Operação militar mostra a fragilidade das forças iraquianas

Roberto Godoy

O novo Exército do Iraque, reorganizado pelos Estados Unidos, tem perto de 193 mil militares – mas ainda não consegue a mobilização rápida das tropas, nem tem o equipamento necessário. O ataque aéreo de interdição contra os grupos rebeldes de Faluja e Ramadi foi lançado com os poucos recursos disponíveis – três aviões AG-208 Combat Garavan, versões armadas de um turboélice monomotor da americana Cessna, geralmente empregado como cargueiro leve. Talvez tenha havido a intervenção dos velhos helicópteros russos Mi-17, capazes de levar foguetes e metralhadoras.

O inventário iraquiano considera como tendo "capacidade de combate" duas unidades do pequeno SB7L-360, pouco mais que um ultraleve, usado para observação.

A precariedade da Força Aérea – que durante a ditadura de Saddam Hussein alinhava cerca de 600 modernas aeronaves fornecidas principalmente pela extinta URSS e pela França – ainda depende da aprovação da transferência de caças médios e de aviões de ataque leve. Uma das possibilidades consideradas pelos EUA é o brasileiro Super Tucano, da Embraer.

Pior é a situação do Exército. A cadeia de comando foi desfeita na guerra de 2003. Mais de 70% dos oficiais foram presos, processados ou afastados. Grande parte dos exonerados foi reintegrada aos quadros em razão da familiaridade com os procedimentos. A tropa, todavia, protesta contra a linha superior, formada por indicação política – como nos velhos tempos.

EUA e Irã oferecem ajuda

Forças do governo iraquiano recorreram a um ataque aéreo ontem contra o leste de Ramadi, cidade controlada por militantes da Al-Qaeda na semana passada. Segundo autoridades locais, 25 radicais foram mortos. A estratégia indica a dificuldade das tropas regulares iraquianas para retomar por terra os territórios, onde radicais sunitas desafiam o governo do premiê xiita Nuri al-Maliki.

Funcionários do governo da Província de Anbar, na fronteira com a Síria, encontraram-se com líderes tribais para pedir que ajudem a repelir os militantes ligados à Al-Qaeda que tomaram partes de Ramadi e Faluja, cidades iraquianas estratégicas sobre o Rio Eufrates. As duas foram o epicentro da insurgência radical sunita após a invasão americana do Iraque em 2003.

O Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIL, na sigla em inglês), grupo ligado à Al -Qaeda, tem aumentado sua influência na província, em uma tentativa de criar um Estado muçulmano sunita abrangendo a fronteira com a Síria (mais informações na página A9). Dessa vez, os insurgentes sunitas tomaram terreno nas principais cidades da província e mantiveram posições por dias.

"Nos preocupam muito os esforços da Al-Qaeda e do ISIL porque tentam impor sua autoridade não só no Iraque, mas também na Síria", afirmou ontem o secretário de Estado dos EUA, John Kerry. Ele ofereceu ajuda ao governo iraquiano e às tribos leais ao premiê xiita, desde que isso não inclua o envio de tropas, dois anos após a retirada. Kerry não deu detalhes sobre que tipo de assistência dará a Maliki, a quem Washington pediu repetidas vezes para dividir o poder com a minoria sunita.

O Irã também ofereceu auxílio. "Se os iraquianos nos pedirem, enviaremos equipamento militar e assessoria, mas eles não precisam de mais homens", disse o subchefe do Estado-Maior iraniano, general Mohamed Hejazi, à agência oficial Irna. O Irã é um dos aliados do ditador sírio, Bashar Assad, alvo do ISIL na Síria.

Poderio. A tomada de Faluja e Ramadi demonstra o ressurgimento da Al-Qaeda e lembra os dias mais sangrentos da insurgência, imediatamente após a invasão do Iraque em 2003. As forças afiliadas à Al-Qaeda no Iraque perderam boa parte de sua influência a partir do fim de 2006 quando milhares de sunitas, assustados com a brutalidade do grupo terrorista, decidiram enfrentá-la, dando um valioso apoio aos EUA.

"O ISIL soube aproveitar suas redes e sua capacidade no Iraque para cimentar uma forte presença na Síria e vice-versa", explica Daniel Byman, do Brookings Institution. O grupo "recuperou a capacidade de realizar um combate de guerrilhas limitado e uma campanha terrorista sustentada". "Seus objetivos vão além do Iraque, mas o objetivo transnacional de estabelecer um Estado islâmico só pode ser conseguido uma vez que sejam criados mini-Estados", como o proclamado em Faluja na sexta-feira, acrescenta Charles Lister, do Brookings Doha Center.

O porta-voz do Ministério iraquiano de Defesa, Mohamed al-Askari, também destaca a importância da conexão com a Síria. Segundo ele, fotografias aéreas apontam a chegada de armas e equipamentos avançados da Síria, o que ajudaria os islamistas a restabelecer campos de treinamento. / AFP, REUTERS e EFE

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