Woloszyn – A Insurgência no Brasil como Instrumento de Desestabilização do Poder

 

Prof. André Luís Woloszyn

Analista de Assuntos Estratégicos, Bacharel em Defesa Social, Mestre em Direito, Especialista em Ciências Penais, Diplomado em Inteligência Estratégica pela Escola Superior de Guerra.

alwi.war@gmail.com

    

As operações de insurgência que estão em andamento no estado do Ceará, patrocinadas por organizações criminosas, a exemplo de outras que, sistematicamente, ocorrem em outros estados federativos, devem ser encaradas sob outra perspectiva, diferentemente de uma disputa por territórios do tráfico de drogas ou ainda, como ação de retaliação contra medidas adotadas pelos governos que atingem o sistema penitenciário nacional. Como tal, trata-se de um raciocínio simplista e desconexo da realidade.

Não podemos tratar o problema sob a ótica do terrorismo uma vez que a Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016, conhecida como Lei Antiterrorismo, não considera tais ações entre seu cardápio de motivações, o que considero um erro lamentável. Contudo, podemos afirmar que todas as operações de insurgência, considerada doutrinariamente como guerrilha entre as décadas de 1950 à 1970, seguindo um padrão, ocorrem por meio de ações terroristas dentro do antigo conceito de guerra irregular, atualmente ampliado para guerra híbrida.

Chama a atenção que, nos episódios de Fortaleza, houve uma mudança radical nas táticas de atuação das facções, diferentemente de eventos similares ocorridos em anos anteriores nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Nestes, não há confrontos intencionais com as forças de segurança e sim ataques contra as chamadas estruturas críticas como fontes de abastecimento de água, energia elétrica e obras viárias o que aponta para a inexistência do objetivo da territorialidade, além de uma organização horizontal na tomada de decisões, o que dá maior autonomia a seus integrantes para a escolha de possíveis alvos.

Tradicionalmente, as autoridades governamentais percebem a questão sob uma ótica localizada e relacionada exclusivamente ao sistema carcerário e, partindo desta compreensão, se utilizam de métodos convencionais aplicados na segurança pública para crimes comuns na tentativa de resolver o problema e minimizar danos, o que demostrou historicamente (desde os ataques do PCC em 2006)  não surtir os efeitos desejados, apenas apazigua as ações por determinado espaço de tempo, quando ressurgem com maior intensidade e violência.

Na verdade, esta mesma insurgência demonstrou em diversas oportunidades para toda a sociedade brasileira que detém o uso da força com grande assimetria uma vez que atuam por anomia, paralisando por meio da violência, governos e grandes centros urbanos pelo medo da vitimização, conceito que se enquadra perfeitamente na definição de terrorismo nacional ou doméstico.

Neste contexto, a prisão de integrantes destas facções como vem ocorrido no estado do Ceará (aproximadamente 300 presos) é apenas uma forma de resposta imediata e paliativa à sociedade, no jargão popular, enxugar gelo. Considerando que as lideranças destes movimentos se encontram encarceradas e, nestas circunstâncias, protegidas pelo Estado, somado a população carcerária em liberdade e a disposição para realizar novas ações, este modelo, sem a adoção de outras ações complementares se esgotou há muito tempo e o histórico de eventos nos estados comprova tal afirmação.

Estamos falando de um exército irregular maior que o efetivo das Forças Armadas com quantidade relativa de armas de uso exclusivo destas, apropriadas para combates urbanos e sem o compromisso moral e ético de atuarem dentro da legalidade.

Da mesma forma, a presença massiva de efetivos policiais deixou de se constituir em força de dissuasão uma vez que o encarceramento dos integrantes destas organizações é temporário e as lideranças tem plena consciência deste status quo. O problema recrudesce diante da possibilidade da manipulação destas facções direcionadas a desestabilizar governos e, em sentido mais amplo, o próprio sistema democrático, por meio de ações coordenadas em diversos estados federativos ao mesmo tempo, hipótese que não pode ser descartada, face há existência de uma rede digital de informações e comunicações existente entre os principais estabelecimentos penais do país.

De todo modo, tais ações são previsíveis, todavia subestimadas pelas autoridades o que permite o fortalecimento das facções interna e externamente, oportunizando graves crises de tempos em tempos. Poucos, até o momento, demonstram coragem de arcar com um ônus político de adotar ações mais enérgicas como o bloqueio definitivo de telefones celulares no perímetro das penitenciárias ou critérios mais rigorosos para a liberdade provisória e para o regime semiaberto. Vale destacar, que muitas instituições públicas e privadas, se manifestam contrariamente a estas medidas num jogo estratégico de perdas e ganhos.

A reflexão que deve ser feita diante desta conjuntura é: Quem se beneficia com o caos estabelecido? A resposta a esta indagação é complexa, contudo, nos possibilitaria identificar os patrocinadores e apoiadores diretos e indiretos desta insurgência cuja responsabilidade penal deve ser dividida com as lideranças destas organizações.

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