GUERRA FRIA 2.0 – ÁFRICA. O Assassinato de Jornalistas Evidencia a Presença Russa na República Centro Africana

 

Exclusivo DefesaNet

O processo descrito por Frederico Aranha vai além da África. As mesmas ações realizadas pelo Grupo Wagner na África também ocorrem na Venezuela, tanto para atender os interesses russos como os dos chineses.

As ações do "Arco Minero", uma província mineral, similar à de Serra Pelada em riquezas , tanto em ouro como pedras preciosas. A Venezuela cedeu  os interesses territoriais à China para a exploração da maior parte do "Arco Minero". Nestas áreas a República Bolivariana da Venezuela abdicou de seus direitos territoriais.

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GUERRA FRIA 2.0 – ÁFRICA. O Assassinato de Jornalistas Evidencia a Presença Russa na República Centro Africana.

                                                   

   Frederico Aranha

Pesquisador Independente.

                                                                                 Advertência: tradução livre.

(1) Em 31 de Julho de 2018, foi anunciada a morte de três jornalistas russos perto de Sibut, República Centro Africana (CAR). O cameraman Kirill Radchenko, o diretor de cinema Alexander Rastorguyev e o proeminente correspondente de guerra Orkhan Dzhemal estavam viajando na estrada entre Sibut e Kaga Bandoro – a capital de um proto-Estado separatista formado por milícias muçulmanas.

(2) A investigação oficial conduzida por autoridades locais, a Embaixada Russa e a Missão da ONU na CAR, demonstrou que os jornalistas passaram pelo checkpoint de Sibut ao redor de 2000 GMT.  Ignorando aviso para não viajarem à noite, eles foram emboscados por assaltantes não identificados 32 km ao norte de Sibut. De acordo com as autoridades da CAR, dez homens fortemente armados, “usando turbantes e falando nem em francês nem em sango” (sugerindo milicianos muçulmanos), tentaram roubar o veículo. Os três jornalistas resistiram e foram mortos a tiros. O “motorista escapou ferido e avisou a polícia em Sibut”.

(3) A CAR vive uma guerra intestina, de modo que roubos a mão armada e assaltos a estrangeiros são frequentes. Assim sendo, a narrativa oficial pareceu plausível. Eventualmente, os três jornalistas estavam simplesmente no lugar errado na hora errada. Todavia, a natureza das averiguações que faziam na CAR foi capaz de levantar suspeitas de uma investigação oficial arranjada.  

(4) Radchenko, Rastorguyev e Dzhemal estavam trabalhando num documentário sobre a companhia privada de mercenários (PMC) Wagner, sediada em São Petersburgo, e suas atividades na CAR. O Grupo Wagner, sabidamente, é propriedade de Yevgeniy Prigozhin, magnata russo ligado intimamente ao Presidente Vladimir Putin.

(5) Apesar do Governo Russo nunca ter admitido oficialmente a existência da Wagner, a PMC é a opção do Serviço Militar de Inteligência (GRU) quando se faz necessário mobilizar operações politicamente sensíveis no exterior. Particularmente, a Wagner é conhecida por combater ao lado de tropas russas regulares e das milícias financiadas pelo Irã na Síria, e por apoiar os separatistas da Donbass, leste ucraniano. A morte dos três jornalistas expõe o envolvimento da Wagner na segurança e negócios de mineração na CAR, jogando luz sobre novas ambições da Rússia na África.

(6) Inspirando-se no passado soviético, a Rússia tenta cada vez mais ganhar acesso a recursos escassos e valiosos empenhando-se ao mesmo tempo para minar a influência ocidental em países em desenvolvimento. Sob este aspecto a CAR é da mais alta prioridade, pois é o país mais pobre do mundo, altamente instável e violento, mas simultaneamente rico em recursos minerais tais como ouro, diamantes de altíssima qualidade, urânio e outros. Em 2013, o caos imperou no país, porquanto as milícias muçulmanas derrotaram as forças governamentais e tomaram a capital. Em que pese uma intervenção militar francesa tenha expulsado os rebeldes da capital em 2014, infligindo-lhes duras perdas, o governo central continua sem poder político e militar nas províncias. Uma força de paz de 6.000 homens da ONU tem como missão manter o frágil status quo.   

(7) Em Novembro de 2017, a Rússia recebeu uma autorização da ONU para vender armas para o governo central da CAR, de acordo com a lista de pedidos: 900 pistolas semi-automáticas Makarov, 5.200 fuzis automáticos Kalashnikov,  800 metralhadoras leves Kalashnikov, 140 fuzis de precisão (na maioria Dragunov), 270 lança-rojões anticarro RPG7, 20 lançadores de mísseis antiaéreos portáteis (MANPAD) e munição correspondente. O governo russo deslocou 170 assessores civis (operadores da Wagner) e cinco oficiais das Forças Armadas russas para treinar os militares da CAR.

(8) Segundo a investigação realizada pelo CITEAM, a Wagner estabeleceu seu Centro de Comando num sítio em Berengo, cerca de 40 km a sudoeste da capital. Imagens de satélite coletadas pelo CITEAM revelam que uma dupla fileira de abrigos foi erguida no local em 22 de Janeiro de 2018. O complexo foi um dos locais que os três jornalistas tentaram filmar – o acesso foi negado, porquanto eles não tinham a “credencial de imprensa apropriada”.  

 

   Centro de Comando da Wagner em Berengo. CITEAM

(9) Paralelamente ao “assessoramento especializado” prestado ao governo central da CAR, a Wagner está também envolvida nos negócios de mineração do país, fornecendo sobremodo serviços de segurança armada e equipamento de transporte e vigilância local para a companhia Lobaye Invest.

(10) A Lobaye Invest faz parte do M-Invest Group, “controlado” pelo fundador da Wagner Yevgeniy Prigozhin. Recentemente, a Lobaye assumiu as operações da mina de ouro Ndassima, 60 km ao norte de Bambari. Oficialmente, a companhia canadense AXMIN detém os direitos de exploração da mina como parte do “Passandro Gold Project”. No entanto, em Dezembro de 2012 a mina foi tomada pelas forças muçulmanas. Após a ocupação, os rebeldes obrigaram a população local a trabalhar na mina, extraindo ouro por meio de técnicas rudimentares.

(11) Como lhes faltava o know-how necessário, os rebeldes não conseguiram  operar a mina Ndassima a plena capacidade. Em face disso propuseram uma associação com a Wagner, o que permitiria à Lobaye explorar a mina em troca da participação deles nos resultados. De acordo com uma reportagem do jornal russo Novaya Gazeta (1), representantes da Wagner sondaram os arredores da mina em Abril de 2018, negociando diretamente com os lideres rebeldes. As atividades dos mercenários receberam atenção pública porque seu avião Cessna foi bloqueado por residentes em Kaga-Bandoro e liberado por ação das forças da ONU (2). As fontes sugerem que os três jornalistas assassinados estavam planejando documentar a presença da Wagner na mina Ndassima.

 

   Imagens de satélite da área do Projeto Passandro. A mina Ndassima está à esquerda.  

O Cessna da Wagner bloqueado, protegido pela força da ONU. ASLuhn.

(12) A associação Wagner/Lobaye com os rebeldes é uma infração direta às garantias russas dadas ao governo central reconhecido pela ONU.  O acordo Rússia-CAR serve como uma fachada para alimentar os interesses comerciais do círculo de oligarcas ligados a Putin no mercado mineral na África. Ao mesmo tempo, o jogo duplo da Rússia vai exacerbar as tensões rebeldes-governo e desestabilizar a região policiada pela ONU e pela França.  Com a Wagner na linha de frente, a Rússia está matando três coelhos com uma cajadada: vende armas para o governo da CAR, explora as minas em poder dos rebeldes por meio de associados e cria problemas geopolíticos para o Ocidente.  

NOTAS

(1) https://www.novayagazeta.ru/articles/2019/01/10/79135-hronika-horosho-podgotovlennoy-smerti?utm_source=push

(2) https://twitter.com/ASLuhn/status/1083364437673869312/photo/1

FONTES DE CONSULTA

https://www.novayagazeta.ru/

https://citeam.org/

https://www.telegraph.co.uk/

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