Mercosul seguirá sem presidente até mudança na situação venezuelana, diz fonte

Lisandra Paraguassu
 

O Mercosul continuará sem presidência por tempo indeterminado, enquanto diplomatas dos países do bloco, que se reuniram nesta quinta-feira em Montevidéu, tentam encontrar uma fórmula para não paralisar completamente o grupo até que haja alguma evolução na situação da Venezuela, disse à Reuters uma fonte próxima às negociações.

O Uruguai, que ocupava a presidência pro tempore do Mercosul, entregou há uma semana o cargo, em uma tentativa de forçar Brasil, Paraguai e Argentina a aceitarem a presidência venezuelana, mas os três países se recusaram. Desde então, o bloco está acéfalo e nenhuma proposta foi aceita até agora pelo governo uruguaio.

"O Uruguai concordou que se tem de encontrar uma solução para que funcione o Mercosul, mas são os mais resistentes a qualquer solução política", disse a fonte.

Foram encaminhadas até agora as propostas de passar a presidência diretamente para a Argentina, próxima da fila, e a de deixar a coordenação do bloco para um conselho de ministros das Relações Exteriores. Mas as propostas não foram aceitas pelo Venezuela e, consequentemente, pelo Uruguai, que condiciona seu apoio à concordância venezuelana. Sem uma posição unânime, segue o impasse.

Os diplomatas reunidos na capital uruguaia concluíram que se deve tentar levar informalmente questões técnicas do bloco e que não podem ser paralisadas, como a revisão de tarifas e a adoção de regulamentos, entre outros temas, sem o envolvimento do lado político do bloco, ou seja, de ministros e presidentes.

A maneira de por em prática essa engenharia ainda não foi definida, mas alternativas foram levantadas e serão levadas às chancelarias, disse a fonte, para serem tratadas novamente em uma reunião no final deste mês. Toda a formatação do bloco é feita para que seja dirigido pela cúpula de presidentes, mas não há vedação para que decisões sejam tomadas fora disso.

No entanto, convocações de reuniões, por exemplo, devem ser feitas pela secretaria do Mercosul, determinada pelo país que o preside no momento. O encontro desta quinta-feira, por exemplo, foi feito sem qualquer apoio da estrutura do Mercosul – com sede em Montevidéu – porque o governo uruguaio afirmou que não tinha mais o poder de fazê-lo.

Uma proposta inicial é que a situação seja tocada em nível técnico e quase informalmente até o final do ano, quando acabaria o período de presidência da Venezuela. Mas sem ter ocupado a presidência, nada impede que o governo de Nicolás Maduro continue a pressionar para assumir o cargo, disse a fonte.

A expectativa dos diplomatas de Brasil, Argentina e Paraguai é que, de alguma forma, a situação venezuelana se resolva, disse a fonte. Seja por mudanças na postura do governo de Maduro, que poderia cumprir as normas do bloco – entre elas, a democrática, marcando o referendo revogatório e soltando o que chanceleres classificam de “prisioneiros políticos” – , seja por uma deterioração da situação do país a ponto do Uruguai desistir de brigar pela Venezuela.

“A situação da Venezuela não é estável. Do jeito que ela está não dá. Ou revertem a situação, entra nos eixos e voltam a se comportar como deve, cumprindo as regras do Mercosul ou vai chegar em um ponto que nem o mais ferrenho defensor vai ficar”, avaliou a fonte.

Diplomatas de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai se reúnem na 5ª para tratar de impasse no Mercosul

Em meio a mais um impasse que paralisa o Mercosul, diplomatas de alto escalão de Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai se reunirão na quinta-feira no Uruguai para tentar uma solução para a presidência do bloco que não envolva aceitar a presidência pro tempore da Venezuela, disseram à Reuters fontes do governo brasileiro.

Na semana passada, o Uruguai declarou que estava deixando a presidência do bloco, enquanto o governo venezuelano afirmava que estava assumindo o posto, seguindo a rotação por ordem alfabética que rege as presidências pro tempore, mas apenas o Uruguai aceitou a declaração da Venezuela.

O impasse sobre a presidência do bloco paralisa o Mercosul há pelo menos dois meses. Aliado à Argentina e ao Paraguai, o Brasil articula para evitar que o governo do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, assuma o cargo.

Nos últimos encontros de chanceleres levantou-se a possibilidade de suspender a Venezuela do Mercosul por não cumprir os requisitos de adesão ao bloco dentro do prazo de quatro anos.

Seria uma solução mais palatável do que simplesmente recorrer à cláusula democrática, o que certamente enfrentaria a resistência do Uruguai.

As alternativas que serão analisadas pelos diplomatas são suspender a Venezuela e passar a presidência à Argentina ou, se essa medida não tiver consenso, ignorar a Venezuela e manter a coordenação do bloco nas mãos do conselho permanente de ministros, órgão colegiado do Mercosul.

“A chave é convencer o Uruguai”, disse à Reuters uma fonte diplomática, lembrando que qualquer decisão precisa ser tomada por consenso.

Na próxima sexta-feira, durante o coquetel de recepção aos chefes de Estado que vêm para a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, o presidente interino Michel Temer irá continuar as negociações com os presidentes da Argentina, Maurício Macri, e do Paraguai, Horácio Cartes. No entanto, o presidente do Uruguai, Tabaré Vasquez, que precisa ser convencido a isolar a Venezuela, não estará no Rio.

Inicialmente mais diplomático nas afirmações e agressivo nos bastidores, o governo brasileiro vem aumentando o tom contra a Venezuela.

Na última sexta-feira, o ministro das Relações Exteriores, José Serra, divulgou uma carta entregue às chancelarias dos países do Mercosul afirmando que o governo brasileiro “entende que se encontra vaga a presidência pro tempore do Mercosul, uma vez que não houve decisão consensual a respeito de seu exercício no período semestral subsequente”.

“A decisão unilateral de encerrar a presidência pro tempore gera incerteza e impõe a necessidade de adoção de medidas pragmáticas para permitir o funcionamento do Mercosul. A sugestão argentina de estabelecimento de um mecanismo transitório de coordenação coletiva é medida construtiva que merece ser considerada”, continua o texto.

Na noite de terça, ao sair de um evento em um centro universitário, em Brasília, Serra afirmou que Maduro não tem condições de presidir o bloco.

“O presidente da Venezuela não tem condições para assumir a presidência do Mercosul. Primeiro porque a Venezuela não cumpriu as exigências existentes, os pré-requisitos para integrar o Mercosul. Segundo, porque, evidentemente, alguém que não consegue governar o seu país não vai poder levar o Mercosul para um bom caminho”, disse.

A Venezuela vive uma crise econômica e política marcada pelo desabastecimento de alimentos e de produtos básicos.

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