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A falta que faz a inovação

Pedro Henrique Medeiros, 14 anos, pretende, quando adulto, construir uma casa onde não faltará nada: computador, internet, tablet, videogame, eletrodomésticos, churrasqueira, piscina, carro na garagem e tudo mais que vier a ser inventado nos próximos anos ou que a imaginação de um adolescente alcançar. Para isso, ele sabe que terá de estudar muito, apesar de ainda não ter certeza sobre qual profissão seguirá. Por enquanto, está dividido: vai tentar ser jogador de futebol, mas, se não der certo, trabalhará com educação física.

"Se não conseguir entrar para um clube grande, vou fazer uma faculdade. Tenho que me preparar desde já, porque entrar no mercado de trabalho ficará cada vez mais difícil", reconhece Pedro, que está no primeiro ano do ensino médio. A ansiedade em relação ao futuro é compartilhada com o amigo Thalisson Gomes, 14, com quem ele treina duas vezes por semana em um time de futebol de Ceilândia. "A exigência para conseguir um emprego aumenta todos os dias. Tem que saber informática, inglês, ter diploma", complementa. "Mas, no meu caso, faculdade só se for pública. Minha família não tem dinheiro para pagar", emenda Thalisson.

A consciência dos adolescentes reflete a preocupação de um país que precisa inovar para crescer, mas que ainda carece de infraestrutura e mão de obra qualificada. E os desafios enfrentados por Pedro e Thalisson não são menores do que os que se colocaram no caminho de empresários e governantes. O maior deles está em como desenvolver uma política industrial eficiente que permita o crescimento econômico do País e as transformações necessárias para que os dois jovens conquistem um padrão de consumo tão sofisticado, equiparável ao de países desenvolvidos.

Antes de Pedro e Thalisson nascerem, há duas décadas, o País viveu um processo de abertura econômica que resultou no aumento da concorrência e na oferta de produtos melhores e mais baratos. Os brasileiros passaram a ter mais acesso a bens como eletrodomésticos, computadores pessoais e veículos, embora tenham persistido, até os dias atuais, oligopólios em vários setores. As conquistas do passado, entretanto, estão hoje em xeque. A perspectiva é de um longo período de estagnação em países da Europa e nos Estados Unidos. Com o Primeiro Mundo em crise e à beira da falência, o crescimento global se sustenta, em grande parte, na demanda doméstica pujante dos emergentes – especialmente do Brasil -, graças à entrada de milhões de trabalhadores na classe média.

Com todos querendo despejar no mercado brasileiro montanhas de produtos encalhados mundo afora, os problemas sistêmicos do setor industrial ficaram mais evidentes do que nunca. A atividade das fábricas voltou a patinar – cresceu apenas 0,3% em 2011 -, a despeito do aquecimento no comércio interno, o que desenterrou o velho fantasma do protecionismo. É inegável que, ao longo dos anos, o País construiu uma base industrial que impulsionou o crescimento e absorveu grande contingente de mão de obra – hoje, o Brasil está muito próximo do pleno emprego, com um índice médio de desocupação de 6%, o menor da história. Mas a verdade é que a indústria está praticamente estagnada desde 2008. Enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) acumulou alta de 16% nos últimos quatro anos, o PIB da indústria de transformação cresceu apenas 4%.

"Não haverá crescimento sustentado de longo prazo se a indústria continuar com desempenho tão abaixo da média do PIB", alerta Célio Hiratuka, professor do Núcleo de Economia Industrial e de Tecnologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Empresários, estudiosos e governantes são unânimes em afirmar: o centro do problema está na baixa capacidade competitiva do setor. "As dificuldades vão desde o excesso de tributação à logística deficiente, alto custo da energia, do capital e dos serviços e, claro, do dólar barato, que estimula um volume excessivo de importações", explica Júlio Gomes de Almeida, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).

Diante de tantos obstáculos, os empresários não conseguem inovar e, salvo raras exceções, perdem mercado para produtos estrangeiros, geralmente melhores e mais baratos. A mais recente versão do Global Entrepreneurship Monitor (GEM) mostra que o nível de inovação no Brasil ainda está muito aquém do razoável. Pouco mais de 10% dos novos negócios no País trazem ao mercado bens e serviços verdadeiramente inovadores, desempenho que só não é pior do que o de Bangladesh. Em 2010, o Brasil havia ocupado a última posição entre 54 países.

Atualmente, o investimento em inovação no Brasil equivale a 1,2% do PIB, dividido em 0,65% proveniente do setor público e 0,55% do setor privado. Ronaldo Mota, secretário de Desenvolvimento Tecnológico do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), revela que a meta do governo é elevar esse índice para 1,8% do PIB até 2014, dividido em 0,9% do setor público e 0,9% do privado. "O Brasil precisa crescer muito os aportes em ciência e tecnologia. Nesse processo, a elevação dos investimentos privados precisa ser a um ritmo ainda mais acelerado que o setor público", declara. Ainda assim, o País ficará abaixo da média dos emergentes, hoje de 2% do PIB.

O resultado é que o setor de tecnologia da informação e comunicações, no qual o grau de inovação é elevadíssimo e as transformações de mercado, constantes, responde por apenas 3,5% do PIB brasileiro. Em 1980, o Brasil era mais desenvolvido que a Coreia do Sul e a China. Ao longo desses anos, enquanto as duas nações alcançaram índices de investimento da ordem de 30% do PIB, o complexo brasileiro de tecnologia da informação simplesmente não avançou. "Ainda há muito espaço para o crescimento do setor de TI no País, que deve dobrar de tamanho até 2020. Hoje, a oferta está concentrada basicamente nos grandes centros", avalia John Foreman, diretor de Capacitação da Associação para a Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex).

A soma desse conjunto de fatores – economia global em crise, baixa competitividade da produção nacional, investimentos em inovação aquém da média mundial e fraco desenvolvimento tecnológico – compõe o ciclo de atraso que ameaça a sustentabilidade do crescimento econômico. A pauta exportadora perde, a cada dia, a participação de itens de média e alta tecnologia, enquanto a lista de commodities permanece dominante. Há, contudo, exceções, como Embraer, Embrapa e Natura, que independem de proteções comerciais ou reserva de mercado para se manterem competitivas tanto no mercado doméstico quanto no internacional.

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