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Roberto Lopes – EXCLUSIVO: Londres exige que Tel-Aviv diga como serão os Kfirs argentinos


Londres exige que Tel-Aviv diga
como serão os Kfirs argentinos

 

Roberto Lopes
Jornalista especializado em assuntos militares. Em 2000 graduou-se em
Gestão e Planejamento de Defesa no Colégio de Estudos de Defesa Hemisférica
da Universidade de Defesa Nacional dos Estados Unidos, em Washington
(Fort Leslie F. McNair). É também pesquisador associado ao Laboratório de
Estudos da Etnicidade, Racismo e Discriminação da Universidade de São Paulo.
Autor de vários livros, em maio de 2001 publicou a monografia
“Oportunidade para Civis na Condução dos Assuntos da Defesa Nacional: o Caso do Brasil”
.

O governo do Premiê David Cameron exige receber de Israel uma descrição pormenorizada dos sistemas – eletrônicos e de motorização – a serem embarcados nos 18 caças Kfir Block 60, que a IAI (Israel Aerospace Industries) tenciona transferir, no início de 2015, para a Força Aérea Argentina.

O ultimato foi apresentado no início de dezembro, por representantes diplomáticos e do Ministério da Defesa britânico, diretamente nos gabinetes dos ministros do Exterior e da Defesa de Israel. Os ingleses temem que as aeronaves sejam empregadas para localizar e intimidar as embarcações de duas companhias petrolíferas – uma dos Estados Unidos e outra da Inglaterra – que se preparam para viajar às Ilhas Malvinas, a fim de providenciar, ano que vem, o início das sondagens submarinas em duas áreas marítimas ao norte do arquipélago.

O assunto vem sendo monitorado desde o fim de 2013 pelo Itamaraty e pelo Ministério da Defesa em Brasília.

A postura agressiva de Londres repete o comportamento adotado em abril de 1982 junto ao governo da França, depois que os argentinos invadiram as Malvinas. Os britânicos exigiram um relato detalhado dos equipamentos que haviam seguido a bordo dos caças franceses Étendard, exportados a partir do fim de 1981 para a Marinha argentina. Mas apesar de Paris ter aceitado colaborar com os ingleses, o episódio teve um desfecho surpreendente.

Os franceses informaram que os poucos mísseis Exocet exportados juntamente com os aviões – dois para cada aeronave – não haviam sido integrados à aviônica de bordo e, portanto, não estavam operacionais. O  problema é que os militares argentinos conseguiram fazer a integração entre a arma e o caça, e os Exocets foram usados com sucesso contra a frota de Sua Majestade destacada para recuperar as ilhas…

Em novembro do ano passado, o Comitê de Controle de Exportação de Armas da Câmara dos Comuns aprontou um Report of the Committees on Arms Export Controls – 900 páginas distribuídas por três volumes – no qual a Argentina aparece como país proibido de receber quaisquer sistemas bélicos. Os ingleses têm motivos para estarem temerosos.

Nesta última terça-feira, 14 de janeiro, ao ser empossado como novo Secretário de Assuntos Relativos às Ilhas Malvinas, Georgias do Sul e Sandwich do Sul do ministério das Relações Exteriores argentino, o ex-presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Daniel Filmus, voltou a ameaçar as companhias e os técnicos que se dispuserem a explorar o petróleo das águas malvinenses com prisão e penas de reclusão em regime fechado.

A preocupação do governo Cameron com a exportação de caças Kfir para os argentinos começou ainda em agosto de 2013, quando a IAI admitiu que havia dois países interessados em adquirir uma versão modernizada dos velhos caças Kfir. Surgiram especulações de que esses clientes fossem as forças aéreas da Bulgária e das Filipinas, mas logo apareceu um rumor insistente sobre o interesse da Argentina.

A notícia ganhou espaço com a decisão do governo Cristina Kirchner de dispensar a oferta feita por Madri de 20 caças de segunda mão Mirage F-1M, dos estoques da Força Aérea Espanhola.

O oferecimento implicaria em um desembolso menor que aquele que caberá a Buenos Aires fazer para obter os jatos Kfir – 160 milhões de euros (217,6 milhões de dólares) contra 500 milhões de dólares – mas a diferença qualitativa entre os dois equipamentos justifica o gasto maior.

Os Mirages espanhóis chegariam à Argentina praticamente “depenados”: 

a) o GPS de alta precisão embarcado nas aeronaves espanholas opera por meio de um código conhecido como P(Y) só autorizado para forças aéreas integrantes da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte);
b) o sistema de identificação de aeronaves amigas/inimigas dos Mirage espanhóis conta com um interrogador que funciona por meio de uma chave criptografada também só disponível para nações filiadas à Otan;
c)  o radar Cyrano IVM do Mirage ofertado não possui capacidade de detecção diretamente para baixo, o que limita o emprego de mísseis de médio alcance por parte da aeronave;
d) os Mirages espanhóis também seriam entregues ao argentinos sem a interface eletrônica entre os sensores e os mísseis ar-mar Exocet;
e) os jatos teriam a base de dados (“biblioteca de ameaças”) do sistema alerta-radar INDRA ALR-300 vazia (!), já que esse sistema é igualmente controlado pela Otan (a Espanha prometeu fornecer um software semelhante, que não inspirou confiança aos argentinos);
f) os F-1M espanhóis destinados aos argentinos não poderiam ser equipados com os lançadores de chaff e bengalas despistadoras (de mísseis) AN/ALE-40, porque esse sistema, inicialmente produzido pela empresa americana Tracor, é, desde 1999, produzido pelo grupo britânico BAE System, e,
g) o antiquado sistema Barax Mod. 31, de interferência em emissões de radar do inimigo, não teria muita utilidade para os argentinos, já que havia sido modificado para atender os objetivos da Força Aérea Espanhola.

Em contraposição a todas essas limitações, o Kfir Block 60 deverá chegar aos seus clientes – Argentina inclusive – dotado de um moderno radar AESA EL/M-2052, que permite detecção ar-ar e ar-superfície a grande distância e com baixos níveis de emissão (indiscreção que favorece a plotagem pelo inimigo). O sistema de alerta-radar da marca Elisra permite a identificação de um alvo a distâncias maiores que 150 km.

O sistema de conexão e gerenciamento de dados do caça Kfir Block 60 não opera como um simples terminal de recepção ou emissão de informação criptografada. Ele funciona como um sistema de intranet, convertendo o Kfir no centro de uma verdadeira rede, da qual fazem parte centros de comando, radares de vigilancia, unidades navais, aeronaves de vigilância e de alerta aéreo antecipado.

Esse conjunto de sensores faz do Kfir modernizado uma aeronave de vigilância por excelência. Tudo o que os ingleses não gostariam de ter que enfrentar no Atlântico Sul.

 

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