Relatório Otálvora: Petro alerta para confronto com os EUA e aliança com Maduro


 
 

EDGAR C. OTÁLVORA
Diario Las Américas
15 de agosto de 2022  
@ecotalvora

 
Na próxima semana chegará a Caracas uma delegação do governo colombiano encarregada de iniciar os arranjos logísticos para a reabertura de sua Embaixada. A delegação será composta por pessoal diplomático de alto e médio escalão. A chancelaria colombiana recebeu ordens do chanceler Álvaro Leyva em 11AGO2022 para acelerar as etapas operacionais com vistas ao reinício das atividades diplomáticas e consulares na capital venezuelana.

O restabelecimento das relações entre o novo governo de Gustavo Petro e a ditadura chavista, rompidas desde 13FEV2019, quando Nicolás Maduro expulsou o corpo diplomático colombiano, é iminente. O Grupo Puebla, especialmente o colombiano Ernesto Samper Pizano, estaria servindo de ponte entre seus amigos Maduro e Petro, que decidiram acelerar o processo de "normalização" das relações diplomáticas. Em 11AGO2022, Maduro e Petro anunciaram os nomes que teriam submetido à consideração, um do outro, para servir como embaixadores em Caracas e Bogotá.

O regime chavista nomeou Félix Plasencia, diplomata de carreira, registro dos irmãos Jorge e Delsy Rodríguez no Ministério das Relações Exteriores da Venezuela e que após apenas nove meses no cargo foi afastado por Maduro de seu cargo de chanceler. Após ser destituído do cargo de ministro, Plasencia foi nomeado co-agente perante a Corte Internacional de Justiça no processo que a Guiana mantém contra a Venezuela pelo território de Essequibo.

Petro envia para Caracas Armando Benedetti, um ex-parlamentar que percorreu nas últimas duas décadas várias correntes políticas, incluindo o Uribismo, até desembarcar nas proximidades do agora presidente da Colômbia. Benedetti era uma das figuras centrais no comando da campanha de Petro e uma figura alta no governo era tida como certa. Seu embarque para Caracas parecia um “exílio de ouro”.
 

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Uma reunião entre Maduro e Petro ainda não foi acertada, mas o regime chavista vem pressionando o novo governo colombiano a especificar uma data. Petro é a favor de aguardar a reabertura das embaixadas e a negociação de algumas questões comerciais para celebrar, por exemplo, um encontro fronteiriço com Maduro. Ambos, caso o ditador venezuelano ousasse viajar para os EUA, se reuniriam de 20-21SET2022 no prédio da ONU em Nova York. Os dois aparecem inscritos na lista de intervenções dos dirigentes perante a Assembleia Geral. Petro faria seu discurso na primeira sessão logo após Jair Bolsonaro e Joe Biden. Maduro está inscrito para a sessão do dia seguinte.
 
Enquanto Maduro está especialmente com pressa para assinar um pacto político com Petro que, entre outros aspectos, lhe permitirá assumir o controle da empresa petroquímica Monomeros, o colombiano divulga que a "normalização" com o regime chavista permitiria aumentos nas exportações colombianas e , de acordo com anunciou em 12AUG22 sua Ministra de Minas e Energia Irene Vélez, para começar a importar um gás hipotético da Venezuela.
 

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O advogado coordenador da defesa jurídica internacional de Alex Saab, operador financeiro de Maduro preso nos EUA, foi um dos convidados especiais da cerimônia de posse presidencial de Gustavo Petro em 22/07. O advogado e juiz espanhol destituído Baltazar Garzón, que chegou à Plaza de Bolívar acompanhado de sua sócia Dolores Delgado, é o representante legal do regime chavista na Espanha. Por sua vez, Garzón dirige o autodenominado "Conselho Latino-Americano de Justiça", uma instância criada pelo Grupo Puebla para apoiar a mídia em casos jurídicos que afetam seus membros.
 
Garzón foi apenas uma das “personalidades VIP” da esquerda global, fundadores ou associados do Grupo Puebla, que foram convocados para coincidir em Bogotá não apenas para participar dos eventos de inauguração (cerimônia de inauguração na Plaza de Bolívar, Casa de Nariño e reuniões com membros do novo governo), mas realizar reuniões de coordenação política.
 
Além dos líderes convidados para o evento, o novo governo colombiano fez convites a um grande grupo de amigos e parceiros políticos internacionais. A lista de convidados VIP do Petro incluiu os ex-presidentes de esquerda Dilma Rousseff, Lula da Silva, Cristina de Kirchner, Evo Morales, Manuel Zelaya e Fernando Lugo, todos ligados ao Grupo Puebla. Morales se desculpou porque os acontecimentos em Bogotá coincidiram com o fim de uma copa de futebol que leva seu nome. Lula está em campanha eleitoral. Zelaya delegou sua representação ao presidente de Honduras e ao secretário da Presidência, que são sua esposa e filho. Kirchner desistiu da viagem ocupada nos julgamentos de corrupção que a seguem em seu país.
 
Alberto Fernández, apesar de seu status de chefe de Estado, participou abertamente de várias atividades do Grupo Puebla, que organizou eventos sociais e reuniões de coordenação. O Grupo Puebla veio à Colômbia para mostrar que um deles era agora o governo da Colômbia. Entre os convidados de Petro estava também o infalível Juan Carlos Monedero, fundador do partido espanhol Podemos, contratante dos governos Castrochavista para questões de reforma política e constitucional e um conselheiro próximo de Petro. Representantes do grupo pró-iraniano Codepink vieram dos EUA, e o presidente do partido governista Morena, Mario Delgado Carrillo, participante regular dos eventos do Grupo Puebla, veio do México.
 
Outro convidado especial foi o argentino Pablo Gentili, operador do Grupo Puebla e que no passado atuou como assessor de Lula da Silva, Dilma Rousseff e foi chefe de gabinete do espanhol Pablo Iglesias. Gentili faz parte da conexão do governo Petro com a rede de esquerda continental e atuou como organizadora e adida da vice-presidente colombiana Francia Márquez em suas visitas à Argentina, Bolívia, Chile e Brasil antes de sua posse. Márquez carece de uma conexão internacional própria e Gentili foi quem a apresentou aos encontros que o agora vice-presidente da Colômbia mantinha com figuras de alto escalão do atual jet-set de esquerda como Lula da Silva, Evo Morales, Luis Arce , Alberto Fernández, Cristina de Kirchner, Adolfo Pérez Esquivel e Chico Buarque.
 

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Aliás, no evento realizado pelo Grupo Puebla no salão do Senado colombiano em 08AGO2022, um evento com evidente conteúdo político-partidário, esteve presente o mexicano Carlos Ruiz Massieu, que atua como "Representante Especial do Secretário Geral da ONU e Chefe da Missão de Verificação na Colômbia. O Secretário-Geral da ONU é particularmente permissivo com a participação de altos funcionários da organização em eventos do Grupo Puebla. Já aconteceu repetidas vezes com a até recentemente secretária da CEPAL, Alicia Bárcenas, também mexicana, que, no exercício de seu cargo na ONU, atuou como membro ativo do Grupo Puebla. Ruiz Massieu acompanhou o então designado Ministro das Relações Exteriores do Petro, Álvaro Leyva, ao seu encontro com funcionários do regime chavista em 28JUL2022 em San Cristóbal, Venezuela, no qual a retomada das negociações entre a Colômbia e a guerrilha aliada de Maduro: a  ELN..
 

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Em 26MAR94, quando Hugo Chávez foi libertado da prisão sem ter sido processado pelo levante militar de dois anos antes, ele não viajou a Cuba para se encontrar com Fidel Castro, como está sendo noticiado agora. Suas primeiras viagens ao exterior foram para Colômbia, Uruguai e Argentina. Nos países do sul, líderes de esquerda e intelectuais que mais tarde se declararam adoradores de Chávez, incluindo o uruguaio Eduardo Galeano, o desprezaram naquele ano e não o receberam. Chávez, em busca de um padrinho internacional, tentou até se relacionar com os carapintadas argentinos e logo depois recebeu o argentino Norberto Ceresole como conselheiro próximo e companheiro de viagem. Foi somente em 13DEZ1994 que a aliança entre Chávez e Fidel Castro foi finalizada.
 
A visita de Chávez à Colômbia foi organizada por um grupo de esquerdistas do já pacificado M19, com quem compartilhou o projeto de associar a figura de Simón Bolívar a movimentos de esquerda. Chávez permaneceu na Colômbia por várias semanas e até seu aniversário foi comemorado em 28JUL1994 por um pequeno grupo de camaradas, entre os quais Gustavo Petro. Antes disso e por vários anos, o M19 manteve relações com o ex-guerrilheiro venezuelano Douglas Bravo, que foi um dos primeiros apoiadores ideológicos de Chávez e com quem os colombianos planejavam uma “revolução bolivariana” no continente.
 

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Narra o “chavólogo” venezuelano-argentino Alberto Garrido, em seu livro “Chávez de uniforme. Antibiografia só para chavólogos”, que “a ideia de criar uma Internacional Bolivariana pertence a Chávez e ele a apresentou a Gustavo Petro em 1994 (…) da Internacional Bolivariana, que decidiram chamar de Congresso Bolivariano Anfictiônico (CAB). A reunião preparatória do Segundo CAB foi realizada nos dias 17 e 18 de dezembro de 1994 em Santa Marta, Colômbia [após a viagem de Chávez a Cuba]. Participaram cerca de vinte venezuelanos, liderados por Chávez, sete colombianos, três panamenhos, o argentino Norberto Ceresole e o cubano responsável pelo Escritório de Assuntos Latino-Americanos Jorge Luis Joa”. Em 2003, quando Chávez já estava no poder, com a participação direta do Foro de São Paulo, transformou o CAB inventado por ele e por Petro em 1994 no "Congresso Bolivariano dos Povos" que seria a principal plataforma para a diplomacia paralela de eixo Havana.- Caracas na década seguinte.
 
Chávez e Petro mantiveram distância publicamente, mas em momentos relevantes o colombiano serviu de interlocutor com o regime venezuelano. Em 07AGO2010 foi a posse presidencial de Juan Manuel Santos Calderón e Nicolás Maduro chegou a Bogotá em nome de Chávez, que havia rompido relações com a Colômbia. O chanceler de Chávez viajou com instruções para consultar dois colombianos sobre a proposta de Santos de reatar relações. Na residência da Embaixada da Venezuela em Bogotá, Maduro se encontrou naquele dia com o ex-presidente Ernesto Samper Pizano e Gustavo Petro. Há um registro fotográfico de ambos os encontros.

 

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O pedido de Petro para que uma espada concedida a Simón Bolívar e que repousa na Casa de Nariño fosse colocada no local da posse, em 07AGO22, foi simplesmente a confirmação do sentido "bolivariano" que envolve o novo governo da Colômbia. Para Petro, como antes para Chávez, Bolívar é incorporado como peça útil na “narrativa” de sua origem e objetivos, e na justificativa pseudo-histórica de seu projeto político.
 
O recém-formado movimento guerrilheiro M19 roubou a “Espada de Bolívar” em 14JAN1974, de um museu mal protegido em Bogotá. A peça desapareceu até que em 1991 foi transferida de Cuba para a Colômbia, onde a ditadura castrista a mantinha secretamente guardada.
 
A presença da espada na tribuna da posse e o fato de a faixa presidencial ter sido colocada em Petro pela senadora María José Pizarro, filha do líder desaparecido do M19 Carlos Pizarro e ativista do Grupo Puebla, revela a continuidade do “ Bolivarianismo”. Como Chávez, Petro ordenou que a espada fosse colocada "à vista do povo" no palácio do governo.
 

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Aliás, o rei espanhol Felipe VII tem sido alvo de uma campanha agressiva da esquerda global, elaborada pelo partido Podemos na Espanha, porque não se levantou quando um grupo de atores e soldados entrou na “espada de Bolívar”. no palco. O protocolo e a cerimônia do evento não exigiram nenhum gesto especial dos convidados oficiais diante de uma peça que não é símbolo nacional do país anfitrião. O monarca espanhol não foi o único dos líderes presentes na posse de Petro que se absteve de exultar com o aparecimento da arma. O público que frequentava a praça entoava o slogan popularizado pelo chavismo "alerta que a espada de Bolívar anda pela América Latina", revelando a origem ideológica dos reunidos. Enquanto isso, os únicos líderes presentes que aplaudiram a espada foram o chileno Gabriel Boric e o hondurenho Xiomara Castro. O presidente boliviano Luis Arce, de clara filiação à esquerda, limitou-se a levantar-se sem aplaudir. O argentino Alberto Fernández imitou o comportamento do rei espanhol e também não prestou homenagem à arma trazida ao local a pedido de Petro.
 

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A primeira viagem ao exterior do chanceler de Petro foi para Havana.
 
Álvaro Leyva voou para Cuba na manhã de 11AGO2022 acompanhado pelo senador e membro do Grupo Puebla Iván Cepeda, o ex-secretário de Piedad Córdoba e atual comissário da Paz Danilo Rueda e o embaixador cubano em Bogotá Javier Caamaño. Outros convidados da viagem foram o monsenhor Héctor Fabio Henao, encarregado das relações entre a Igreja e o Estado, o representante da ONU Ruiz Massieu, que três dias antes havia participado de um evento do Grupo Puebla em Bogotá, e Jon Otto Brødholt, que é o enviado especial da Noruega para os processos de paz na Colômbia.

O objetivo da viagem foi coordenar com o governo cubano e com líderes do narcoguerrilheiro do ELN que permanecem sob proteção cubana, a retomada das negociações iniciadas por Juan Manuel Santos, das quais Noruega, Cuba, Chile, Brasil e o regime de Maduro são fiadores. Os colombianos foram recebidos por Miguel Díaz-Canel.
 
No final do dia, Leyva e o chanceler cubano, Bruno Rodríguez Parrilla, anunciaram a retomada das negociações e confirmaram Havana como sede.
 

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As relações entre os EUA e a Colômbia podem em breve entrar em estado de choque. Desde sua eleição, Petro se reuniu duas vezes com enviados de Washington. Em 22JUL2022 Petro recebeu uma delegação da Casa Branca e do Departamento de Estado chefiada por Jon Finer, o segundo no comando do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca. A segunda reunião teve lugar no dia 08AGO2022 e no Petro reuniu-se com a delegação enviada por Joe Biden para a inauguração, chefiada pela administradora da Agência para o Desenvolvimento Internacional USAID, Samantha Power. Em ambas as reuniões, começaram a ficar evidentes as divergências entre Petro e os enviados dos EUA no que diz respeito à questão do "combate ao narcotráfico", o que, por sua vez, é o motivo da presença de meios militares norte-americanos na Colômbia.
 
Em seu discurso de posse, nas entrelinhas, Petro deu a conhecer que está prestes a romper acordos de cooperação com os EUA, o que pode afetar o destacamento militar dos EUA na região. Petro afirmou que "a paz é possível se, por exemplo, a política contra as drogas for alterada, por exemplo, vista como uma guerra" e afirmou ainda que "a guerra contra as drogas levou os Estados a cometer crimes e evaporou o horizonte de democracia. Para não deixar dúvidas, quando Petro tomou posse, ele desenhou uma mudança no papel das forças armadas colombianas: "helicópteros e aviões, fragatas, não servem apenas para bombardear ou atirar, eles também servem para criar a primeira infraestrutura de saúde preventiva da Colômbia pessoas.
 

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Nicolás Maduro começará a usar um bastão militar. Herdeiro da jaqueta militar e dos símbolos inventados por Chávez inspirados na insígnia do "Comandante Fidel Castro", Maduro terá agora novos adereços para se vestir de chefe militar.

O chefe militar do regime, general Vladimir Padrino López, pretende emitir um novo "regulamento uniforme" que inclua um capítulo separado para o "comandante em chefe", ou seja, para Maduro. O ditador usará um uniforme militar "de acordo com seu poder". Será equipado com dois bastões, como um general ou almirante, mas o de Maduro será vermelho para eventos de gala e verde para quando estiver em "campanha militar"…

 

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