A importância do ensino presencial na formação dos Oficiais do Exército Brasileiro

Cel R1 Marcio da Silva Amorim

A profissão militar é uma daquelas em que o caráter coletivo não é uma opção, um acessório ou mesmo um acréscimo relevante à atividade principal. Ela somente se efetiva na coletividade, na organização e na atuação de grupos.

Certamente, sempre existiram, por trás de grandes conquistas, posturas e desempenhos individuais extraordinários, as mentes de todos que contribuíram para que ideias fossem geradas; e as mãos de homens e mulheres que tiveram a capacidade e a coragem de colocá-las em prática.

A Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), como matriz anímica, tangível e estrutural dos quadros do Exército Brasileiro, possui um processo pedagógico pautado por um currículo orientado para o desenvolvimento de competências. Contribui, ainda, para desenvolver, em seus discentes, a mentalidade de prontidão permanente e de disponibilidade para o serviço 24 horas por dia, 7 dias por semana, sem reivindicar qualquer remuneração extra, compensação de qualquer ordem ou cômputo de serviço especial.

Reforçando todo esse cabedal de valores próprios da caserna, interioriza-se o espírito de corpo em nossa formação, que reflete o grau de coesão da tropa e de camaradagem entre seus integrantes, caracterizando o “orgulho e a vontade coletiva” e, em especial, o culto de valores e tradições próprios de nossas raízes e do nosso berço de nacionalidade.

A perspectiva metodológica do ensino por competências (segundo Antoni Zaballa, educador espanhol que, assim como outros estudiosos, dá sustentação teórica à condução dessa modalidade pedagógica) acena para a necessidade de educarmos para a completude do indivíduo. Ele aponta para as mesmas conclusões alcançadas no relato de Jacques Delors (UNESCO/OCDE), de meados da década de 90, o qual concluiu que: “saber-conhecer”, “saber-fazer”, “saber-ser” e “saber-conviver” são as competências vitais a serem desenvolvidas no cidadão do século XXI. Hoje, elas se constituem nos pilares da educação contemporânea; fazem parte dos parâmetros curriculares da educação brasileira; e norteiam o processo educativo da Academia Militar.

Na AMAN, isso se reflete no seu currículo que aponta para a formação integral do profissional militar: a constante busca pelo desenvolvimento de capacidades que levem o oficial a dominar conteúdos; a aplicar conhecimentos; e a possuir predicados necessários para demonstrar atitudes adequadas em contextos variados, envolvendo situações e pessoas, nas mais diversas circunstâncias da vida do oficial.

Na Academia, não existe o investimento na educação de indivíduos sem considerarmos o caráter institucional que lhe é inerente. O ensino presencial é a única modalidade capaz de fazer com que a formação dos oficiais não apresente lacunas, ao serem consideradas as premissas e práticas de um currículo que procura desenvolver as competências do profissional militar.

A mediação por meio de uma tela de computador não é eficaz o suficiente para que os cadetes aprendam, por exemplo, a utilizar técnicas militares e aplicar conceitos doutrinários do emprego do Exército Brasileiro, enquanto desenvolvem a capacidade de ser resiliente diante das dificuldades; de respeitar os limites e de aproveitar as potencialidades dos subordinados; de ter equilíbrio emocional ao manusear armas ou de decidir sobre aspectos filosóficos e psicológicos que envolvem o destino de outras vidas; dentre tantos outros conteúdos cognitivos e atitudinais que precisam ser aprendidos e aprimorados.

Esse é o caráter global do ensino e da aprendizagem na AMAN. É impossível, para sermos responsáveis com a formação esperada dos oficiais do Exército Brasileiro, dissociarmos o saber, do fazer, do ser e do conviver. Não é individualmente ou guardando qualquer tipo de afastamento social que se consegue levar, a bom termo, o desenvolvimento das competências necessárias ao oficial.

Na AMAN, diuturnamente, são aplicadas avaliações atitudinais por meio das quais os cadetes são observados pelos pares e superiores ao realizarem atividades psicomotoras e cognitivas, proporcionando, assim, uma acurada correção de rumos e atitudes. Importantes atributos – como liderança, lealdade e camaradagem – somente são evidenciados em trabalhos presenciais nos quais o cadete, inserido em sua turma de aula ou em uma patrulha, pode desenvolvê-los e ser observado, orientado e avaliado com vistas ao aprimoramento desses aspectos fundamentais na formação do futuro oficial.

Por sua vez, o ensino a distância, ou mesmo o semipresencial, embora possa, teoricamente, agregar qualidade a qualquer processo educativo, não é suficiente para promover uma educação que prima pelo desenvolvimento de capacidades socioemocionais, físicas e cognitivas de maneira integrada.

Todo o aprendizado na AMAN passa, quase sempre, pela construção e atuação de grupos. As técnicas e as práticas precisam ser aplicadas pelos cadetes, sendo expostos a circunstâncias em que sentimentos, percepções, cognições, aptidões e choques de visões os tornem protagonistas e coadjuvantes a depender da pluralidade de circunstâncias e papéis que desempenhem na sala de aula, nos exercícios militares ou em qualquer outro ambiente. Tudo isso não seria possível ser feito por intermédio de aplicativos e de plataformas digitais, em que os alunos guardem distâncias físicas ou permaneçam isolados.

Com esse propósito, a AMAN lança mão de uma plêiade muito capacitada de professores e instrutores, assim como adota metodologias ativas de aprendizagem e suportes pedagógicos e tecnológicos em apoio ao ensino. Tudo isso, tendo a interdisciplinaridade e a contextualização como linhas mestras estruturais.

Cotidianamente, busca pela inovação tanto no ensino, aproveitando as capacidades de aprendizagem que a neurociência assinala para atender às demandas e expectativas da Força Terrestre, quanto no preparo dos oficiais para vencer os desafios contemporâneos a serem enfrentados em ambientes voláteis, incertos, complexos e ambíguos nos corpos de tropa.

Tudo por um ideal! Agulhas Negras, Brasil!


Sobre autor: Marcio da Silva Amorim: Cel R1 de Artilharia; bacharel em Ciências Militares / AMAN 1993; mestre em Ciências Militares / EsAO 2001; e licenciatura em Pedagogia pela UERJ.

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