A guerra de três dias – O que a Jihad Islâmica conseguiu?

A guerra de três dias – O que a Jihad Islâmica conseguiu?

Anna Mahjar-Barducci
Pesquisadora e mora em Jerusalém.

 
Apesar dos fortes golpes infligidos pelas Forças de defesa de Israel, o movimento da Jihad Islâmica Palestina em Gaza ganhou várias vantagens desde a última guerra contra Israel. Alguns meios de comunicação ocidentais relataram que Israel "ganhou" a guerra. De fato, embora Israel tenha eliminado dois importantes líderes do movimento terrorista, a Jihad Islâmica conseguiu fortalecer sua imagem e influência na região. Até 05AGO2022, quando Israel lançou o ataque preventivo contra Gaza, iniciando a Operação Amanhecer, a Jihad Islâmica era apenas um movimento secundário, incapaz de competir com a popularidade do Hamas na Faixa de Gaza. No entanto, após três dias de guerra e cerca de 1.100 mísseis disparados contra Israel, a Jihad Islâmica tornou-se um dos maiores movimentos de resistência da região e conquistou o apoio total de Teerã.

Como a guerra começou

Em 01AGO2022, durante uma operação em Jenin, Israel prendeu um comandante da Jihad Islâmica na Cisjordânia, Bassam al-Saadi, junto com seu genro Ashraf Zidan Mohammad al-Jada. Imediatamente após a prisão, a Jihad Islâmica começou a planejar ataques terroristas contra cidades israelenses ao redor da Faixa de Gaza, com o objetivo de pressionar Israel a libertar Bassam al-Saadi e o detento administrativo palestino Khalil Awawdeh, que se tornou um dos símbolos da resistência palestina, após mais de 150 dias de greve de fome. Consequentemente, a IDF elevou o nível de alerta no sul do país, fechando as estradas para veículos civis.

 A população israelense, sentindo-se sitiada, pediu a intervenção do governo. Portanto, em 5 de agosto, o governo israelense decidiu bombardear preventivamente Gaza, após receber informações de que a Jihad Islâmica estava pronta para atacar Israel. O bombardeio, além de causar baixas civis, eliminou Taysir al-Jabari, um alto comandante das Brigadas Al-Quds (Saraya al-Quds), o braço armado da Jihad Islâmica. A resposta do movimento terrorista foi imediata, de fato a Jihad Islâmica mostrou sua força militar, lançando mísseis para o sul do país e para Tel Aviv, centro econômico e cultural de Israel.

O segundo dia da guerra – O " Envelope de Gaza"

No segundo dia de guerra, a Jihad Islâmica continuou a disparar mísseis sem interrupção, especialmente no sul do país. Um dos objetivos declarados desta organização era, de fato, tornar impossível a vida no "Envelope de Gaza", ou seja, a parte de Israel que está localizada a sete quilômetros da Faixa, de tal forma que está despovoada de cidadãos israelenses.

Em parte, a Jihad Islâmica teve sucesso em seu propósito. Muitos habitantes do "envelope" declararam que pela primeira vez pensaram em se mudar desta área. De fato, vários ônibus evacuaram parte da população, exaustos pelo contínuo lançamento de mísseis (a partir do momento em que a sirene soa, a população no "envelope" tem apenas 15 segundos para chegar ao abrigo antimísseis).

O segundo dia da guerra – A reunião em Teerã

No entanto, o evento mais significativo no segundo dia da guerra foi o encontro em Teerã do líder da Jihad Islâmica, Ziyad al-Nakhalah, com o general iraniano Hossein Salami, atual comandante da Guarda Revolucionária Islâmica. Durante a reunião, Salami disse que "o colapso" da "entidade sionista" é um "caminho irreversível" e que "a libertação de Jerusalém é iminente".

É importante sublinhar que em 04AGO2022, antes do início da guerra, al-Nakhalah se reuniu com o presidente iraniano Ebrahim Raisi. De acordo com o Middle East Media Research Institute (MEMRI), durante o encontro, Raisi disse: "Não temos dúvidas sobre a vitória da resistência palestina e a libertação de Jerusalém… Hoje, as nações muçulmanas da região odeiam a entidade sionista. predatória e consideram que a resistência é a linha principal e fundamental para enfrentá-la".

 Na véspera, em 03AGO2022, al-Nakhalah também se reuniu com o ministro iraniano das Relações Exteriores, Hossein Amir-Abdollahian, com o presidente do Majlis (parlamento iraniano) Mohammad Baqr Qalibaf e com Ali Akbar Velayati, conselheiro de relações exteriores do líder supremo, aiatolá Ali Khamenei.

O Irã, que está negociando acordos nucleares com os Estados Unidos, tem interesse em pressionar Washington por meio dos movimentos terroristas na Palestina e no Líbano, que recebem recursos de Teerã, para lançar uma guerra por procuração contra Israel, como já fez no passado.

 No entanto, na tarde do segundo dia da guerra, Israel atingiu duramente a Jihad Islâmica, matando Khaled Mansour, outro líder do movimento palestino.

O terceiro dia de guerra – Tisha b'Av

Em 07AGO2022, terceiro dia da guerra, analistas israelenses temiam que o Hamas pudesse entrar no conflito. Esse dia, de fato, marcou o aniversário de Tisha b'Av (um dia de jejum em memória de eventos de luto na história judaica, como a destruição do Primeiro e do Segundo Templo). Muitos analistas esperavam tensões no Monte do Templo (onde fica a mesquita de al-Aqsa), pois muitos judeus religiosos teriam ido (segundo a tradição) rezar na esplanada, tornando inevitável a entrada do Hamas no templo. Na manhã de 07AGO2022, a Jihad Islâmica também enviou mísseis de alerta para Jerusalém (sirenes soaram para a área de Beit Safafa, um bairro predominantemente árabe, Shoresh, Neveh Ilan e Abu Gosh). No entanto, a polícia israelense conseguiu lidar com a situação, também porque o número de judeus religiosos que apareceram no Monte do Templo foi menor do que o esperado.

 O terceiro dia de guerra – A Trégua

Na noite de 07AGO2022, a mídia anunciou que o Egito estava negociando uma trégua. Por volta das 22h, a mídia informou que a Jihad Islâmica concordou com um cessar-fogo, depois que o Cairo prometeu mediar a libertação de Bassam al-Saadi e Khalil Awawdeh. A trégua entrou em vigor às 23h30, mas a Jihad Islâmica lançou seu último foguete às 23h50 no envelope.
De referir que no dia seguinte, a pedido da Jihad Islâmica, Israel enviou camiões de combustível para Gaza, após a abertura dos postos fronteiriços.

Além disso, de acordo com alguns sites de notícias palestinos, Awawdeh poderia ser enviado a um hospital para tratamento médico, conforme solicitado pela Jihad Islâmica, e depois liberado nos próximos dias. No entanto, os jornais israelenses escrevem que, por enquanto, Israel não tem pressa em libertar Awawdeh ou al-Saadi. No entanto, em 11AGO2022, el portal de noticias Ynet escreveu: “Israel transfere um prisioneiro da Jihad Islâmica para o hospital em meio a uma greve de fome. Khalil Awawdeh fica 160 dias sem comer em protesto contra sua detenção administrativa sem julgamento; advogado diz que Awawdeh precisa de uma cadeira de rodas e mostra sinais de danos cerebrais; A Jihad Islâmica ameaça retaliação se o prisioneiro morrer.”

É importante lembrar que, em Gaza, o Hamas mantém dois israelenses como reféns (Avraham Mengistu, um israelense de origem etíope de Ashkelon, e Hisham al-Sayed, um árabe-israelense de uma aldeia beduína no Negev) e mantém os corpos de dois soldados israelenses (sargento Oren Shaul e 2º tenente Hadar Goldin, que morreram na guerra de 2014).

Hamas, o grande ausente

Desde o início da guerra, o Hamas decidiu não entrar no conflito. A decisão mostrou que o Hamas se tornou um movimento político pragmático. Na guerra de onze dias de 2021, o Hamas foi considerado o “vencedor” dos confrontos militares, por ter paralisado a vida em Israel, e se consagrando como representante do povo palestino. Portanto, o movimento islâmico não tem intenção de participar de guerras, nas quais poderia perder sua popularidade.

Além disso, a Jihad Islâmica está competindo com o Hamas em Gaza e não está interessada em resgatar um rival. Se a guerra tivesse durado vários dias, certamente o Hamas teria sido forçado a entrar no campo de batalha, para não ser acusado pela população palestina de ter abandonado seu próprio povo e a resistência.

Também vale a pena notar que nem mesmo o Hezbollah se sentiu compelido a ajudar a Jihad Islâmica, até porque a situação político-econômica no Líbano está tão em crise que o grupo xiita não pode se dar ao luxo de entrar em uma guerra.

Conclusão

Apesar da destruição causada em Gaza, a Jihad Islâmica se considera a vencedora desta guerra. De fato, o movimento conseguiu ditar os termos da trégua e tornar insuportável a vida dos israelenses no sul do país. Mais importante ainda, a Jihad Islâmica superou ou pelo menos igualou a popularidade do Hamas. Certamente foi bom para Israel que o Hamas não tenha entrado no conflito, mas também pode ser um fator negativo, já que o crescimento da Jihad Islâmica na Faixa de Gaza não beneficia Israel. Além disso, a Jihad Islâmica agora conquistou o apoio de admiração de Teerã. Durante seu encontro com o conselheiro de Khamenei, o líder da Jihad Islâmica (um movimento sunita!) disse: "O Líder Supremo [Khamenei] tem um lugar especial em nossos corações… Vocês são nossos irmãos mais velhos…" Além disso, no dia da trégua, al-Nakhalah declarou a vitória de seu movimento diretamente de Teerã.

Quanto ao governo Lapid, o resultado desta guerra será avaliado pelos próprios israelenses nas urnas em outubro próximo. Israel matou dois comandantes da Jihad Islâmica, mas isso não parece ter enfraquecido o movimento, que agora está satisfeito com o resultado da guerra, que deu o nome de "Unidade Campos de Batalha" (Wahdat Alsaahat, em árabe), ou a união dos campos de batalha da Cisjordânia com os de Gaza. Por enquanto, a Jihad Islâmica parece ter tido sucesso nessa tentativa.

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