Milícia paramilitar do Irã recruta cidadãos comuns para tentar acabar com a contestação popular

A imprensa francesa desta quarta-feira (9) trata da repressão no Irã ao movimento de contestação, que já dura quase dois meses. O jornal La Croix publica uma matéria assinada por seu correspondente em Teerã sobre uma nova estatégia do regime iraniano: recrutar cidadãos comuns para reprimir as manifestações.

Segundo o La Croix, uma milícia paralimitar, a Bassidj, ligada aos Guardiões da Revolução, está convocando adolescentes e aposentados para ajudar a acabar com os protestos. Equipados de cassetetes, escudos, tasers e sprays de pimenta, alguns até de armas de fogo, eles dispersam os protestos. 

O correspondente do La Croix conversou com Salar, um dos integrantes de grupos que saem às ruas da capital iraniana à noite para reprimir os manifestantes. Aos 16 anos, ele participa das operações junto a colegas da escola e recebe em troca um salário mais alto do que o de um emprego em meio período. 

Segundo o diário, além da remuneração mensal, os membros da Bassidj contam com muitas vantagens, recebem descontos do governo e plano de saúde.  A milícia contaria atualmente com 24 milhões de pessoas e é encarregada de recrutar, treinar e organizar voluntários para proteger os ideais islâmicos. "A estrutura se reforça e multiplica suas bases em várias cidades, tornando-se um meio potente de repressão", diz a matéria. 

Além disso, vários membros da Bassidj são contratados pelas agências de inteligência iranianas. Muitos deles têm autorização para realizar prisões em manifestações e batidas policiais. "Um poder inédito, denunciado por muitos cidadãos que os consideram como fantoches de políticos extremistas, responsáveis pelo sentimento crescente de insegurança", ressalta a matéria.

Quase dois meses de revolta

Diante da determinação dos manifestantes, o regime emprega uma "resposta feroz" contra os manifestantes, afirma o jornal Libération. O diário destaca que nada parece acabar com a revolta da população e "milhares de manifestantes continuam a desafiar o poder" saindo às ruas. 

Raras são as imagens que conseguem escapar do controle da internet e das redes sociais, afirma Libé. Mas as poucas fotos e gravações que militantes conseguem divulgar mostram mulheres queimando o véu islâmico, homens arrancando os turbantes dos mulás, universitários gritando frases contra o regime, adolescentes protestando contra a separação de meninos e meninas nas escolas.

Apesar da admirável coragem da população, "a revolta tem um outro lado, muito mais obscuro", lamenta Libération, lembrando os mais de 300 mortos desde meados de setembro, entre eles 41 crianças e 24 mulheres. "Ao ousar se opor ao poder, os manifestantes arriscam suas vidas", diz a matéria. Além das vítimas, mais de 14 mil pessoas foram presas, entre eles, menores de idade, estudantes, defensores dos direitos humanos, advogados e jornalistas. 

O diário explica que a revolta dos iranianos teve início com a morte de Mahsa Amini, de 22 anos, em setembro. Ela foi detida pela polícia da moral pelo uso incorreto do véu islâmico, obrigatório às mulheres no Irã. Ao deixar parte de seus cabelos à mostra, a jovem curda foi levada para a prisão, e morreu poucos dias depois em um hospital de Teerã. Segundo o irmão de Mahsa, que testemunhou a detenção, os policiais a agrediram. As autoridades iranianas, no entanto, jamais reconheceram qualquer responsabilidade na morte da jovem.

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