Sergio Duarte – Um Drone Nuclear Submarino

UM DRONE NUCLEAR SUBMARINO

SERGIO DUARTE

Presidente das Conferências Pugwash

sobre Ciência e Assuntos Mundiais.

 

NOTA: (Este artigo é uma condensação e adaptação de texto preparado pelo físico e pesquisador  Alessandro Pascolini, da Universidade de Pádua, Itália, e do noticiário internacional ).

 

Uma nova arma entrará nesta semana em operações experimentais de navegação em alto mar: o submarino russo Belogorod K-139. Com 184 metros de comprimento, o novo submersível é o mais longo do mundo e estará armado com quatro torpedos autônomos Poseidon de grandes dimensões, cada qual dispondo de propulsão nuclear própria e dotado de uma ogiva atômica de alta potência. Os torpedos são capazes de executar manobras evasivas para evitar os sistemas defensivos adversários.

Encontra-se já em construção um segundo submarino, Khabarovsk, que transportará seis torpedos. Segundo observadores ocidentais, o projeto completo, adiantado pelo presidente Putin em 2015 durante uma reunião com os chefes militares no balneário de Sochi, prevê o lançamento até o fim da década de quatro desses submarinos armados com torpedos Poseidon, dois para a frota dos mares do norte e dois para a do Pacífico, com um total de 32 ogivas.

Putin justificou a nova arma como uma resposta destinada a recompor o equilíbrio estratégico diante da decisão americana de levar adiante o sistema de defesa antimísseis, ao retirar-se do tratado ABM, levando em conta também os avanços tecnológicos dos Estados Unidos no campo dos mísseis balísticos intercontinentais. O sistema Poseidon se juntaria, assim, a outras armas nucleares estratégicas recentemente desenvolvidas na Rússia, como os foguetes hipersônicos Avangard, Kinzhai e Tsirkon e o míssil Sarmat.  (Nota DefesaNet – ver link abaixo)

  

Fig. 1 – O projeto tal como apresentado em Sochi.

Fig. 2 – Esquema estrutural do Poseidon

 

O Poseidon tem comprimento total de 24 m e diâmetro de 1.5 m. As informações disponíveis revelam que o torpedo, de fato um drone submarino, é capaz de navegar submerso durante aproximadamente 10 mil km a uma velocidade máxima de 100 nós por hora (165km/h). Os primeiros testes teriam sido levados a cabo com êxito em uma zona “protegida dos serviços de inteligência inimigos”. As provas oceânicas agora iniciadas com o submersível Belogorod visam verificar o comportamento operacional do sistema completo.

Segundo o ministro da Defesa russo, Sergey Shoigu a missão da nova arma é “danificar componentes importantes da economia do adversário na zona costeira, infligindo perdas inaceitáveis e criando áreas de contaminação radioativa inutilizáveis para atividades militares, econômicas ou de outra natureza durante longo período”.

 

Entre as vantagens do Poseidon, ainda de acordo com declarações de autoridades militares russas reproduzidas nos meios oficiais de divulgação, estão a capacidade de movimentar-se autônoma e agilmente a grandes profundidades transportando explosivos nucleares de alta potência, evitar detecção e percorrer distâncias intercontinentais em velocidades muito superiores às alcançadas pelos submarinos e torpedos mais avançados e por quaisquer embarcações de superfície. Além disso, afirmam, são silenciosos, altamente manobráveis e não oferecem praticamente nenhuma vulnerabilidade que possa ser explorada por algum inimigo.

 

Observadores ocidentais advertem que essas características descritas por fontes russas pressupõem um conjunto de tecnologias de ponta em diversos aspectos, propulsão e navegação submarina, automação e sistemas autônomos de comando e controle com o emprego de formas avançadas de inteligência artificial que para muitos a Rússia ainda não possui.  Existem dúvidas sobre dados como a velocidade do Poseidon, que parece superestimada no estágio atual da tecnologia russa de reatores nucleares miniaturizados.

Uma velocidade de 100 nós seria incompatível com sua capacidade furtiva, mesmo a elevadas profundidades, devido à assinatura acústica produzida. Há também questionamentos sobre as dimensões e o real poderio explosivo da ogiva nuclear do torpedo em relação ao espaço útil do compartimento que o abriga a bordo do submarino, pois declarações russas parecem atribuir diferentes potências (entre 2 e 100 megatons)  à carga nuclear do Poseidon.

 

As menções à contaminação radioativa sugerem que o Poseidon possa ser dotado de uma bomba nuclear “suja”, funcionando como uma arma radiológica capaz de tornar inabitáveis vastos territórios litorâneos por meio de uma espécie de tsunami radioativo que inviabilizaria o uso militar e a atividade humana no litoral durante décadas.

 

Além da sua importância estratégica, os mares setentrionais da Rússia terão em breve uma nova significação comercial com o crescente derretimento dos gelos, facilitando a navegação. A rota ártica permitiria em breve reduzir pela metade o tempo de viagem marítima entre a Ásia e Atlântico Norte em relação à rota pelo canal de Suez. A nova arma possibilitaria, assim, o controle desse corredor de transporte pela Rússia, além da ocupação e defesa das terras que emergiriam em consequência do degelo.   

 

Analistas ocidentais não parecem considerar o Poseidon um progresso decisivo da capacidade nuclear russa, por não acrescentar a possibilidade de missões estratégicas que o atual arsenal russo não esteja em condições de levar a cabo. O novo submarino e seu veículo autônomo, no entanto, aumentam a flexibilidade nuclear e global do armamento de que Moscou já dispõe e poderiam permitir ataques coordenados às principais bases americanas no Atlântico, em Norfolk, e no Pacífico, em San Diego.

De qualquer forma, o anúncio dos ensaios oceânicos do Belogorod mostra o continuado empenho da Rússia em desenvolver suas forças atômicas como elemento crucial de sua política de defesa e de busca de inovações no campo militar, com o objetivo de diversificar sua postura estratégica.

 

 A erosão dos acordos bilaterais de controle de armamentos entre a Rússia e os Estados Unidos e o crescente déficit de credibilidade dos tratados multilaterais de não proliferação, além da incessante busca de vantagens tecnológicas capazes de assegurar supremacia militar, fazem prever uma aceleração da corrida armamentista nuclear em que já se encontram empenhadas as principais potências, em detrimento da segurança de toda a humanidade.

Nota DefesaNet

A transcrição em duas partes, em inglês, do discurso do Presidente Vladimir Putin quando anunciou novas armas, em 01 Março 2018

Vladimir PUTIN – Presidential Address to the Federal Assembly Defense Part I

Vladimir PUTIN – Presidential Address to the Federal Assembly Defense Part II

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