TFBR – TOA – A Esfinge Amazônica: Problema e Solução

A ESFINGE AMAZÔNICA: PROBLEMA E SOLUÇÃO

 

Maynard Marques de Santa Rosa

Gen Ex R1

A Amazônia tem o formato de imensa concha verde, com a cabeça no Marajó e os olhos em Belém e Macapá, voltados para o Atlântico. Confinada entre os Andes, o Planalto Central Brasileiro e o Maciço Guianense, é um bioma fechado e isolado do restante do Continente. Tem o rio Amazonas como eixo gravitacional e espinha dorsal de uma rede de 20 mil quilômetros de vias navegáveis vitais para a circulação humana. O fator ecológico condiciona a forma de vida da sociedade, mais do que a vontade humana.

A configuração compacta ajudou a preservar a integridade política e dá à Região uma vocação autônoma. O Grão-Pará formou-se independente do Brasil, durante 209 anos, até o colapso do pacto colonial, em 1823. Após a independência, eclodiu a revolta da Cabanagem, entre 1835 e 1840, extravasando o ressentimento nativo contra a tirania e a exploração histórica dos colonizadores. Nesse turbilhão, a soberania nacional só foi salva graças ao patriotismo do líder cabano, Eduardo Angelim. A convulsão consumiu 20% de toda a população e foi sufocada pela força das armas, ao custo de um trauma que ainda sobrevive nos arcanos do inconsciente coletivo.  

O mistério que envolve a Hileia, sua hidrografia singular, floresta exuberante e habitantes exóticos, tem alimentado lendas, mitos e interesses, desde o tempo do descobrimento.  Djalma Batista, primeiro presidente do INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), em sua obra O Complexo da Amazônia, comparou-a a uma esfinge da ciência, pelos desafios que apresenta. Para o observador externo, a Região é um paraíso oculto na imensa floresta. Para quem nela habita, porém, a realidade está mais para o Inferno Verde, de Alberto Rangel, pelo calor insuportável, nuvens de mosquitos e micro-organismos invisíveis, que nutrem o flagelo das moléstias tropicais. Por isso, é mais seguro orquestrar a preservação midiática em Londres, Paris ou Nova York, do que pôr a mão na massa nas barrancas dos igarapés.

A Amazônia brasileira é 15% maior do que a Índia, mas sua população é 77 vezes menor.  São 25 milhões em toda a Amazônia Legal. As cidades abrigam 80% do total. No imenso deserto verde, vivem somente 20%, mas a tendência é de esvaziar-se cada vez mais, em busca de vida melhor. O Dr. Armando Mendes clamava que o vazio demográfico é o maior problema político da Amazônia. É que, sem população, não há presença do Estado. Para o nosso alento patriótico, a taxa de crescimento populacional nativa é quase o dobro da média nacional. Mas, 42% desses brasileiros encontram-se abaixo da linha de pobreza, e o IDH regional é inferior à média nacional, segundo o IBGE.

O risco geopolítico é notório na Calha Norte, que ficou praticamente intocada no ciclo da borracha, devido à baixa competitividade da seringueira local – a “hevea benthamiana” – em relação à “hevea brasiliensis”, responsável pela riqueza dos seringais da calha Sul. O vazio populacional do Norte do Pará é um desafio à Segurança Nacional.

Nos dias atuais, interesses inconfessáveis, patrocinados do exterior, criam pressões de toda a ordem, imperceptíveis ao grande público, mas que vêm impondo ao mapa da Hiléia uma espécie de área de exclusão econômica, que se replica em uma legislação interna cada vez mais restritiva. Há mais de 100 mil ONGs operando na área, sem qualquer controle governamental, muitas delas financiadas por agências internacionais. Com isso, os recursos naturais são sonegados à atividade produtiva e o excesso de legislação sufoca o agronegócio, estimulando a migração rural e a favelização das cidades.

A mestiçagem natural, decantada como avanço civilizatório por Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda, vem sendo repelida pelos “antropólogos da ação”, cuja ideologia artificial rejeita a “integração do índio à comunhão nacional”, um princípio consagrado pela História. Estranhamente, instituiu-se no Brasil o costume de criar reservas indígenas e quilombolas, sob questionáveis argumentos etnológicos, e em geral sem respaldo histórico, gerando problemas até mesmo na Faixa de Fronteira. Os chineses resolveram a questão de soberania sobre as áreas remotas do Tibete e do Sinkiang, por meio de uma política de investimentos maciços em infraestrutura de transportes e migrações em massa de pessoas da etnia han, fazendo suplantar as populações locais tibetana e uigure.     

O território amazônico representa mais da metade do Brasil. É a última fronteira demográfica e biológica do Planeta e a maior província mineral e hídrica da Terra. No entanto, sua contribuição para o PIB nacional não passa de 8%. A matriz econômica regional é subdesenvolvida. A base produtiva ainda se assenta no extrativismo e nos subsídios federais. O comércio intrarregional é incipiente. A Zona Franca de Manaus esgotou-se como modelo de desenvolvimento. O que dela se pretendia, visando a beneficiar toda a Amazônia Ocidental, ficou concentrado na região metropolitana e, a cada ano, cresce a tendência de redução da sua contribuição ao PIB do Amazonas. O balanço fiscal de todos os Estados amazônicos é deficitário, se excluída a parcela das transferências obrigatórias da União. A infraestrutura de transporte, energia e telecomunicações é deficiente e onerosa. O frete de um contêiner de 20 polegadas, que custa 750 dólares de Santos a Shangai (na China), fica por U$ 1.229 entre Manaus e Santos.

Ao longo do tempo, pouco se fez em relação à magnitude dos problemas e o risco cresceu, passando do discurso ambientalista à ameaça de pressão diplomática, econômica e militar, ainda que velada. Infelizmente, há mais de 30 anos, falta um plano efetivo de desenvolvimento regional. O descaso pode ser aferido nas condições da rodovia BR-319, abandonada durante 25 anos pelo governo federal, com a omissão das autoridades do Amazonas e de Rondônia. E a ligação rodoviária do Pará ao Amazonas pela via TRANSAMAZÔNICA permanece no estado original.

A propaganda adversa procura incutir a confusão entre preservação “in natura” e sustentabilidade, e o noticiário confunde propositadamente o desmatamento legal com o ilegal, tudo para criar resistência na opinião pública. Na verdade, o que tem de ser preservado é o equilíbrio ecológico, implícito no conceito de sustentabilidade, o que implica avaliar previamente e compensar o impacto ambiental dos projetos.

O Programa de Integração Nacional das décadas de 1960 e 1970, voltado à implantação da infraestrutura econômica regional, ficou inacabado, devido à crise do petróleo. A Calha Norte precisa ser povoada e integrada ao restante do país. Uma possível solução seria a construção da ponte de Óbidos sobre o rio Amazonas, permitindo a sua integração rodoferroviária e a transformação de Santarém em centro regional.

Se a economia permanece estagnada enquanto cresce a população, cai a renda-per-capita e prolifera a insatisfação social. O risco aumenta na proporção da taxa de crescimento urbano. A favelização das cidades ecoa o esvaziamento rural. A Região precisa de novas opções de desenvolvimento, enquanto é tempo.  Um século e meio após a cabanagem, ainda persistem os males da ignorância e da falta de civismo e espírito comunitário, sobretudo no interior. O ensino superior permanece defasado em relação ao restante do país. Falta capital humano. A geração atual tem um viés resignado, fruto da miscigenação, que diluiu os traços guerreiros e anarquistas dos cabanos nas torrentes migratórias do ciclo da borracha, mas a conscientização se faz lentamente. 

Uma alternativa para o desenvolvimento seria a viabilização do mercado interno regional. Para isso, realizar investimentos maciços em infraestrutura de transporte e energia. Em complemento, o renomado agrônomo Kingo Oyama sugere que uma política agrícola é mais importante para a solução dos problemas ambientais do que a própria política ambiental: “A domesticação das espécies amplia a oferta de produtos nativos, barateando o preço. Podem-se plantar fruteiras nativas em grande escala, pois existe mercado potencial para esses produtos. E há condições de se fazer uma revolução na produção de pescado”.

Portanto, a necessidade fundamental da Amazônia é de progresso, isto é, de desenvolvimento econômico e social. É imperioso que se façam investimentos e se removam as amarras artificiais de uma legislação restritiva, para permitir o aproveitamento do imenso potencial regional pelo empreendedorismo privado, única forma capaz de induzir o crescimento autossustentável e tornar a economia autônoma

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