TFBR – Prioridade do Brasil é combate ao Desmatamento: Soberania, Clima e Defesa

Prioridade do Brasil é combate ao Desmatamento:

Soberania, Clima e Defesa

 

 

Raul Jungmann

Deputado Federal, ex-ministro da Defesa e membro fundador do Centro Soberania e Desenvolvimento Sustentável

Marcelo Furtado

Ambientalista e membro fundado do Centro Soberania e Desenvolvimento Sustentável

Jornal Valor

01 Março 2021

Em 27 de janeiro o presidente Joe Biden apresentou sua ordem executiva para o enfrentamento da crise climática nos EUA e no exterior. O documento é denso e extenso, são mais de 7.500 palavras distribuídas em 27 páginas.

Mas qual a novidade?

O texto está dividido em três partes. A primeira já traz uma grande inovação — colocar a crise climática no centro da Política Externa e da Segurança Nacional dos EUA. Que saibamos, nenhum outro pais tem a questão climática no centro de sua política de segurança nacional.

A segunda parte trata de uma “abordagem de governo frente à crise climática". Aqui vem a intenção de garantir urna política climática única, coordenada pela Presidência e não um conjunto de ações distribuídas aos ministérios. Este é um problema bastante conhecido no Brasil, onde por vezes falta alinhamento entre as iniciativas climáticas nos distintos ministérios e em outros casos existe um claro conflito.

Por fim, uma breve terceira parte com as disposições gerais reforçando que todas as ações propostas respeitarão as regras de jogo, ou seja, as leis, orçamento e poderes constituídos.

Muito foi comentado sobre essas iniciativas. Os EUA priorizarão a questão climática nos encontros do G-7, G-20, e muitos outros, O presidente Biden organizará um encontro específico com chefes de Estado para discutir a necessária convergência de esforços para lidar com a emergência climática. Os EUA apresentarão seu plano nacional voluntário de redução de emissões (NDC), e investirão na neutralização de sua economia até 2050. Eles também estimularão investimentos em programas de recuperação da economia verde.

O governo federal dos EUA utilizará seu poder de compra e influência para promover energias limpas, empregos de qualidade, veículo eficientes, infraestrutura sustentável e outros. Foco especial será dado a agricultura, conservação e restauração.

Mas talvez a maior das novidades seja alçar o enfrentamento da crise climática ao nível da Defesa e Segurança Nacional como prioridade. A emergência climática demanda ações urgentes e ambiciosas na redução das emissões dos gases de efeito estufa. Também expõe a grande vulnerabilidade de nossas cidades, florestas e mares. Pressiona a sociedade a enfrentar a necessidade de rápida adaptação, ao mesmo tempo em que procuramos corrigir e enfrentar nossa profunda desigualdade, seja no contexto económico, social, tecnológico ou político. Portanto, proteção, planejamento, preparação, desenvolvimento de cenários e formulação de planos de contingência para eventuais crises são fundamentais.

O termo defesa aparece, não uma ou duas, mas, oito vezes neste plano, sendo o Departamento da Defesa responsável pelas seguintes ações especificas:

1. Identificar as implicações que as mudanças climáticas apresentam à segurança nacional, incorporando a modelagem de risco climático. incluindo a infraestrutura das embaixadas e bases militares (sessão 103 item a e item c). 0s mapas de risco podem não apenas contribuir na inteligência para ações emergenciais, mas fundamentalmente no planejamento para garantir a segurança da sociedade, prevenção de risco aos eventos climáticos extremos e desenho de programas económicos inclusivos e resilientes.

2. O Departamento de Defesa e o Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas deverão incorporar a questão na Política Nacional de Defesa, no planejamento e execução do orçamento das Forças Armadas, também nos planos e projetos estratégicos militares. (sessão 103 item 1d).

 

3. Participação do Departamento de Defesa na Força Tarefa Nacional sobre o Clima, Esta força tarefa é liderada peio ex-Secretário e oficial da reserva na Marinha John Kerrv "US Climate Envoy", que ficará responsável por toda a coordenação das ações de enfrentamento das mudanças climáticas no pais (sessão 203 item a), diretamente subordinado ao gabinete executivo do presidente. A liderança no mais alto nível do pais é fundamental para garantir boa coordenação, foco e priorização do tema.

 

4. O Departamento de Defesa deverá apoiar a expansão das energias renováveis com o objetivo de duplicar até 2030 a produção de energia eólica em terra e no mar (sessão 207). Aqui integrando o papei da defesa na organização do uso da terra, assim como o uso das áreas marítimas.

5. O Departamento fará parte do Conselho Interministerial de Justiça Climática. A missão deste Conselho será desenvolver políticas, programas e atividades para solucionar os desproporcionais efeitos adversos que afetam as comunidades más vulneráveis em relação a saúde, meio ambiente, assim como os impactos negativos, econômicos e climáticos.(sessão 220 item b). Este ponto traz outra grande novidade, o papel da defesa no combate às desigualdades. Afinal, são a comunidades mais pobres, com menos recursos e menos atendidas pelas políticas. Públicas, que sofrem os maiores impactos da crise climática em vidas e perda de infraestrutura.

Olhando para este piano é inevitável refletir como a defesa do Brasil prioriza a questão climática e ambiental. Assim corno nos EUA a prioridade está no setor energético, a nossa está no combate ao desmatamento e na busca do uso da terra com urna produção agrícola de baixo carbono. Porém, é fato que não estamos partindo do zero, dado que a questão climática está entre as preocupações da Política e da Estratégia Nacional de Defesa de 2220/2024, Preocupações que, no nosso entender, necessitam ser ampliadas, atualizadas e mais abrangentes.

Esse debate cabe agora ao Congresso Nacional, onde tramitam as referidas Política e Estratégia, com o diálogo e participação dos militares e da sociedade, É importante destacar que a proposta de enfrentamento da crise climática dos EUA se alinha com o "Green New Deal da União Europeia e a conversão da economia da China em carbono neutro.

Esse alinhamento global aponta para oportunidades que a sociedade brasileira, em diálogo com os militares e através do nosso parlamento, desenvolva uma 'visão contemporânea para a Defesa, Clima e o Desenvolvimento Sustentável do Brasil

Esta inclusive será a primeira atividade de nosso recém criado -Centro Soberania, Clima e Desenvolvimento Sustentável, que conta com a participação de militares, ambientalistas, acadêmicos e empresários. Pretendemos promover este debate, amplo e diverso, para não apenas construir pontes de convergências, mas visando encontrar soluções para um tema critico: como articular a intransigente defesa da soberania e da integridade nacional e o enfrentamento da crise climática global — visando a sobrevivência dos brasileiros, pela humanidade no nosso planeta.

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