Projeto polêmico: fotógrafo de Newtown registra crianças com fuzil AR-15

Yuliana tem cinco anos e cabelos escuros que caem sobre seus ombros. Seus olhos miram fixamente, inquisidores, enquanto apoia as mãos sobre o cano de um AR-15, um fuzil de ataque similar ao empregado há um ano por Adam Lanza no massacre de Newtown.

Essa imagem é uma das 20 que compõem a exposição Farewell to Arms, que o fotógrafo Greg Cohen apresenta nesta quinta-feira na galeria The Perfect Exposure de Los Angeles, uma coleção incômoda de ver, criada para movimentar consciências e instigar o debate nacional sobre o acesso às armas de fogo.

Cohen, 43 anos, nasceu e foi criado em Newtown, em Connecticut, onde em 14 de dezembro de 2012 aconteceu o segundo tiroteio mais fatal dos Estados Unidos, na escola Sandy Hook, tirando a vida de 20 crianças e seis adultos.

A tragédia comoveu o país e marcou os habitantes da cidade, que revive a tragédia em seu aniversário de um ano. Cohen, que viajou até lá após o incidente, ainda sente um nó na garganta quando lembra daquele dia.

"É um assunto muito sensível. As pessoas ainda estão com lágrimas nos olhos", disse à Agência Efe o fotógrafo que, movido pela emoção, embarcou no controvertido projeto de armar um grupo de crianças com pistolas e fuzis de plástico para reivindicar medidas que impeçam o acesso fácil às armas.

Seu primeiro passo foi publicar seus planos através de um blog onde encontrou a compreensão de muitos pais dispostos a deixar que seus filhos fossem os portadores de uma mensagem visual dessas que valem mais do que mil palavras.

As fotografias foram tiradas em Los Angeles, cidade onde mora, não sem antes conversar com os pais e tentar se conectar com seus pequenos modelos, consciente da delicadeza do assunto.

"Discutir isto é complicado, sofri durante todo o processo", reconhece Cohen, que deixou claro que as crianças "tristemente já sabiam o que eram as armas" embora durante as sessões tenha evitado que brincassem com elas.

"Só as dava quando estavam prontas (para fotografar)", explicou, e pedia as crianças que pensassem que estavam sustentando um pedaço de pau ou um travesseiro e que, para conseguir uma expressão de contrariedade, "propunha que imaginassem situações em que tinham se sentido rejeitados".

O magnetismo dessas fotografias reside, comentou Cohen, em serem crianças que parecem tão próximas do espectador e que posam, de forma proposital com um fuzil, para incomodar muitos em uma sociedade bastante insensível diante de imagens de menores armados em um ambiente bélico emocionalmente distante.

No total contou com crianças 3 e 10 anos e de diferentes origens étnicas, desde hispânicos a asiáticos, passando por afro-americanos e caucasianos.

Cohen explicou que recebeu apoio de alguns de seus concidadãos de Newtown e que a organização contra a violência das armas Newtown Action Alliance se interessou por seu trabalho, embora de forma extraoficial.

De fato, nenhuma instituição deu um passo à frente e assumiu projeto por ser potencialmente muito polêmico.

"Acho que estão esperando ver como reagem as pessoas", explicou o autor especializado em retratos e reportagens que lhe levaram até o Camboja para tirar fotos de órfãos, apesar dessa nova exposição ganhar em ousadia.

Cohen reconheceu que escolher fazer a estreia em Los Angeles e não em Newtown para evitar ferir sensibilidades, mas insiste que o que o move é um ideal e não uma ânsia por protagonismo.

"Pensar que estou explorando Newtown ou me aproveitando de uma tragédia de uma magnitude como esta… não há nenhuma verdade nisso", constatou Cohen, que acredita que assim que passarem as seis semanas de exibição em Los Angeles, outras galerias e museus se interessarão pela mostra.

As imagens serão vendidas por US$ 1.500 cada. Parte da arrecadação será destinada ao financiamento de campanhas pelo controle das armas de fogo nos EUA.

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