Eugene Kaspersky: “Precisamos de hackers para nos defender”

BRUNO FERRARI

Até o fim do século XX, a lógica das guerras era a mesma: quem tinha o exército mais poderoso e mais dinheiro para comprar armas saía vencedor. O desenvolvimento tecnológico e a dependência digital das nações mudaram esse cenário. “A informação hoje vale muito mais do que exércitos ou dinheiro.” Quem garante é Eugene Kaspersky, um russo de 45 anos formado nos anos 80 numa escola de segurança da informação copatrocinada pela KGB e pelo Ministério da Defesa da Rússia. Em 1997, fundou sua própria empresa de segurança. No ano passado, venceu o maior desafio de sua carreira. Ajudou a encontrar uma vacina para o vírus Stuxnet, considerado um marco na ciberguerra.

QUEM É
Especialista em segurança da informação, fundador da Kaspersky Lab, uma das principais empresas de antivírus do mundo

O QUE FEZ
Ajudou a identificar o Stuxnet, o vírus que atacou as usinas nucleares iranianas em 2010

ÉPOCA – Que riscos corremos?
Eugene Kaspersky – Há cibercriminosos que invadem sites de empresas ou de governos para roubar informações, e hacktivistas, como o LulzSec e o Anonymous. E há um terceiro grupo, mais perigoso. São os desenvolvedores de vírus como o Stuxnet, criados para a sabotagem industrial. O Stuxnet é o vírus mais complexo e poderoso já desenvolvido. Tinha como alvo específico usinas nucleares do Irã. Ele exigiu milhões de dólares em investimentos. Foi feito por pessoas tecnicamente muito avançadas e com acesso a um volume grande de informações. Algo que só um governo poderia financiar. Depois dele, a cibersegurança virou prioridade nos departamentos de defesa dos Estados. Ao mesmo tempo que grupos antigovernos encontraram uma nova arma para atacar seus alvos.

ÉPOCA – Como nos defenderemos?
Kaspersky – Os governos precisam ter um plano nacional de segurança tecnológica. As agências de segurança devem investir em profissionais mais qualificados para defender suas redes. E onde encontrar essas pessoas? Os governos precisam investigar os recentes ataques e eventualmente punir os responsáveis. Mas o principal é construir uma estrutura leal de defensores. Grupos hacktivistas como o Anonymous e o LulzSec são as melhores fontes para buscar esse profissional. Os ataques recentes mostraram que a infraestrutura dos países é ruim. Mas ainda temos tempo para resolver.

ÉPOCA – Quem está mais vulnerável?
Kaspersky – As nações democráticas, muito dependentes de sua infraestrutura digital: Estados Unidos, Canadá, Europa, Japão, Austrália, Israel entre outros. Já países como a China são menos vulneráveis porque possuem sua própria fronteira tecnológica. Como é tudo controlado, eles poderiam tecnicamente “fechar” o país em caso de um ataque. Por um lado, é um posicionamento que impede a livre circulação de informações na internet. Por outro, é uma forma de manter sua rede mais protegida.

ÉPOCA – A ciberguerra fará vítimas humanas?
Kaspersky – Já fez. Foram ataques não planejados para fazer vítimas humanas, mas que acabaram indiretamente matando pessoas. Em agosto de 2003, mais de 150 pessoas morreram na queda de um avião em Madri. A perícia identificou que a razão dessa catástrofe seria um problema técnico no avião. Esse problema não foi reconhecido pelos engenheiros porque os computadores estavam infectados por um vírus. E eu tenho a impressão que no futuro teremos mais cenários como esse.

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