves comerciais e de combate, aviões leves, helicópteros, foguetes de sondagem e de aplicação espacial, satélites, equipamentos e sistemas de defesa, mísseis, radares, sistemas de controle de tráfego aéreo e proteção ao vôo, sistemas e equipamentos do segmento solo para satélites e equipamentos aviônicos de bordo.

Está em curso, por autorização do Exmo. Sr. Presidente da República, o Programa de Fortalecimento do Controle do Espaço Aéreo Brasileiro, com a finalidade de revitalizar a frota da Força Aérea. O principal projeto desse programa é a AL-X, aeronave leve de ataque. Trata-se de um modelo Supertucano, destinado ao policiamento do espaço aéreo na região amazônica, em proveito do SIVAM, e à formação das equipagens de combate, em substituição aos aviões modelo Xavante. Esse projeto, contratado pela Aeronáutica à EMBRAER, deverá gerar aproximadamente dois mil empregos no setor e cerca de 100 milhões de dólares de exportação nos próximos cinco anos.

Outro projeto em curso na EMBRAER é o de modernização das aeronaves F-5 e, no próximo ano, AM-X. Dois projetos, porém, tendo em vista a sua complexidade tecnológica e o pequeno número de produção, não poderão ser desenvolvidos no parque industrial aeroespacial brasileiro. Trata-se da modernização das oito aeronaves de patrulha P-3 e das aeronaves de superioridade aérea F-X. Essas últimas, as aeronaves F-X, por razões de limitação tecnológica e de viabilidade econômica, deverão ser adquiridas prontas, sendo a participação da indústria nacional, mesmo no caso da escolha da aeronave Mirage 2000, ofertada pelo consórcio EMBRAER/DASSAULT, restrita à integração de alguns equipamentos específicos da FAB e a intervenções no seu software.

De qualquer forma, seja qual for a aeronave a ser escolhida, a Aeronáutica, por meio de um mecanismo de compensação comercial, industrial e tecnológica denominado offset, repassará ao parque industrial brasileiro carga de trabalho e acesso a tecnologias em valor equivalente aos gastos feitos no exterior.

Além desses projetos, a Aeronáutica está presente também no setor espacial, produzindo uma família de foguetes de sondagem, com exportações inclusive para a Alemanha, e de foguetes lançadores de satélites, cujo principal produto, o VLS, deverá ter a sua terceira unidade lançada no próximo ano. Cerca de cem empresas nacionais participam do desenvolvimento e da produção do VLS. O programa espacial brasileiro é de tal forma importante que merece apresentação especial para poder ser detalhada toda a sua história.

Na parte bélica, a Aeronáutica está desenvolvendo armamentos sofisticados, tais como bombas especiais, sendo que os que estão agregando maior conteúdo tecnológico são os mísseis ar-ar Piranha e os anti-radiação.

A história da indústria aeroespacial está visceralmente unida à do Ministério da Aeronáutica e à vida de homens, civis e militares, que sonharam, ousaram e tiveram a coragem e a capacidade de construir esse enorme patrimônio econômico, social e científico-tecnológico, de valor estratégico inestimável para o Brasil.

Senhores membros desta Comissão, não faltam ao nosso País boas intenções nem legislação de base que dê suporte a ações concretas em benefício do setor de defesa, no qual se inclui, com particular importância para a Aeronáutica, a indústria aeroespacial. Essa indústria, assim como a de defesa, de modo geral, mantém todas as suas características em um patamar extremo, aliando a alta densidade tecnológica dos seus produtos com a exigência de vultosos investimentos em pesquisa e desenvolvimento.

Vale lembrar que esses setores apresentam características econômicas e tecnológicas próprias. A indústria aeronáutica, por exemplo, tem dinâmicas competitivas bastante diferenciadas para atender aos seus mercados civil e militar.

Para as aeronaves militares, à semelhança da indústria de armamentos, é o desempenho do produto que orienta a decisão de aquisição, sendo a capacidade de inovação fortemente influenciada por fatores externos à empresa, cuja administração se situa na órbita estatal, por ser o Estado o único comprador. Observa-se o contrário no mercado de aeronáutica civil, onde as decisões de compra são tomadas por consumidores individualizados.

Nessa indústria, os produtos devem atender a rígidos padrões de qualidade, confiabilidade e desempenho, possuindo elevado valor unitário e alto valor agregado, sendo fabricados em séries relativamente pequenas. O setor industrial aeroespacial foi o primeiro a adotar processos automatizados de projeto e manufatura dos componentes que integram o produto final. A exigência de rígidos padrões de qualidade e confiabilidade dos seus produtos, mais do que a diminuição dos custos de produção, foi a causa do pionerismo. Foi também o primeiro a introduzir nos seus produtos dispositivos informatizados de controle, inaugurando a tendência à miniaturização dos seus componentes.

Na fase de montagem, no entanto, a indústria aeronáutica é menos afetada pelas tendências à mecanização da produção do que, por exemplo, a indústria automobilística. A razão é a necessidade de manter os altos padrões de qualidade e confiabilidade em linhas de produtos com séries reduzidas e alto valor unitário. Essas características fazem com que esse segmento industrial adote meios de produção quase artesanais, com utilização intensiva de mão-de-obra altamente qualificada.

Assim, a indústria aeroespacial caracteriza-se mundialmente pelos seguintes aspectos:

  • é geradora de produtos que exigem, para seu desenvolvimento, grande volume de capital e razoável tempo de maturação, com investimentos que demandam longo prazo para retorno;
  • seus produtos são normalmente complexos, sofisticados e com acelerada obsolescência, exigindo constante investimento em tecnologia de ponta;
  • utiliza processos de fabricação com baixíssima escala de produção, que restringem a utilização de processos de automação;
  • utiliza intensivamente mão-de-obra de altíssima qualificação, com a conseqüente remuneração diferenciada;
  • seus produtos, processos e tecnologias normalmente possuem características duais, ou seja, têm possibilidade de, quando desenvolvidos para uso militar ou aeroespacial, serem facilmente transferíveis para uso civil;
  • pela sua importância estratégica, é, em todos os países, intensamente apoiada pelos Governos na fase de desenvolvimento, industrialização e comercialização;
  • seus clientes são, na quase totalidade dos negócios, os Governos nacionais ou estrangeiros;
  • não sobrevive sem um setor de produtos militares — uma das poucas exceções conhecidas, a empresa aeronáutica holandesa FOKKER, faliu em 1997;
  • os custos de pesquisa e desenvolvimento dos produtos militares são totalmente financiados pelo comprador, o Estado;
  • recebe, nos países desenvolvidos, de 30% a 70% de todos os recursos governamentais destinados a pesquisa e desenvolvimento. Dois terços dos investimentos do Governo dos Estados Unidos em pesquisa e desenvolvimento são destinados às indústrias de defesa, sendo a maioria absoluta dos recursos carreados para o setor aeroespacial;
  • com exceção dos Estados Unidos, nenhum país possui mercado suficientemente grande para arcar sozinho com os custos de desenvolvimento de aeronaves civis; e
  • com exceção dos Estados Unidos, nenhum país tem atualmente condições de viabilizar sozinho, em termos de economicidade, os custos de desenvolvimento de aeronaves militares de alto desempenho.

No Brasil, como vimos anteriormente, o desenvolvimento do atual parque industrial aeroespacial caracterizou-se pelo decisivo papel do Estado, representado pelo então Ministério da Aeronáutica. As condições viabilizadoras da estratégia tecnológica seguida pelo setor começaram a se materializar com a criação do CTA e do ITA. Foi a existência de generoso e continuado apoio do Estado para a formação de recursos humanos de alto nível e para a realização de pesquisa básica e aplicada, sem precedentes na história do desenvolvimento tecnológico e industrial do País, que viabilizou o nascimento da indústria aeroespacial brasileira, com uma estratégia voltada para a autonomia tecnológica.

Essas empresas, sendo a EMBRAER o seu exemplo mais significativo, desenvolveram-se com base na aquisição de capacitação, combinando o conhecimento localmente desenvolvido e o obtido mediante acordos de transferência de tecnologia, consultoria externa ou licenciamento. Esse desenvolvimento não foi baseado na estratégia de importar "pacotes tecnológicos" a serem posteriormente abertos e adaptados às condições locais por meio do que se convencionou chamar de "engenharia reversa". No caso da EMBRAER, houve uma sólida capacitação em pesquisa aplicada e contínua preocupação com a formação de recursos humanos capazes de se apropriarem de soluções tecnológicas específicas. Essas medidas viabilizaram o nascimento e o fortalecimento da indústria aeroespacial.

No entendimento da Aeronáutica, para que se possa implementar uma política industrial eficaz para os setores de defesa e aeroespacial e torná-los competitivos, as principais ações do Estado são as seguintes:

1) Financiamento de vendas. – A competitividade do segmento industrial de defesa, particularmente o aeroespacial, caracterizado por produtos de alto valor final, depende fundamentalmente do estabelecimento de linhas de financiamento ao comprador, estabelecidas em bases internacionais. Devem, portanto, ser preservados e aperfeiçoados os atuais mecanismos de financiamento oferecidos aos compradores estrangeiros pelo BNDES por meio do Programa Especial de Estímulo às Exportações — PROEX, que proporcionam aos nossos produtos condições de competição no campo internacional.

2) Normalização dos orçamentos – A expressiva diminuição dos orçamentos destinados às Forças Armadas, principais clientes dos produtos do setor de defesa e aeroespacial, ocasiona a migração das compras para outros países, alavancadas pela necessidade de obtenção de financiamentos externos. Atualmente, as Forças Armadas, em particular a Aeronáutica, em função da falta de recursos orçamentários suficientes para atender às suas necessidades de aquisição, somente conseguem viabilizar seus projetos mediante o suporte de financiamentos externos. Os financiamentos, em sua maioria, são fornecidos pelos próprios países vendedores para suporte às suas exportações. Tal processo compromete gravemente o País, e a indústria nacional em particular, pois o desenvolvimento no exterior de itens de alta tecnologia faz com que o contribuinte brasileiro financie o desenvolvimento tecnológico de outros países e gere, também no exterior, empregos de alta qualificação. É necessário, portanto, que os projetos de aquisição sejam sustentados por recursos orçamentários, proporcionando a possibilidade de maior investimento nas empresas nacionais.

3) Previsibilidade orçamentária. – Os projetos de desenvolvimento e produção de materiais de defesa, principalmente os aeroespaciais, demandam longos prazos, chegando, nos casos mais complexos, a exigir até dez anos para a sua conclusão. Nesses casos, é de grande importância que os projetos tenham prioridade nos orçamentos anuais, evitando-se interrupções e permitindo-se previsibilidade para os investimentos nas indústrias do setor de defesa e aeroespacial.

4) Apoio político e diplomático à comercialização. – O crescimento e o êxito das indústrias de defesa e aeroespacial brasileiras que competem no mercado mundial encontram e encontrarão, de forma crescente, pressões antagônicas por parte dos países do Primeiro Mundo. Tal cenário exige acentuado esforço de parceria determinada e integrada entre essas empresas e o Governo, na busca de informação e acompanhamento das oportunidades no exterior. Além disso, requer uma atuante articulação entre órgãos governamentais em todos os níveis, envolvendo a Presidência da República, a Câmara de Comércio Exterior, o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, entre outros.

5) Linhas de financiamento para pesquisas e desenvolvimento. – Um dos aspectos típicos da indústria de defesa e aeroespacial é o elevado valor da pesquisa e do desenvolvimento dos seus produtos, associado a um longo tempo de duração até a produção e a comercialização final do bem. Torna-se então necessário que sejam criadas fontes e formas de financiamento para pesquisa e desenvolvimento, a custos baixos, compatíveis com a natureza da atividade e associadas a mecanismos de garantias adequados.

6) Linhas de financiamento de capital de giro. – É importante também a criação de fontes adequadas de financiamento do capital de giro, compatíveis com as margens dos negócios do setor.

7) Modernização da legislação tributária. – O setor da indústria de defesa e aeroespacial necessita operar, em termos de legislação tributária, nas mesmas condições em que operam as indústrias competidoras internacionais. Alguns exemplos de mecanismos possíveis de serem implementados são:

  • desoneração das despesas de pesquisas e desenvolvimento do lucro tributável;
  • garantia financeira de tributos suspensos para a assistência técnica ou a modernização de produtos;
  • isenção total de impostos na exportação de produtos de defesa e aeroespaciais.

8) Exigência de compensação comercial (offset). – Nos casos em que, em razão da viabilidade técnica ou econômica, não seja possível a aquisição de itens ou serviços de alta complexidade tecnológica ou de material de emprego militar na indústria nacional, deverão ser exigidas das empresas estrangeiras contrapartidas para as empresas nacionais do setor, visando não só manter sua capacitação como também auxiliar no equilíbrio da balança de pagamentos. O Comando da Aeronáutica já dispõe de legislação a respeito desse assunto e vem exigindo, nos seus contratos de aquisição, a compensação comercial, industrial e tecnológica, conhecida mundialmente como offset. Essa matéria deve ser objeto de análise por parte dos senhores legisladores, de forma a permitir a sua introdução na Lei de Licitações, o que forneceria o mecanismo legal para o estabelecimento e a implementação de uma política de exigência de contrapartidas.

9) Modernização da infra-estrutura científica e tecnológica. – A viabilização do setor foi possível graças a uma política de longo prazo do Comando da Aeronáutica, que resultou em grande conhecimento acumulado e na formação de recursos humanos pelo CTA e posteriormente pelo INPE. Um órgão de fundamental importância para a indústria aeroespacial é o Instituto de Fomento e Coordenação Industrial — IFI, do CTA, responsável, dentro da União, pela execução dos serviços de certificação aeronáutica, inclusive perante entidades congêneres estrangeiras, tais como FAA, dos Estados Unidos, JAA, da Europa, e outras.

Como já mencionado, uma das características mais marcantes do setor de defesa é o fato de exigir sempre longos prazos e vultosos investimentos para as fases de pesquisa e desenvolvimento, industrialização e comercialização. Grandes volumes financeiros de investimentos e longos prazos de maturação e retorno são duas realidades que, quando combinadas com políticas governamentais pouco definidas ou de curto prazo, sujeitas a conjunturas políticas cambiantes, fazem crescer de forma assustadora os riscos do empreendimento, muitas vezes tornando-o inviável.

As políticas e, conseqüentemente, as estratégias definidas para o segmento industrial aeroespacial e de defesa devem contemplar cenários com profundidade mínima de uma década. A execução, de forma contínua e planejada, de um programa de aquisições que mantenha permanentemente mobilizadas as indústrias de defesa e aeroespaciais é a forma de incentivo mais completa e eficaz que o Governo pode fornecer-lhes.

Um aspecto importante que não pode ser negligenciado é a necessidade imperiosa de que os projetos de aquisição de produtos de defesa estimulem a participação das indústrias nacionais nas fases de desenvolvimento desses produtos.

Uma política industrial clara, objetiva e principalmente duradoura é fator indispensável para o setor industrial de defesa e aeroespacial.

Srs. Deputados, ao analisarmos as características do setor aeroespacial, podemos constatar que se trata de um setor estratégico para o desenvolvimento científico-tecnológico do País, por ter a capacidade de gerar conhecimentos em áreas de ponta e por seu efeito indutor de desenvolvimento em todo o parque industrial nacional. Outra característica do setor, já ressaltada, é a de que, por suas peculiaridades, somente adquire condições de sobrevivência quando o Estado possui políticas eficazes de apoio e incentivo, em suas diversas formas.

Encerro a minha explanação citando um conceito emitido pelo Exmo. Sr. Presidente da República em discurso público proferido por ocasião do lançamento do EMBRAER-145, em 18 de agosto de 1995:

"Muitas vezes o apoio governamental à indústria aeroespacial é mal compreendido, pelo falso raciocínio de que um País com sérios problemas como o Brasil não deveria dedicar recursos a atividades que parecem tão distantes das necessidades diárias de seu povo. E esse raciocínio é falso porque, no mundo de hoje, poucos instrumentos têm mais eficácia tecnológica e mais retorno social e econômico do que as atividades espaciais, para um país de dimensões continentais como o Brasil.

Os efeitos multiplicadores da indústria aeroespacial se fazem sentir em grande parte do parque industrial brasileiro, que, para responder às encomendas, adota padrões cada vez mais sofisticados de qualidade e de precisão no processo de fabricação, tornando-se, assim, crescentemente competitivo no mercado mundial.

E conclui o Sr. Presidente:

"É importante ressaltar, também, que a Força Aérea Brasileira deve ter como seu sustentáculo a Indústria Aeronáutica Nacional. A defesa de nosso território não comporta improvisações, necessita planejamento e atualização constante, apoio orçamentário e credibilidade militar

. Assim, o reconhecimento e o apoio do Governo não podem ser apenas retóricos."

Srs. Deputados, muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Hélio Costa) – Antes dar prosseguimento à reunião, convido o Sr. João Verdi de Carvalho Leite, Presidente da AVIBRÁS Indústria Aeroespacial, para participar da Mesa.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Hélio Costa) – Quero fazer uma proposta aos Deputados e aos membros da Mesa. Esta audiência pública foi solicitada pelo Deputado Marcelo Barbieri em razão da licitação feita pelo Ministério da Defesa para o reaparelhamento da frota de aviões de caça da Força Aérea Brasileira. Tivemos a preocupação de convidar para esta reunião não só os representantes da área ministerial, como o comandante da Força Aérea do Ministério da Defesa, que está presente, mas também representantes da indústria. Há três semanas pedimos o comparecimento do Presidente da Confederação Nacional da Indústria — CNI, o Deputado Moreira Ferreira, do Diretor Científico da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo — FAPESP e do Presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos — ABIMAQ.

Julgo absolutamente importante a presença do Presidente da ABIMAQ. Foi ele quem disse que a Associação, só este ano, teve um prejuízo da ordem de 8 milhões de dólares, em razão dos acordos feitos pelo Governo brasileiro para salvar a Argentina da crise econômica. Há três semanas foi o primeiro a confirmar a presença aqui, e ontem, por telefone, disse que não poderia vir. Mais tarde enviou um fax. Tentei o dia inteiro, por meio de contatos telefônicos, trazê-lo a esta audiência. Não se pode cancelar na véspera, por telefone, a participação em uma tão importante reunião da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional. Isso tem que ser feito com tempo suficiente para que a Presidência da Comissão tenha condições de convidar outro representante do setor.

Fica registrada a minha preocupação, muito embora tenha recebido o fax do Sr. Luiz Carlos Delben Leite. Ontem de manhã ele disse, em ligação telefônica, que não poderia comparecer. Perde, lamentavelmente, a indústria de máquinas. E foi em função de uma declaração dele que começamos a pensar nesta audiência pública. Inicialmente, para não ficarmos apenas na área governamental, senhor comandante da Aeronáutica, passo a palavra ao Dr. Vicente Bicudo, que é Assessor para Assuntos Estratégicos da Central Geral dos Trabalhadores — CGT.

Possivelmente haverá um contraponto no debate, que prosseguirá depois. Com a palavra o Dr. Vicente Bicudo.

Dr VICENTE BICUDO ( CGT ) – Cumprimento os presentes e agradeço aos senhores o convite. Represento o Sr. Antônio Neto, Presidente da CGT no Brasil, que, em razão de compromisso inadiável de representação no fórum, não pôde comparecer.

Primeiramente, falo da felicidade de participar desta reunião, bem plantada, como muito bem mencionado pelo brigadeiro Baptista, pelo Deputado Marcelo Barbieri na véspera do 19 de outubro, data em que se comemora o centenário da dirigibilidade. Foi Santos Dumont, há 100 anos, a se completarem amanhã ( 19 Outubro 2001 ), que, em Paris, ganhou o Prêmio Deutsch, criado pelo Barão Deutsch de La Meurthe. Partindo de um determinado ponto em Saint-Cloud, contornou a Torre Eiffel e voltou ao ponto de origem em menos de trinta minutos, e o prêmio foi-lhe concedido. Tratava-se de prêmio valiosíssimo, que Santos Dumont gastou da seguinte maneira: deu metade para os funcionários que o ajudaram, e a outra metade deu ao Chefe de Polícia de Paris, que pagou a devolução das ferramentas dos pobres de Paris, que estavam penhoradas.

Foi o segundo prêmio que Santos Dumont ganhou, mas foi a primeira façanha de dirigibilidade aérea da história da humanidade. O Pai da Aviação, em 1906, fez o primeiro vôo em aeronave mais pesada do que ar, o que uniu o mundo.

O avião foi a invenção mais importante dos últimos séculos para a humanidade, porque encurtou as distâncias. E foi uma conquista brasileira, como a EMBRAER, essa grande empresa exportadora que tanto nos orgulha, geradora emprego e tecnologia, como bem disse o brigadeiro Baptista. Além disso, a EMBRAER ajuda outros segmentos industriais do País. Portanto, é importante comemorarmos, no dia 19 de outubro, esses dois destaques, a EMBRAER e o centenário da dirigibilidade aérea.

Observo a política industrial com uma lente um pouco maior do que a do brigadeiro Baptista, porque tivemos a oportunidade de adquirir uma ampla vivência no setor. Vou falar do velho Ford. Quando nasceu a indústria, os operários não tinham descanso semanal nem férias, que dirá décimo terceiro. Não havia regras estabelecendo oito horas diárias de trabalho, nem hora extra, nada disso. A indústria, é claro, causou tumultos. O Congresso americano considerou que a indústria atrapalhava socialmente o País. Ford foi ao Congresso enfrentar a situação, do mesmo modo como aqui estamos, e disse: "Tomem as minhas máquinas e construirei outras não tão obsoletas; tomem as minhas fábricas e construirei outras mais modernas; mas me deixem os operários. Com a experiência deles construirei a Ford do futuro".

A formação de uma equipe qualificada, especializada, como a de todo o segmento bélico, aeronáutico ou aeroespacial, não se realiza em dez anos. As oficinas das nossas companhias aéreas estão cambaleando, porque pagam 36% de impostos e competem com as companhias estrangeiras, que pagam apenas 9%.

Além disso, empresas como a VASP, a VARIG e a TAM dispõem de um parque de manutenção que representa um patrimônio de recursos humanos e de equipamentos. Tais recursos podem ser mobilizadas em caso de emergência, desde que as empresas sejam mantidas.

Temos de nos lembrar, no momento em que anexamos o problema de recursos humanos à segurança nacional, do parque de manutenção das companhias aéreas. As oficinas de manutenção são tão boas que a GE comprou a da VARIG no Galeão, bem como a oficina de motores em Petrópolis ( CELMA ). A GE adotou essa política em todo o mundo, e comprou oficinas da British Airways e de outras empresas na Europa. Trata-se de uma questão de política industrial.

Nesse setor, cito como exemplo o campo ferroviário. Ora o Governo compra, ora não; são criadas fábricas para atender a um pedido; operários fazem cursos de especialização; é contratada mão-de-obra para fazer horas extras para cumprir determinado prazo, e depois os funcionários são dispensados. Tal desequilíbrio gera um alto custo, e quem paga é o Governo. É o povo quem paga pela falta de planejamento.

Na indústria aeroespacial também há carência de planejamento. Conforme conversávamos há pouco com o brigadeiro Cima, é necessário manter principalmente o desenvolvimento de projetos de recursos humanos, dar continuidade à equipe que vai enxergar o futuro e levar toda a tropa à frente. O progresso estará descortinando novos horizontes e equipando, estruturando a Nação. Falta política industrial. Só me lembro de ter participado de um projeto nesse sentido, e como mero desenhista, quando de alguns projetos do Instituto Superior de Estudos Brasileiros — ISEB, implantado à época do Governo Juscelino. Houve também o grupo de planejamento formado por Diogo Gaspar durante o Governo Estadual Carvalho Pinto.

Temos, por exemplo, cooperativas agrícolas, mas não existe legalmente nenhum estatuto para cooperativa industrial. Isso baixaria os custos de produção para a pequena e a microempresa. Mesmo na indústria aeroespacial há setores, como, por exemplo, o de fibra de carbono, que necessitam de mão-de-obra qualificada intensiva, o que gera bastantes empregos.

A especialização é feita às vezes em pequenas empresas. Nos Estados Unidos há diversos minors groups, empresas pequenas, que se juntam em cooperativas. Aqui, falta não só a cooperativa como também a política industrial. Por exemplo, a Metal Leve, do empresário José Mindlin, fabricava pistões para aeronaves e exportava inclusive para os Estados Unidos, dentre outros países. Com a entrada das multinacionais no campo automobilístico, com o grosso do faturamento da Metal Leve, o próprio Mindlin afirmou que vendeu a empresa para não ter de fechá-la, como aconteceu com a Kasinsky/Cofap e com a Teka, cuja parte técnica comandei. Fechamos. Com todo o esforço tecnológico, entrou uma fábrica especializada em pistões de fora, no caso da Metal Leve — mas fazer pistão para aeronave não é interessante, porque a matriz lá fora não contempla essa política. Ficamos, portanto, aleijados por falta de uma gestão, de um planejamento estratégico de nossa política industrial, do que carecemos.

Espero que esta iniciativa dos Deputados Barbieri e Hélio Costa seja um nascedouro, que esta Mesa seja o berço do futuro nesta terra de Santos Dumont, e que se contemplem os esforços de indústrias pequenas como a PRONOR, que desenvolve compostos plásticos do óleo da mamona. Como V.Exa. bem lembrou, nosso VLS, Veículo Aeroespacial, é feito com plástico biodegradável, e provavelmente, pelo que sei e ouvi da NASA, é o único foguete espacial com essa tecnologia. A PRONOR está fazendo a tinta que impede que o veículo ou a embarcação seja detectada pelo sonar. Está desenvolvendo também a não-detecção por radar.

Tudo isso é desenvolvido pelos nossos recursos humanos. Entretanto, observamos que no CTA e no ITA profissionais com profundo conhecimento tecnológico, que podem gerar empregos e desenvolvimento para este País, aposentam-se com 1.200 reais por mês. No CTA e no ITA, quem possui PhD ou até mais alta formação tem salários muito baixos. Esta Nação precisa plantar para colher, apostando no homem que a constrói. Agradeço a todos, e declaro que nossos empregos e nossa segurança estão principalmente em nossos recursos humanos. Também em relação aos empregos há total carência de política salarial, principalmente no CTA, que é o berço gerador de toda essa tecnologia.

Era o que tinha a dizer.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Hélio Costa) – Muito obrigado, Sr. Vicente Bicudo.

Passo a palavra ao Exmo. Sr. Henrique Rzezinski, Vice-Presidente de Relações Externas da EMBRAER.

Dr HENRIQUE RZEZINSKI Vice-Presidente de Relações Externas da EMBRAER.

– Sr. Presidente, Deputado Hélio Costa; senhor comandante da Aeronáutica, brigadeiro Baptista; brigadeiro Reginaldo, brigadeiro Cima, Sr. Bicudo, Deputado Marcelo Barbieri, Sras. e Srs. Deputados, senhoras e senhores, é com grande satisfação que compareço a esta Comissão, atendendo a convite para debater e transmitir o entendimento da EMBRAER no que se refere a uma política industrial na área de Defesa Nacional. Dado seu impacto inquestionável nos rumos do desenvolvimento de uma Nação, acredito que a tecnologia aeroespacial seja considerada estratégica nos poucos países que detêm o domínio do ciclo tecnológico completo, que compreende desde a concepção, passando pelo desenvolvimento, pela industrialização e finalmente pelo suporte, sendo todo esse processo extensamente apoiado pelos Governos, mediante políticas diferenciadas. Felizmente, o Brasil pode ser incluído nesse pequeno rol de países.

O apoio governamental e os suportes institucionais destinados a esse setor são plenamente justificados pelo nível de complexidade e sofisticação, pela célere obsolescência da fronteira tecnológica, pela necessidade de renovação constante dos produtos e principalmente pela dualidade da sua aplicação, civil e militar. Dentre esses produtos podemos citar aviões, helicópteros, motores, sistemas de defesa, mísseis, munições, satélites, veículos lançadores e outros.

Um benefício substancial que por si só legitima o apoio governamental ao setor aeroespacial decorre do fato de que as inovações por ele geradas são rapidamente transferidas para uso civil e comercial em outros setores, proporcionando avanços substantivos para o bem-estar das sociedades que os desenvolvem. Esses avanços são chamados spin-offs. Inovações como a eletrônica embarcada, a tendência à miniaturização de componentes eletrônicos, a difusão de dispositivos informatizados, as máquinas de controle computadorizadas, os sistemas de desenho, engenharia e manufatura computadorizada e materiais compostos são algumas das tecnologias que foram desenvolvidas nesse âmbito. Essas aplicações podem ser ilustradas em muitos dos avanços observados em telecomunicações, transporte, energia, sensoriamento remoto, meteorologia, medicina e agricultura. Conseqüentemente, não só os países detentores de uma indústria aeroespacial madura mas também aqueles que vêm implementando esforços para constituir tal estrutura tecnológica têm demonstrado crescente preocupação com a formulação de políticas industriais ou com a formação de visões estratégicas de longo prazo que assegurem a competitividade e o futuro desse setor.

O setor aeroespacial é caracterizado pela alta densidade tecnológica de seus produtos e vultosos investimentos efetuados em pesquisa básica aplicada, em desenvolvimento experimental e, muito importante, em formação de pessoal. Ele é dividido basicamente em três grandes segmentos: Aeronáutica Civil, Defesa e Atividades Espaciais Civis, e apresenta características econômicas dinâmicas e tecnológicas próprias, atuando como integrador de conhecimentos multidisciplinares, com produtos de longo ciclo de desenvolvimento.

As atividades aeroespaciais estão relacionadas ao uso intenso de uma força de trabalho de altíssima qualificação e remuneração e baixa automação, em face da pequena escala de produção, criando empregos de alto nível em todas as suas etapas produtivas, incluindo projeto, fabricação e serviços pós-vendas. Enquanto isso, na maior parte do setor industrial, tais processos produtivos ou são muito automatizados, ou utilizam mão-de-obra pouco qualificada. Dada a importância estratégica do setor aeroespacial, muitos países estruturam suas políticas internas incentivando suas indústrias nacionais a participarem cada vez mais das compras governamentais referentes ao mercado de defesa. E aqui acho que vale a pena citar rapidamente alguns exemplos que podem servir-nos no futuro. A França, por exemplo, pela sua importância e contribuição para o desenvolvimento do País, merece uma análise mais detalhada. A responsabilidade pelos programas de aquisição e exportação de armamentos cabe à DGA — Direção Geral de Armamentos, órgão do Ministério da Defesa. Ao suprir as Forças Armadas e salvaguardar a autonomia da indústria da defesa nacional, adapta-se a indústria às necessidades industriais e negociam-se com outros países acordos de colaboração para desenvolvimento e produção de armamento. Essa estrutura inclui todos os serviços e organizações do Ministério da Defesa que são responsáveis por pesquisa, desenvolvimento e produção de equipamento de defesa. É o órgão-chave do sistema de aquisição de armas, agindo como mediador entre as autoridades políticas, a indústria de defesa e os operadores militares.

Depois que o Parlamento vota o Orçamento para aquisições de Defesa, os fundos são alocados entre os programas específicos, e devido a esse poder de alocação podem ser assegurados recursos plurianuais para os sistemas de alta prioridade, mesmo num orçamento de Defesa em redução.

Já que a França conta primariamente com empresas francesas como única fonte de fornecimento para a maioria dos seus sistemas de armas, estabelecem-se controles administrativos de preço e qualidade em cooperação com a indústria, para que ela mantenha lucros, empregos e investimentos em alta tecnologia, e para que o país se mantenha competitivo no mercado internacional.

No intuito de preservar as competências da indústria de defesa, equilibram-se as considerações industriais de longo prazo, tais como a necessidade de preservar equipes de projeto ou de manter uma linha de produção aberta em relação aos requisitos operacionais dos militares franceses. Os objetivos da política industrial devem, naturalmente, estar em harmonia com os interesses dos Ministérios da Defesa, de Relações Exteriores e de Economia e Finanças. Quando há conflito entre agências, ele é decidido em nível político.

Em suma, a política industrial francesa de defesa gira em torno de dois eixos. O primeiro busca preservar e promover a competência tecnológica da indústria de defesa, encorajando as empresas voltadas para a defesa diversificada em direção ao mercado civil, investindo em pesquisa e desenvolvimento mesmo em prejuízo da produção, estimulando as empresas a se concentrarem em áreas de excelência para melhorar sua vantagem competitiva e promovendo maior confiança em tecnologia de uso duplo. O segundo eixo visa permitir que as empresas tenham um papel de liderança na reestruturação da produção de defesa, por meio de programas de colaboração em pesquisa e desenvolvimento, alianças estratégicas, aquisição de empresas estrangeiras e fusões.

Dessa forma, o planejamento industrial francês de defesa está estruturado de modo a monitorar as atividades e a saúde financeira das empresas de defesa, mantendo-se uma base de dados centralizada que contenha essas informações e prepare a análise de ações que visem à melhora da competitividade e à lucratividade na indústria de defesa.

Outra experiência muito interessante, no que tange a uma política industrial efetiva que incentiva as compras nacionais e a geração e a manutenção de empregos, é a norte-americana. Menciono aqui que a política de compras governamentais tem sido utilizada de forma intensiva e generalizada como instrumento de apoio à promoção da indústria local.

A título de ilustração, vou citar três instrumentos utilizados. O primeiro deles é a política de gastos militares, que tem como objetivo estimular as atividade de P&D e a inovação e a difusão de novas tecnologias, seja pela contratação daquelas atividades, seja ao assegurar demanda futura para novos produtos e processos. O segundo grande instrumento é o buy american act, que assegura mercado para produtores locais, vedando a aquisição de produtos fornecidos por fabricantes estrangeiros sempre que eles possam ser fabricados no país, inclusive exigindo fabricações sob licença. E o terceiro grande instrumento é o small business act, que beneficia determinado conjunto de produt

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