Contrariado, chefe do Inpe deixará o cargo em dezembr


 

O diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Gilberto Câmara, deixa o cargo em dezembro, dois anos antes do fim de seu mandato. A saída já foi comunicada ao ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aloizio Mercadante.

Oficialmente, Câmara diz estar "cansado" após seis anos no cargo e "frustrado" porque não conseguiu renovar os quadros do instituto, que não tem realizado contratações e cujos pesquisadores têm em média a mesma idade do Inpe -50 anos. A Folha apurou, no entanto, que a saída de Câmara se deve a divergências com a condução do programa espacial brasileiro e a um rompimento com o presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Marco Antônio Raupp.

Parceria indesejada – Um ponto que teria desagradado ao diretor foi a decisão da AEB e de Mercadante de manter o programa de foguetes que o Brasil desenvolve com a Ucrânia por meio da empresa binacional ACS (Alcântara Cyclone Space). O programa consiste em reformar a base de Alcântara, no Maranhão, para explorar o mercado de lançamentos comerciais de satélites usando o foguete ucraniano Cyclone-4. A ACS tem custo de cerca de R$ 1 bilhão, mais do que o triplo do orçamento anual do programa espacial.

Câmara tem sido um dos principais críticos do projeto Brasil-Ucrânia, que compete por recursos com o programa de satélites desenvolvido pelo Inpe. Estima-se que o Brasil ainda precise colocar R$ 600 milhões na parceria. Quando assumiu o ministério, Mercadante suspendeu os pagamentos feitos à ACS. Tanto o ministro quanto Raupp afirmaram que só investiriam no programa se a Ucrânia pagasse sua contrapartida, de R$ 180 milhões.

O anúncio irritou o PSB, partido aliado do governo, cujo vice-presidente, Roberto Amaral, arquitetou o acordo com a Ucrânia e dirigiu a ACS até ser demitido por Mercadante e Dilma neste ano. No mês passado, no entanto, uma missão da agência espacial liderada por Raupp visitou a Ucrânia e concluiu que o projeto do Cyclone-4 está "de 60% a 70% pronto", segundo o presidente da AEB.

Obteve também a promessa dos ucranianos de injeção de dinheiro na ACS até setembro. Isso permitiria a continuidade da parceria. Outro fator que pôs Câmara em colisão com Raupp foi a proposta de fusão do Inpe com a AEB, que ainda está em estudo pelo ministério. Entusiasta da proposta no início, Câmara passou a se opor a ela, temendo perder espaço.

Diretor é 'pai' de sistema que vigia desmate – Cearense radicado em São Paulo, engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e com doutorado em computação pelo próprio Inpe, Gilberto Câmara, 55, é um dos pais do programa Deter, que detecta o desmatamento na Amazônia em tempo real e facilita ações de fiscalização.

Ele é também o segundo diretor que sai do instituto após choques com a Agência Espacial Brasileira. Seu antecessor, Luiz Carlos Miranda, pediu demissão quando a agência passou a concentrar todo o orçamento do programa espacial, em 2005. Câmara, filiado ao PT, foi escolhido por um comitê de busca e confirmado por Eduardo Campos (PSB).

Sua gestão foi marcada por polêmicas. Decidiu concentrar os esforços do instituto na área ambiental e em satélites de observação da Terra, como o Cbers (em parceria com a China), que ajuda a monitorar o desmatamento. Isso firmou o Brasil como referência em monitoramento de desmate, com distribuição gratuita de imagens e instalação de estações receptoras dos dados obtidos pelo Cbers na África.

Mas, ao mesmo tempo, o monitoramento desidratou a área de astronomia do Inpe. Em 2008, juntamente com Marina Silva, Câmara comprou uma briga pública com o então governador de Mato Grosso, Blairo Maggi. Naquele ano, dados do Deter mostravam uma explosão no desmatamento na região.

Maggi negou o aumento do desmatamento e levou a queixa ao presidente Lula, que mandou o Inpe checar novamente os dados. "O dado foi checado, rechecado e 'trechecado'", rebateu Câmara à época. O ministro Aloizio Mercadante declarou que o diretor continuará colaborando com o ministério. Marco Antonio Raupp estava em trânsito entre o Brasil e a China, onde tem reuniões do programa Cbers – juntamente com Câmara.

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