Empreiteiras competem com chinesas na África


Nota DefesaNet

O Brasil sofre uma Guerra Econômica e Comercial nos principais mercados de atuação, por seus novos aliados, especialemente partindo do governo Chinês.

O Editor


Francisco Góes 
De Nacala (Moçambique)


Na cidade portuária de Nacala e na vila vizinha de Nacala-à-Velha, no norte de Moçambique, homens circulam à beira da estrada com uniformes das construtoras Odebrecht e OAS, entre baobás, a árvore típica africana, e mulheres vestidas com capulanas, os tradicionais panos coloridos. Os uniformes dos trabalhadores são um sinal da presença da engenharia brasileira na África. As empresas desembarcaram em Moçambique para prestar serviços à Vale e passaram a olhar também oportunidades em outros projetos privados e na infraestrutura no país.

Mas no jogo pela conquista de mercados na África e, em particular, em Moçambique, as empreiteiras brasileiras vêm enfrentando a forte concorrência dos chineses, sobretudo na disputa por obras públicas. "É como se os chineses jogassem a primeira divisão e nós [brasileiros], a segunda, quando o assunto é crédito à exportação de bens e serviços", disse Miguel Peres, diretor-superintendente da Odebrecht em Moçambique.

A afirmação de Peres remete à capacidade das construtoras chinesas de estruturar financiamentos de forma rápida e de oferecer ao governo de Moçambique, assim como ao de outros países africanos, empréstimos em condições facilitadas. Essa é uma condição com a qual as empreiteiras brasileiras não conseguem competir, mesmo tendo o apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O banco de fomento financia a exportação de bens e serviços brasileiros para projetos no exterior. No fim de 2013, o BNDES inaugurou escritório de representação em Joanesburgo, na África do Sul, país vizinho de Moçambique, com o objetivo de prospectar negócios envolvendo empresas brasileiras e de reforçar a presença do Brasil no continente africano. Paulo Roberto de Oliveira Araújo, chefe do escritório do BNDES na África, disse que o continente é uma das últimas fronteiras a serem exploradas. As empresas brasileiras se espalham pela região depois de terem se estabelecido em Angola e Moçambique. Além dos dois países, as brasileiras estão presentes na África do Sul, Gana, Marrocos, Nigéria, Quênia e Argélia, disse Araújo. "Acreditamos que teremos cada vez mais empresas brasileiras na África, região que tem registrado altos níveis de crescimento econômico."

Na África, o principal mercado envolvendo financiamentos do BNDES é Angola, mas Moçambique vem ganhando importância. No total, o BNDES tem carteira de US$ 800 milhões em financiamentos para Moçambique, entre projetos em análise, aprovados e contratados. A aproximação entre os governos do Brasil e de Moçambique, em torno de um conjunto de projetos de infraestrutura, começou ainda no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e continuou com a presidente Dilma Rousseff e seu colega moçambicano, o presidente Armando Guebuza. Moçambique passou por 15 anos de guerra civil, a partir da independência do país de Portugal, em 1975. O conflito só terminou em 1992 com um acordo de paz assinado em Roma. Ainda hoje, em parte como resultado da guerra, o país tem muitas necessidades de investimento em infraestrutura.

Na disputa com os chineses, o Brasil também tem as suas "armas". Elas incluem, além do apoio do BNDES, a qualidade dos projetos e o prazo de execução das obras. Outro ponto a favor do Brasil é o compromisso com treinamento e qualificação de mão-de-obra local. Mas a presença dos asiáticos em Moçambique é muito forte. Nas ruas de Maputo, a capital do país, é possível ver operários chineses trabalhando em obras. As empresas chinesas são atuantes na construção civil local. O novo aeroporto de Maputo chegou a ser disputado pela Odebrecht, mas terminou sendo construído por empresas chinesas em um prazo rápido, de cerca de um ano e meio.

A Odebrecht ganhou, no entanto, contrato para construir o aeroporto de Nacala, que será entregue em agosto. "Estamos trabalhando para deixar o aeroporto em condições de início de operação comercial em agosto. Mas o início efetivo depende do nosso cliente, a Aeroportos de Moçambique, que vai ser o operador, e da Linhas Aéreas de Moçambique [ LAM ], que vai operar os primeiros voos comerciais", disse Miguel Peres, da Odebrecht. O aeroporto de Nacala, com capacidade para receber 500 mil passageiros por ano, está recebendo investimentos de US$ 200 milhões, dos quais US$ 125 milhões financiados pelo BNDES, disse Peres. A Odebrecht analisa outras oportunidades de negócios no país. A Andrade Gutierrez também tem boas perspectivas de negócios em Moçambique (ver matérias).

"Em prazo de execução e qualidade, o Brasil é competitivo [na África]. Temos ainda o compromisso com o treinamento e utilização da mão-de-obra local, o que faz diferença", diz Júlio Brant, vice-presidente da Andrade Gutierrez para a África Subsaariana. Ele vê, no entanto, a China bem posicionada: "Os chineses têm rapidez e agilidade para colocar projetos de pé e o fazem em três ou quatro meses." O executivo avaliou que os chineses estão se sofisticando nas estruturas de operação, mas tornam-se mais caros. As empresas chinesas oferecem financiamentos baratos, mas aumentam o custo na execução das obras, afirmou.

Otávio Pereira de Magalhães, superintendente da OAS em Moçambique, afirmou que a posição competitiva do Brasil no país se relaciona ao apoio do BNDES na exportação de bens e serviços e à ligação cultural que o Brasil tem com os moçambicanos. Brasil e Moçambique são ex-colônias portuguesas. A OAS tem em andamento dois contratos de construção para projetos da Vale na região de Nacala, que somam US$ 242 milhões. Um dos projetos, no valor de US$ 180 milhões, envolve a construção de uma estrutura de engenharia civil, onde serão instalados os chamados viradores de vagões. São máquinas que descarregam o carvão transportado pelos vagões ferroviários quando os comboios chegarem ao porto, antes do embarque do produto nos navios.

Para as obras em mar envolvendo o terminal portuário, incluindo uma ponte de 1,3 quilômetro de extensão e um píer para atracação de navios de grande porte que vão carregar o carvão, a Vale contratou a chinesa China Harbour Engineering Company (Chec). O segundo contrato da OAS com a Vale, no valor de US$ 60 milhões, incluiu a construção de um trecho com quase 30 quilômetros do Corredor Nacala, a ferrovia que vai transportar o carvão da Vale produzido nas minas de Moatize, em Tete, a mais de 900 quilômetros de distância, até o terminal da mineradora em Nacala-à-Velha, província de Nampula. Há ainda outra empresa chinesa fazendo outro trecho das obras do Corredor Nacala, a China Railway 20 Bureau Group Corporation.

Magalhães disse que as obras para a Vale começaram em setembro de 2012 e serão entregues no fim do ano. A OAS também analisa oportunidades de infraestrutura ligadas à indústria de óleo e gás, assim como a Andrade Gutierrez. Moçambique descobriu grandes reservas de gás natural em mar, na província de Cabo Delgado, no norte do país, perto da fronteira com a Tanzânia, e o desenvolvimento dos campos vai exigir investimentos em infraestrutura de logística, como portos.

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