As Brasileiras na Linha de Ensino Militar Bélico: a Preparação Nacional para os Combates do SÉCULO XXI

As Brasileiras na Linha de Ensino Militar Bélico: a Preparação Nacional para os Combates do SÉCULO XXI

Eduardo Freitas Gorga
Doutorando em Estudos Estratégicos da Defesa
e da Segurança pelo PPGEST/ INEST/ UFF

No contexto internacional, é cada vez mais importante reduzir a diferenciação entre os gêneros. Organismos internacionais têm atuado de forma assertiva nessa questão e muitas nações democráticas já incluem disposições de igualdade em suas constituições. No caso das Forças Armadas brasileiras, a inclusão das mulheres na Linha de Ensino Militar Bélico (LEMB) e nas seleções para cursos e estágios combatentes, especialmente no Exército Brasileiro (EB), tem gerado impactos significativos.

É fundamental esclarecer que a LEMB se refere à preparação e ao uso do EB, incluindo também a participação de mulheres em funções diretamente ligadas ao combate. Vale ressaltar a história pioneira de Maria Quitéria de Jesus no século XIX, entre 1822 e 1823, que se tornou a primeira mulher na história do país a lutar pelo EB, desafiando a restrição de que o serviço militar era exclusivo para homens.

Esse tema diz respeito à inclusão de mulheres na LEMB, o que representa um avanço significativo nos processos operacionais e educacionais do EB. Trata-se de um assunto complexo no contexto internacional, especialmente devido às diversas culturas existentes, que influenciam a organização das forças militares. Nos últimos anos, entre o final da década de 2010 e o início da década de 2020, o EB começou a observar impactos em vários aspectos da presença das mulheres na linha combatente.

No ano de 2017, teve início a formação das primeiras oficiais combatentes do segmento feminino na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, localizada em Campinas, São Paulo. A previsão é de que a primeira turma conclua o curso em 2021, na renomada Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende, Rio de Janeiro. Essa inclusão das mulheres em atividades e missões operacionais do Exército no século XXI é um importante reflexo do processo evolutivo da Força Terrestre.

No século XX, cinco anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos da América (EUA) criaram a Ranger School. Essa instituição oferecia um programa de treinamento de elite para jovens líderes de combate do país. No entanto, somente em 2013, o exército norte-americano revogou a proibição que impedia as mulheres de servir em unidades militares de combate, como a infantaria, os blindados ou as operações especiais. Essa mudança foi um marco significativo na história das Forças Armadas dos EUA.

É importante destacar que em 2015, duas mulheres foram formadas como Rangers, seguindo os mesmos padrões de exigência aplicados aos homens, tanto em termos intelectuais quanto físicos. Elas passaram por um treinamento rigoroso, que incluiu exercícios de combate em ambientes como florestas, montanhas e pântanos. Durante mais de dois meses de intensos treinamentos, elas superaram desafios como estresse, fadiga e fome. Essas conquistas demonstram a determinação e capacidade das mulheres em alcançar um alto nível de desempenho militar.

Na Europa, as Forças Armadas britânicas deram início, em 2014, a uma revisão de seus critérios físicos de exigência, buscando integrar as mulheres nas tropas de combate de linha de frente. No continente asiático, o exército chinês estabeleceu uma unidade especial de forças femininas em 2013. No Oriente Médio, Israel contou com cerca de 2,7 mil mulheres voluntárias que se alistaram em unidades militares dedicadas ao combate.

Além disso, na América do Sul, o exército argentino é um exemplo onde as mulheres têm a opção de ingressar nas carreiras de infantaria e cavalaria desde 2012, o que não ocorre no Brasil. Essas iniciativas destacam os progressos feitos em diferentes partes do mundo para a inclusão das mulheres nas forças armadas.

No norte do continente americano, em 2016, os EUA abriram a possibilidade para que mulheres ocupassem todas as funções do seu Comando de Operações Especiais, incluindo aquelas relacionadas ao combate. Em 2020, pela primeira vez na história dos EUA, uma sargento da Guarda Nacional foi formada como operadora de forças especiais, um curso que ainda não possui mulheres concluintes no EB.

É importante ressaltar que há cerca de três décadas o EB já conta com a presença feminina nos setores de tecnologia, saúde e educação, o que torna parcialmente natural a visão interna em relação às novas integrantes da LEMB, que estarão mais próximas do campo de combate, assim como ocorre em outros exércitos ao redor do mundo, como mencionado anteriormente. Como exemplo atual da linha de combate do EB, em 2006 foram formadas as primeiras paraquedistas do Centro de Instrução Paraquedista General Penha Brasil.

Além disso, em diversos ambientes operacionais do país, como montanha, pantanal e selva, mulheres têm concluído estágios e cursos nos respectivos centros de instrução. Em 2018, tivemos a formação da primeira sargento do EB no curso de operações na selva do Centro de Instrução de Guerra na Selva, em Manaus-AM. Em 2021, uma outra sargento se tornou a terceira mulher do EB a concluir o Estágio de Operações no Pantanal, após 30 dias de intensas atividades no Centro de Instrução de Operações no Pantanal, em Corumbá-MS.

No ano de 2022, dentro de um grupo de 51 militares, quatro mulheres concluíram com êxito o estágio básico do combatente de montanha, conduzido pelo 10º Batalhão de Infantaria Leve de Montanha. Esses exemplos evidenciam o debate nacional sobre a necessidade de equidade de gênero, justificando a relevância desse tema que envolve a especialização das mulheres para as missões demandas pelo EB.

Em resumo, hoje em dia, as Forças Armadas terrestres contam com cerca de 13 mil militares do sexo feminino, desempenhando uma variedade de funções tradicionais, como veterinárias, médicas, dentistas, enfermeiras, engenheiras militares e professoras, além de outras participações bastante peculiares, incluindo o envolvimento em operações de paz, trabalho como topógrafas, mecânicas de aviação e veículos blindados.

É notável o progresso alcançado pela força terrestre no século XXI, com as oportunidades de participação das mulheres em cursos operacionais do EB. Internacionalmente, esse progresso foi antecipado em países como os EUA, cuja doutrina militar influencia o Brasil desde a Segunda Guerra Mundial.

Além disso, nos EUA, apesar dos esforços do Exército para encorajar a participação das mulheres na infantaria, havia uma falta de interesse por parte delas em se juntar às fileiras da infantaria, mesmo com a necessidade de líderes femininas no campo que antes era exclusivamente masculino. Isso resultou em um progresso mais lento na integração de gênero naquele país, embora as mulheres sejam amplamente aproveitadas em missões de inteligência e operações psicológicas. Vale ressaltar que uma mulher chegou ao posto de general de exército, o mais alto posto nas Forças Armadas dos EUA.

Em um exemplo externo, podemos observar a presença e o sucesso das mulheres em situações de conflito e guerra. Em 2003, uma mulher liderou uma Brigada dos EUA durante combates no Iraque, desafiando estereótipos e mostrando sua capacidade de liderança e coragem. Além disso, no Afeganistão, mais de 1800 mulheres foram condecoradas por suas ações em combate, após demonstrarem bravura em tarefas e missões de apoio.

Uma mudança significativa também ocorreu nas bases militares de Fort Bragg, na Carolina do Norte, e Fort Hood, no Texas, onde o exército dos EUA implementou os primeiros pelotões de infantaria compostos por militares de ambos os sexos. Esses avanços mostram que não há limites para o talento e a dedicação das mulheres, mesmo em setores historicamente dominados por homens.

Podemos observar que estamos vivenciando uma nova era na cultura e educação militar brasileira, refletindo uma tendência mundial. É notável o equilíbrio de direitos entre homens e mulheres nas forças armadas ao redor do mundo, o que tem impulsionado progressivamente o aumento da presença feminina em tropas de combate.

Questões que antes eram consideradas impeditivas, como o casamento ou a maternidade, no século XXI se mostram irrelevantes diante do crescente avanço das mulheres, tornando-se inevitável e irreversível o progresso rumo aos cargos e funções de combate. Como exemplo recente, em 2020, uma sargento apresentou um requerimento para inscrição, seleção e matrícula no curso de ações de comandos no Brasil, demonstrando o desejo e aptidão das mulheres em assumirem desafios cada vez mais complexos na carreira militar.

É evidente que a questão da igualdade de gênero transcende fronteiras e tem sua expressão internacional, principalmente quando se trata do exército dos EUA, uma vez que o EB, desde a Segunda Guerra Mundial, segue a doutrina desse país. No entanto, a participação das mulheres nas operações militares brasileiras, especialmente nos estágios e cursos operacionais do EB, requer avanços por meio de estudos e pesquisas realizados pela comunidade científica.

É crucial ressaltar que o sucesso da inclusão das mulheres nas operações de combate do EB depende do contínuo desenvolvimento dos estudos, visando garantir a realização dos cursos e estágios necessários para a aquisição das competências desejadas. Isso é fundamental para promover a plena operacionalidade das mulheres nas áreas bélicas.

Por último, podemos constatar que os estágios de Operações Aeromóveis, Operações no Pantanal, Tático/ Técnico de Blindados e Adaptação/ Operações na Caatinga, juntamente com os cursos existentes, como Operações na Selva, Básico Paraquedista, Mestre de Salto, Básico/ Avançado de Montanhismo e o curso de Ações de Comandos, têm o potencial de impulsionar o avanço da participação das mulheres em atividades de combate. Portanto, ao não prever distinção entre os segmentos feminino e masculino, ou diferenças nos critérios de avaliação para candidatas e candidatos, o EB se destaca como uma das forças militares mais profissionais, bem treinadas e capacitadas do mundo.

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