GM – Investimentos migram para e Indonésia e pode fechar fábricas no Brasil

 

Matéria publicada no DCI, SP, 08 JAN 13.

Júlio Ottoboni


Dificilmente a direção mundial da General Motors aplicará os R$ 2,5 bilhões na fábrica de São José dos Campos ou mesmo no Brasil. O que levaria ao encerramento das atividades no Vale do Paraíba. Essa é a constatação de especialistas e quadros qualificados da multinacional escutados pelo DCI. Os motivos agora vão além do Sindicato dos Metalúrgicos. Eles abrangem a nova conjuntura econômica brasileira e exigências tecnológicas para os veículos nacionais. A decisão, segundo a presidência brasileira da companhia, ficou para 2014 e um certo desânimo já é demonstrado em relação a esse projeto.

A atenção da GM mundial para os rumos econômicos está aguçada, desde que viu a marca praticamente ser varrida do mapa europeu pela crise econômica. No ano passado, o Brasil passou a disputar os grandes investimentos a serem anunciados pela matriz , mesmo sendo um passageiro de última hora. No momento, outros dois países e de continentes distintos, que ainda não foram divulgados, também estão no páreo.

A postergação do anúncio pela GM mundial foi para atender um pedido da GM brasileira. Desde então, isso já ocorreu por quatro vezes, todas em 2013. Alguns arriscam que até março saia o novo rol de investimentos a serem divulgados e suas localidades, como a própria empresa já admitiu. Entretanto, em meio aos concorrentes se encontra a Indonésia, o novo foco da multinacional norte-americana.

A conta do fechamento da maior unidade fabril em território brasileiro, que estava para ser paga apenas pelas dificuldades da relação com o Sindicato dos Metalúrgicos de São José somadas ao alto custo da mão de obra e por fábricas ultrapassadas para abrigar novos projetos, será dividida. Entram agora na divisão do prejuízo a política de aumento do IPI anunciado pelo governo federal, o grave endividamento da classe média emergente, a volta da inflação e as exigências por lei de equipamentos de segurança em veículos compactos.

Recentemente, o presidente da GM América do Sul, Jaime Ardila, deu indícios que a situação estava drasticamente alterada. “ Os investimentos não foram anunciados porque estamos analisando a viabilidade financeira e, sobretudo, o comportamento do consumidor”. Para Ardila,  cada vez fica mais difícil identificar qual é a resposta do mercado nacional. E ele se explica. “ São dois os motivos, as mudanças no hábito dos consumidores e a regulação do governo para itens de segurança e conforto.”

O risco Brasil está cada vez mais claro para a direção da GM. Com a volta da inflação, ações populistas dentro da economia, um consumidor absorto em meio a tantas opções e o encarecimento do veículo por exigência de lei, como freios ABS e sistema de airbags dificilmente a empresa conseguiria colocar um carro popular e com alto poder competitivo, ainda mais enfrentando a chegada os carros indianos e chineses no país.

A decisão final da General Motors pelo problemático polo de São José dos Campos passará pela direção mundial da companhia, que já não tem o Brasil como um mercado redentor para a retração europeia. A indicação é do presidente da montadora no País, Santiago Chamorro, que aguarda a análise de seus superiores e eventuais vantagens que o governo federal possa apresentar nos próximos meses. “ O primeiro trimestre de 2014 nos parece a data mais indicada para este anúncio", declarou logo que assumiu o comando geral, em agosto último.

Cuidados

O cuidado de Chamorro é visto também como uma ponta de decepção pelas partes envolvidas no processo de atração deste investimento, tanto trabalhadores, como prefeitura e governo de São Paulo. Tanto ele como o diretor de relações institucionais, Luiz Moan, sabem que esses R$ 2,5 bilhões são cruciais para abrir novas perspectivas de mercado e enfrentar a chegada de novos concorrentes em condições de igualdade. “ Esse novo modelo de veículo para a GM do Brasil é tido como fundamental e sendo muito sincero, esse investimento é vital para o complexo de São José dos Campos”, observou Moan.

A  montadora ainda estuda muitas alternativas dentro do projeto, entre elas como se adequar às regras do Inovar-Auto, características do modelo a ser produzido ou volume de fabricação e agora a subida progressiva do IPI, que tinha aliviado o peso da carga tributária sobre o produto. Em meio a essas questões a serem equacionadas está o custo do veículo tanto para a produção como ao consumidor final. O carro que a princípio seria um compacto econômico terá um incremento considerável em seu preço final.

Para o executivo, a previsão inicial para o anúncio, primeiro em maio, depois em junho e chegando até julho foi um erro.  "Talvez tenha sido um pouco otimista demais", revelou. Além do novo prazo, Chamorro não garante sequer que o investimento GM já esteja certo em São José dos Campos e nem mesmo no Brasil, como se chegou a ser divulgado em diversas esferas, inclusive do governo federal e municipal. "Até concluirmos todos os cálculos e planejamentos tudo pode acontecer".

Vantagens e desvantagens

Os diretores da GM do Brasil podem não admitir, mas a montadora brasileira entrou tarde na disputa com seus concorrentes diretos e numa busca desesperada para conquistar diferenciais que sensibilizassem a matriz. Os investimentos já estavam encaminhados para a Indonésia, potencializados pela crise na joint venture criada pela GM com a governo da China. A ideia já amadurecida era fechar a fábrica do Vale do Paraíba, porém com a desvantagem de perder um dos locais mais vantajosos para o abastecimento dos mercados interno e externo.

Contudo, a política de apoio à indústria automobilística de Dilma Rousseff somado a incentivos vindos do governo paulista e da prefeitura local poderiam alterar o quadro. Então valeria insistir uma última vez. Apesar do vice presidente executivo da GM mundial de operações internacionais , Timothy E. Lee já ter confirmado o acordo de cooperação com a  Peugeot para atuarem em parceria nos mercados da Rússia e na América do Sul.
 

Uma relação bem delicada com o Sindicato

A conturbada relação entre a GM e o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos levou a companhia a desviar da unidade do Vale do Paraíba seus principais projetos, apesar de ser sua maior e mais estratégica entre seus núcleos fabris. A situação não vinha a contento desde os anos 90, com o fechamento da fábrica do GMC e a mudança de linhas de produção para São Caetano do Sul, Argentina e Gravataí.

Em 2008, o então presidente da GMB, Pinheiro Neto, conseguiu mobilizar a sociedade local e os governos quando revelou sua intenção de encerrar as atividades no Vale do Paraíba, depositando o ônus da decisão na relação com os sindicalistas, o alto custo da mão de obra e a obsolescência da fábrica. Daí para cá a unidade entrou em franca decadência ao se ver fora dos planos de ampliação e melhorias para atender novas demandas do mercado. O acordo não saiu, mesmo com o sindicato sob forte pressão popular.

A ideia de extinguir a fábrica de São José ficava cada vez mais evidente. A direção da GMB anunciou em meados de agosto fim da produção do Classic  e da linha MVA. Com isso foi quebrado o tratado assinado em janeiro com o sindicato, que previa operação da linha até dezembro. Após protestos e ameaças de levar o caso à justiça, a GM voltou atrás  e manteve a fabricação do sedã pequeno ali até o fim do ano.  Luiz Moan disse que o acordo já previa o corte de 1.053 vagas. Este foi o total de funcionários desligados entre janeiro e dezembro de 2013.


Comportamento instável

Outro  motivo, muito mais recente, é a  mudança no perfil de compra do consumidor brasileiro apontado pelas pesquisas da montadora. Outra desvantagem para se manter a unidade de São José aberta, mesmo com o acordo sindical fechado. Agora surgiu esse novo obstáculo.  O comprador brasileiro está longe de acompanhar as tendências da multinacional.

 O maior exemplo vem dos 11 lançamentos feitos nos últimos 20 meses, todos apresentaram uma grande participação das versões mais equipadas no mix de vendas. Já no Brasil, isso nunca aconteceu e nem dá sinais de acompanhar os passos dos consumidores estrangeiros, que procuram por carros com maior nível de conectividade a bordo. Ou seja, o dispositivo MyLink – um dos diferenciais da GM – é presença garantida na maioria dos produtos da Chevrolet, menos em solo nacional.

Devida essa mudança de perfil, a GM teve que alterar o cronograma dos projetos  futuros para definir que produto apresentará ao mercado nacional. O recente projeto Jade, o novo carro que poderia ser produzido na fabrica do eixo Rio-São Paulo a partir de 2017, se tornou uma incógnita. E definitivamente a multinacional não cogita investimentos com qualquer margem de risco. Se a economia brasileira começa a patinar, a melhor solução será a distância.

Para a montadora americana já basta o trauma causado na Europa. No início de dezembro a multinacional anunciou sua decisão de retirar a marca Chevrolet dos mercados da Europa ocidental e do leste a partir de 2016. O motivo foi as difíceis condições do mercado no continente. Há anos a GM tem dificuldades para aferir lucro nesta região  e priorizará as marcas Opel e Vauxhall. A decisão implicará em custos na faixa de US$ 700 milhões até US$ 1 bilhão, isso num período entre os três últimos meses de 2013 e o primeiro semestre de 2014.

Rival invencível

Se a GM já se encantou com a China, agora é a vez da Indonésia ser reverenciada como uma fonte de prosperidade.  Antes, os principais executivos da empresa norte americana haviam indicado que usaria a joint venture chinesa SAIC como parceira preferencial para expandir em mercados emergentes em todo o mundo. Após um período de conflitos, as pesquisas apontaram um potencial imenso na vizinhança.

O enorme potencial de mercado da Indonésia , com uma população de mais de 240 milhões de pessoas, provavelmente vai ser tornar um dos maiores consumidores mundiais em curto prazo. As vendas de automóveis romperam a barreira de 1 milhão de unidades pela primeira vez em 2012. E a previsão é de um crescimento estável. Em maio de 2013, a fábrica da GM em Bekasi foi remodelada e reaberta com a presença de todo estafe da alta direção da multinacional. Esse é o portão para o ingresso em todo mercado asiático.

“A General Motors está de volta à Indonésia e preparando o terreno para a sua marca Chevrolet para lutar por uma fatia maior do que é esperado para ser um dos mercados de veículos novos mais lucrativos em todo o mundo”, afirmou o presidente da GM Indonésia, Marcos Purty, no dia da reinauguração. A confiança é tamanha que novos investimentos estão sendo priorizados para o lugar.

" Para a marca continuar a crescer ao ritmo que está crescendo , temos que aumentar a capacidade de produção ", reforçou o vice presidente mundial da marca, Timothy E. Lee. A GM está apostando em veículos versáteis, veículos esportivos utilitários e carros compactos para diminuir a distância entre ela e as rivais japonesas, disse em setembro último o novo presidente de operações da empresa na Indonésia, Michael Dunne. "O aspecto mais animador sobre a Indonésia é que me lembra da China há cerca de doze anos, no começo dos anos 2000", disse poucos dias antes de começar as demissões na fábrica brasileira.

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