Irã diz ter abatido um drone

Em meio à crescente desconfiança internacional, o Irã anunciou ontem ter abatido um drone, avião não tripulado e teleguiado, dos Estados Unidos no leste do país, próximo à fronteira com o Afeganistão e o Paquistão. A aeronave teria invadido o espaço aéreo iraniano. A informação foi divulgada por um canal de televisão e uma agência de notícias iranianos, mas, como em duas outras ocasiões este ano, nenhuma carcaça ou parte da aeronave foi exibida. Os EUA, por sua vez, não desmentiram o incidente, mas aventaram a hipótese de o equipamento ter caído — e não abatido pelos iranianos. Na opinião de um estrategista militar iraniano radicado no Canadá, a notícia não passa de uma tentativa de Teerã de fazer propaganda e tentar retirar o foco do recente ataque à Embaixada do Reino Unido no país.

Sem revelar mais detalhes, a agência de notícias Fars disse que as “unidades de guerra eletrônicas e antiaéreas conseguiram abater um drone americano do tipo RQ-170 Sentinel, que violou as zonas fronteiriças do leste do país”. A agência cita como fonte um oficial militar que não teve seu nome revelado. Ele afirma que o ato foi um “claro exemplo de agressão às fronteiras iranianas” e que as forças armadas de seu país “estão completamente prontas para qualquer tipo de ataque”.

Até a noite de ontem (domingo), a Casa Branca não havia se pronunciado, mas um comunicado oficial das forças norte-americanas no Afeganistão divulgado pelo jornal New York Times dizia que a aeronave “pode ser um drone americano que perdeu contato com o operador na última semana, enquanto sobrevoava vizinhos a oeste do Afeganistão”.

Na avaliação do estrategista iraniano Houchang Hassan-Yari , especialista em assuntos militares no Oriente Médio do Royal Military College of Canada e da Queens University, até que o regime dos aitaolás mostre as carcaças dos aviões ou dê provas de que eles foram realmente derrubados, é difícil acreditar que um ataque a forças norte-americanas tenha sido promovido. “Vejo tudo isso como uma grande propaganda vinda do Irã, que tenta provar que suas forças militares são ‘boas’ e capazes de enfrentar os Estados Unidos”, afirmou ao Correio.
 
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Outra justificativa para a atitude do regime estaria ligada ao ataque de um grupo de estudantes à Embaixada do Reino Unido em Teerã, na terça-feira passada. Irã e Estados Unidos, assim como seus aliados — entre os quais o Reino Unido —, estão em um tenso embate por conta do programa nuclear iraniano. Enquanto o Ocidente afirma que Teerã tem objetivos militares e busca obter uma bomba, a nação persa garante que seus planos são estritamente pacíficos. O acirramento da crise levou à imposição de novas sanções contra o regime iraniano.
 
Em resposta, milicianos islamitas invadiram a embaixada britânica, queimaram a bandeira do Reino Unido, destruíram escritórios e mantiveram retidos 20 diplomatas e funcionários por horas. O ataque terminou com a intervenção da polícia iraniana. Na sequência, os governos britânico e de outros países (como Noruega) decidiram fechar suas representações em Teerã. O governo britânico também expulsou os diplomatas iranianos do país e impediu a permanência da embaixada do regime dos aiatolás  em Londres. Hassan-Yari afirmou ver no episódio de ontem uma tentativa de Teerã de justificar o ataque à embaixada. “Pode ser uma maneira de dizer: ‘Se estamos reagindo, é porque estamos sob ataques de inimigos’ (no caso, a invasão de drones no seu espaço aéreo)’”, pondera.
 
Para o analista, o episódio com a representação diplomática já se reflete de maneira muito negativa na imagem internacional do Irã. O Conselho de Segurança das Nações Unidas imediatamente condenou o ato. Até mesmo o aitatolá Ahmad Khatami, imã da oração de sexta-feira em Teerã e ligado ao líder religioso supremo, Ali Khamenei, classificou de “ilegal” a agressão, segundo a imprensa do país. “Ter um espírito revolucionário não significa que as embaixadas que se encontram no solo da República Islâmica vivam um sentimento de insegurança. Não interessa ao país”, afirmou, segundo veículos locais.
 
 
Três perguntas para – Houchang Hassan-Yari
Iraniano radicado no Canadá e especialista em assuntos militares e estratégicos no Oriente Médio
 
Por que os drones, aviões não tripulados americanos, estariam sobrevoando o Irã?
É difícil saber o que realmente está acontecendo no Irã, principalmente pelo fato de o país não exibir as partes do avião supostamente abatido. Baseado no que o governo iraniano está dizendo, se realmente drones estivessem sobrevoando o país, haveria algumas possibilidades para explicar isso. Uma delas é fato de os Estados Unidos usarem essas aeronaves em regiões de fronteira com o Afeganistão para atacar a milícia talibã ou outros grupos terroristas.
 
Há outras razões?
Outra possibilidade seria a tentativa dos EUA de coletar informações sobre atividades militares naquela parte do país, mas, até onde sei, não há instalações ou atividades militares importantes nesta região do Irã, que faz fronteira com o Paquistão e o Afeganistão.
 
Isso deve acirrar as tensões do Irã com o Ocidente e Israel?
As tensões já estão extremamente altas, mas não acredito que os EUA tenham realmente mandado esses drones para aquela área, muito menos que eles tenham sido derrubados. Não acho que esse incidente vá mudar drasticamente o atual cenário de tensão.

EUA dizem não haver indícios de que Irã derrubou avião
(Reuters)

 

Uma autoridade dos EUA disse no domingo que Washington não tem indícios de que o avião não tripulado que caiu no Irã tenha sido derrubado. Em Teerã, a televisão estatal citou uma fonte militar dizendo que o Exército iraniano havia derrubado um avião de reconhecimento dos EUA no leste do Irã.

"Não há absolutamente nenhuma indicação até esse ponto de que os iranianos derrubaram esse avião", disse um funcionário, que não quis ser identificado.

A forças da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) no Afeganistão afirmaram que o avião que os iranianos afirmam ter derrubado pode ser um avião de controle remoto de vigilância desaparecido na semana passada, enquanto voava sobre oeste do Afeganistão.

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