Dois pesos e duas medidas

 
KÁTIA ABREU
Senadora do PSD

O processo de desintrusão (retirada de não índios) da gleba Suiá Missú é pleno de ensinamentos de como os discursos ideológicos são utilizados de forma ambivalente, segundo as conveniências políticas. Dois pesos e duas medidas são usados, sem que os atores envolvidos se mostrem minimamente ruborizados.

Quando se trata de uma invasão feita por indígenas, sem nenhum amparo legal e mesmo com decisão contrária da Justiça, as forças policiais não são na maior parte dos casos empregadas.

A decisão judicial fica frequentemente sem efeito nenhum. Imediatamente, comissões de direitos humanos, movimentos sociais, Ouvidoria Agrária Nacional e Funai (Fundação Nacional do Índio), entre outros, são mobilizados para que a lei não se cumpra. Qualquer uso da força é, de pronto, considerado uma violência arbitrária e desmedida.

Quando se trata da desintrusão de uma terra indígena, é outro caso: Há mobilização intensiva de aparatos policiais, com demonstrações explícitas de violência.

A Polícia Federal, a Polícia Rodoviária e a Força Nacional de Segurança agem com truculência, utilizando bombas de gás lacrimogêneo e balas de borracha. Agricultores e suas famílias, incluindo crianças, ficam literalmente aterrorizados.

Imagens da desintrusão mostram pequenos produtores e familiares que, da noite para o dia, foram subtraídos de seus bens e convertidos em novos sem-terra. Abandonados. A desintrusão de terras indígenas é uma verdadeira expropriação, sem nenhuma indenização de terras.

No caso Suiá Missú, pequenos agricultores saíram, levando apenas bens que podiam carregar. Deixaram suas casas sem nenhuma indenização.

Alguns testemunhos desses pequenos agricultores são particularmente elucidativos.

Seu João Evangelista, que tinha casa própria, diz: "Eu não tenho pra onde ir. Não tenho dinheiro e, com essa situação que se formou no Posto da Mata, há um mês não existe trabalho. Portanto, até para comer estamos dependendo de doações. É uma situação injusta e muito triste. É humilhante, para uma pessoa que trabalha e que tem filhos para criar, ser jogado na rua dessa forma".

Muitos agricultores se queixaram do tratamento desumano. Onde, aliás, estavam a Ordem dos Advogados do Brasil, a Ouvidoria Agrária e outras entidades que enchem a boca ao falar de direitos humanos? Agricultores acaso não são humanos?

Ao comentar a ausência da Comissão de Direitos Humanos da OAB, a despeito da recomendação da Justiça Federal para que acompanhasse a desocupação, o presidente da Associação dos Produtores de Suiá Missú, Renato Teodoro, protestou publicamente:

"Estamos estarrecidos e indignados porque o próprio juiz federal recomendou que dois representantes acompanhassem. Aqui não tem ser humano, aqui tem é bicho. Se direitos humanos existissem, agora seria a hora".

Honrar os mortos é uma característica marcante dos humanos, que têm nos cemitérios um lugar de culto e de (re)ligação com a família. Nada mais justo, portanto, que povos indígenas possam visitar cemitérios de antepassados em terras que não são mais suas.

E nada mais injusto do que proibir os expulsos de Suiá Missú de visitar seus mortos. Por que essa regra humanitária não vale para todos os brasileiros?

A partir de agora, o silêncio passará a reinar na antiga fazenda Suiá Missú, convertida na terra indígena Marãiwatsédé. Nada do que lá estiver acontecendo poderá ser apurado de forma isenta.

Se essa desintrusão vai, na verdade, melhorar a vida dos índios, garantindo-lhes atenção aos problemas sociais, de saúde, educação e saneamento, passa a ser uma grande incógnita.

Qualquer cobertura jornalística na tribo será limitada pela Fundação Nacional do Índio, pois terra indígena não pode sequer ser objeto de reportagem sem prévia autorização da Funai. Passa a vigorar, ali, a censura implantada pelos que dizem defender os direitos humanos.

Os mesmos que silenciam diante da agonia dos agricultores convertidos em sem-terra, que amargam a indiferença, amontoados em abrigos improvisados.

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