Fernando Luís Schüler
Doutor em filosofia e mestre em ciências políticas
pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e diretor acadêmico do IBMEC-RJ
A última edição do Pisa, avaliação realizada em 65 países com alunos de 15 anos, pela OCDE, apresenta um dado perturbador. Os nossos alunos das escolas privadas tiveram nota média de 502, semelhante à nota dos estudantes dos EUA. Os nossos alunos das redes estaduais e municipais de ensino alcançaram uma média de 387, semelhante à da Albânia.
Os dados do Enem mostram o mesmo quadro. Das mil escolas mais bem posicionadas (contando apenas as escolas que tiveram mais de 75% de participação dos estudantes), 92% eram particulares.
O fato é que estamos alimentando, no Brasil, uma espécie de apartheid educacional entre os jovens de classe média e alta, cujas famílias há muito "privatizaram" a educação de seus filhos, e os estudantes de famílias mais pobres, que são levados a estudar nas redes estaduais e municipais de ensino, com seus problemas crônicos de gestão. É uma situação paradoxal: o sistema público de educação, que deveria assegurar uma base de oportunidades igual para todos, é ele mesmo uma máquina geradora de profundas desigualdades sociais.
Alguns dirão que não é possível debitar os resultados pífios da educação pública às deficiências estruturais do sistema. Pesaria a condição das famílias para apoiar os filhos em suas atividades fora das salas de aula. É um argumento que pode tranquilizar o nosso sono, mas é inaceitável. Caberia ao Estado exatamente criar as condições para compensar essas assimetrias sociais. Recursos não faltam para isso.
Nosso sistema estatal é caro e ineficiente. Escolas estatais são repartições públicas. Não têm autonomia para tomar decisões com a racionalidade e a rapidez que a educação requer no dia a dia – como atualizar laboratórios, bibliotecas e fazer obras de infraestrutura. Elas sofrem com a burocracia, com o corporativismo e com a visão antimeritocrática comum no serviço público brasileiro. É fácil constatar esse quadro e dizer que tudo poderia ser diferente. Mas não é o que a experiência demonstra.
Penso que chegou a hora de apostar em uma mudança de paradigma no Brasil. Uma mudança estrutural de longo prazo: repensar a relação entre o Estado e a sociedade brasileira no que se refere à educação.
Em vez de continuarmos tentando o que se tentou no século 20 – ou seja, nivelar o acesso à educação pela oferta do ensino estatal-, podemos buscar soluções efetivamente possíveis no século 21: assegurar o acesso de todos ao ensino não estatal – composto por escolas com ou sem fins lucrativos, desde que elas tenham qualidade, uma gestão ética e uma relação positiva entre custo e benefício.
O Brasil tem apresentado inovações importantes nessa direção. Basta observar o ProUni e o Fies. O Estado financia (via abatimento fiscal para as instituições ou via juros subsidiados para os estudantes) a matrícula dos alunos nas instituições particulares. É, grosso modo, o que, há décadas, propunha-se no País sob o conceito de "voucher" para a educação. Em vez de criar e administrar repartições públicas de ensino, o Estado utiliza a capacidade disponível das redes privadas, deixa que as famílias escolham onde querem estudar e concentra a sua ação na criação de indicadores e na exigência de qualidade.
Fica a pergunta: por que esse não se torna o padrão de atuação dos governos na educação também no ensino médio e fundamental? Por que continuar abrindo repartições públicas educacionais e continuar (como os indicadores mostram) aumentando o fosso social brasileiro? Não seria melhor apostar em modelos transparentes de parceria entre Estado e sociedade, com o financiamento direto aos estudantes, deixando que eles escolham onde estudar?
Alguém já comparou a relação entre custo e benefício dessas duas alternativas? O Brasil fez muitas revoluções nas duas últimas décadas. Precisamos agora de mais uma. Uma revolução para que exista igualdade de oportunidades, que vai começar quando tivermos alguma coragem para revisar velhos conceitos.