Contra o tempo: a logística da Marinha nos atendimentos ao RS

A Força já mobilizou mais de 2 mil militares, nove navios de guerra, 50 embarcações, 11 helicópteros e 70 viaturas. Mas você sabe o que está por trás desta engrenagem humanitária?

Por 2T (RM2-T) Stilben

Tão logo caíram as primeiras chuvas que assolaram os municípios do Rio Grande do Sul, a Marinha do Brasil (MB) já trabalhava no auxílio à Defesa Civil do estado, com ações de busca e resgate, além da entrega de medicamentos, alimentos, água e outros gêneros necessários à população. A corrida contra o tempo para salvar vidas e prestar assistência aos mais de 440 municípios afetados tem exigido da Força operações logísticas de grande complexidade. Nelas, um setor da MB tem se destacado, representando a engrenagem que viabiliza toda essa ajuda humanitária: a logística.

Desde a decretação do estado de calamidade pública, em 1º de maio, a MB já transportou para o estado mais de 390 toneladas de donativos e 130 mil litros de água, além de 2 mil militares, nove navios de guerra, 50 embarcações, 11 helicópteros e 70 viaturas para compor a Operação “Abrigo Pelo Mar-RS”, braço do Comando Operacional Conjunto “Taquari 2”, do Ministério da Defesa. A Força-Tarefa já resgatou cerca de 2.000 pessoas no Rio Grande do Sul.

Com o início das ações da MB no âmbito da Operação, o “prever e prover”, lema da Intendência, se tornou cada vez mais desafiador, pois, para que a ajuda chegue a quem mais precisa, neste quase cenário de guerra, é necessário um afinado trabalho administrativo destas equipes, visando à mobilização de pessoal, à elaboração de planos de ação e ao municiamento dos meios e tropas. Assim, o principal legado foi prover tempestivamente os suprimentos necessários aos meios navais e de fuzileiros navais empregados, bem como aos militares que se deslocaram para a Operação, sejam embarcados ou em terra, para resgate de pessoal e distribuição de donativos.

Além disso, foi necessário receber e gerenciar donativos, desde o ponto de coleta até o embarque nos navios. São atividades contínuas e que requerem um esforço ininterrupto e coordenado de diversas Organizações Militares responsáveis pela aquisição, controle de estoques e tráfego de cargas tanto na sede, no Rio de Janeiro (RJ), quanto em Rio Grande (RS), porto de destino.

O Vice-Diretor do Centro de Operações do Abastecimento da Marinha, Capitão de Mar e Guerra (Intendente da Marinha) Hugo Martorell Rodrigues Garcia, afirma que o maior desafio logístico de uma operação como essas é agir contra o tempo para beneficiar a população, ao mesmo tempo em que se respeita todos os processos necessários. “Diversas atividades são realizadas antes mesmo dessas decisões, quais sejam, a realização de processos licitatórios e manutenção de níveis de estoque de segurança, que nos permitem estar prontos para apoiar os meios navais e de fuzileiros navais em uma situação de crise como a que estamos enfrentando. Também há o preparo técnico e a disponibilidade de nossas equipes de motoristas, operadores de empilhadeiras, estivadores e oficiais de abastecimento; e a manutenção adequada dos equipamentos e viaturas que serão empregados em larga escala”, ressaltou.

Segundo ele, a decisão de colocar em ação um determinado navio – como o Navio-Aeródromo Multipropósito (NAM) “Atlântico”, por exemplo – leva a dimensionar qual é a demanda do próprio meio em termos de ressuprimentos, que permitirá maior permanência na área de operações e qual o espaço e tipo de acondicionamento (contêineres, volumes avulsos ou pallets) deverá ser observado para os materiais recebidos.

“Em seguida, os Depósitos Primários de Suprimentos separam o material necessário e os fornecem para a Organização Militar responsável pelo Tráfego de Carga. Esta última consolida todo o material e entrega ao navio, conforme programação simultaneamente coordenada”, ressaltou o Comandante Martorell.

“Ocorre que as doações estão continuamente chegando e procuramos aproveitar o desatracar do navio com a utilização de sua máxima capacidade de apoio, permitindo otimizar o atendimento na área de operações”.

completou o Capitão de Mar e Guerra (IM) Martorell.

Outra dificuldade enfrentada pelas equipes de logística são as distâncias envolvidas: cerca de 2 mil quilômetros do Rio de Janeiro (RJ) a Rio Grande (RS), e a amplitude dos danos à infraestrutura das áreas atingidas, como aeroportos e vias rodoviárias e aquaviárias. Além disso, o significativo volume de donativos recebidos para serem corretamente acondicionados e transportados também exige das equipes presteza e extrema atenção. Felizmente, a Marinha do Brasil conta com expertise em operações de auxílio à Defesa Civil, como a “Abrigo pelo Mar” que ocorreu em 2023, quando o Capitânia da Esquadra foi empregado para mitigar a calamidade pública causada pelas fortes chuvas que atingiram o município de São Sebastião (SP). “As missões anteriores sempre contribuem, porque nos permitem corrigir procedimentos e antecipar ações que possam aprimorar nosso preparo para o apoio ao setor operativo”, finalizou o Capitão de Mar e Guerra (IM) Martorell.

Para se ter uma ideia da relevância desses esforços, somente com o acionamento do NAM “Atlântico” e da Fragata “Defensora”, a Marinha do Brasil permitiu que chegassem ao porto de Rio Grande (RS), no sábado (11), quase 160 toneladas de donativos e três toneladas de medicamentos, 38 viaturas do Grupamento de Fuzileiros Navais, 24 embarcações e 1.350 militares. Além disso, duas estações móveis para tratamento de água, capazes de produzir um total de 20 mil litros de água potável por hora.

Já o Navio de Apoio Oceânico (NApOc) “Mearim” e o Navio-Patrulha (NPa) “Benevente” partiram de Rio Grande para Porto Alegre com quase 54 toneladas de suprimentos, entre os quais, 36,8 mil litros de água, além de alimentos, ração, material de limpeza, de higiene e de salvatagem. “Conforme a necessidade de apoiar as ações da Defesa Civil, levamos itens importantes, como combustíveis, para a cena de ação. Abastecemos o Navio-Patrulha (NPa) ‘Babitonga’ com 8 mil litros de óleo diesel e 4,2 mil litros de gasolina, armazenados em tonéis de 200 litros cada, além de 100 litros de óleo utilizado nos motores de popa das embarcações, e os enviamos de Rio Grande a Porto Alegre, já que o acesso rodoviário, principal modal utilizado pela área do nosso Distrito Naval, estava comprometido”, afirmou o Oficial de Logística do Comando do 5º Distrito Naval (que abrange a área de jurisdição na qual o Rio Grande do Sul está incluído), Capitão de Corveta (IM) Marcelo da Silva Braz.

O Capitão de Corveta (IM) Braz lembrou que, desde o dia 30 de abril, tem acontecido o emprego diuturno dos meios distritais para mitigar o problema das enchentes. “Enviamos, logo no início, para apoio logístico e resgate, aquelas embarcações de emprego imediato, como as lanchas, motos aquáticas, flutuantes, entre outros. Houve direcionamento de meios e pessoal de todas as partes do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina para atender as regiões mais afetadas”, completou.

Desafio “Atlântico”

Antes mesmo de ser dada a ordem de ação ao NAM “Atlântico” rumo ao Rio Grande do Sul, a Capitão de Fragata (IM) Bianca Gomes Soares Gonçalves de Mendonça, que é Chefe do Departamento de Administração do navio, já previa os desafios que viriam: prover em torno de cinco mil refeições diárias para sua tripulação, além de abastecer a embarcação com gêneros, combustível, material comum e suprimentos de saúde para o próprio complexo médico. A corrida em direção ao sul teve mais um obstáculo inédito, mas positivo, pois se tratava da imensa quantidade de donativos recebidos para serem transportados pelo Capitânia da Esquadra.

“Tivemos poucas horas para abastecer e partir. É claro que já mantemos um nível pré-definido de estoque para que estejamos sempre em condições de atuar em uma emergência. Mas nesta comissão, especificamente, a gente adotou um abastecimento para ao menos 30 dias, porque não sabemos quanto tempo ficaremos na comissão”. Explicou a Capitão de Fragata (IM) Bianca Soares.

Segundo a Comandante Bianca Soares, se o “Atlântico” ruma a uma cidade pequena, por exemplo, que não tem como abastecê-lo, é necessário um planejamento distinto, que não leve em consideração o provimento local. “A gente teve um tempo reduzido para embarcar todos os donativos que vieram das Organizações Militares, em quantidades e formas diferentes, e o material necessário a dar autonomia de 30 dias. Então, em virtude do tamanho da tripulação e por se tratar de um navio muito grande, há um desafio enorme. Qualquer movimentação do ‘Atlântico’, aliás, envolve pelo menos mil pessoas”, explicou.

Operações bicentenárias

A Intendência é um dos Corpos da Marinha do Brasil e possui 254 anos, acompanhando desde o início de sua história a evolução de diversos campos do conhecimento. Ela atua nas áreas de abastecimento, administração, contabilidade, controle interno, economia, finanças e gestão do patrimônio imobiliário da Força. Os intendentes exercem funções a bordo dos navios da Esquadra, Distritais e da Diretoria de Hidrografia e Navegação; além de Organizações Militares (OM) do Corpo de Fuzileiros Navais, Bases e Hospitais Navais, dentre outras. Também desempenham papel técnico ou de direção de OM, típicas de áreas como administração e abastecimento.

Fonte: Agência Marinha de Notícias

Compartilhar:

Leia também

Inscreva-se na nossa newsletter