Eduardo Fernandes – A Hipótese PCC e a Quinta Coluna da Segurança Pública

A HIPÓTESE PCC E A QUINTA COLUNA

DA SEGURANÇA PÚBLICA

 

Eduardo de Oliveira Fernandes [1]

 

           

De forma bem sintética, sabe-se que as assim denominadas associações humanas pacíficas sofreram mutações ao longo da história e percorreram diferentes formas e nomes, tais como família, clã, tribo, nação e o Estado, com suas variantes em Estado Territorial e Estado-Nação.

           

Superada esta primeira narrativa de ordem histórica e antropológica, convém estabelecer que segundo o Dicionário de Política [2], o Estado é “[…] a unidade política e jurídica estável, resultante da reunião de famílias e outros grupos num mesmo território, aí constituindo uma sociedade independente, que, sob a direção de uma autoridade suprema, visa a realizar o bem comum”.

         

Essa pretensa direção exercida por uma autoridade suprema e o interesse em se alcançar o bem comum conferem ao Estado uma tarefa inarredável que é a de concentrar o monopólio do uso da força – tanto na definição de Hobbes (poder político) como na descrição de Weber- sem o que deixaria de ser Estado.

           

Nos dias atuais, de forma inequívoca, tornou-se um mantra sociológico a ideia de que a segurança é pré-condição para a cidadania e vencer a insegurança tornou-se um desafio inalienável dos gestores de segurança pública.

Em território paulista, notadamente pelo controle dos indicadores de homicídio em níveis preconizados pela ONU, além da linha tendência que indica a queda dos crimes patrimoniais, tornaram-se evidentes a necessidade da perenidade de uma política pública de segurança centrada na inteligência policial, policiamento inteligente, tecnologia, inovação, pronta responsividade, accountability e confidence building com a sociedade.

Apesar de os efetivos policiais continuarem visivelmente  postados nas ruas para o enfrentamento da criminalidade tanto de natureza comum como  organizada, surgiu, então, de maneira estranha, a partir de 2013, uma quinta coluna da segurança pública, formada por supostos  pesquisadores e especialistas que defendiam um aparente primado daquilo que foi nominado por estes de  a Hipótese PCC,  ou seja, o entendimento de que, em síntese, atribuía a esta organização criminosa, a responsabilidade direta pelo controle dos homicídios na periferia paulistana, em razão de seus interesses de mercado.

Essa fantasmagoria que tenta desconstruir toda uma modelagem de política pública de segurança construída ao longo de mais de 20 anos por diferentes governos no Estado de São Paulo, ainda, encontra eco em segmentos políticos e acadêmicos, muito embora se desconheça as suas bases de dados  e, até mesmo, a existência de algo do tipo www.pcc.com.br.

Cumpre tentar entender dentro dessa lógica desconstrutiva, o porquê de o PCC, igualmente, em sua vocação empresarial, não ter demonstrado interesse em reduzir as estatísticas de roubos e furtos, posto que estes, além dos homicídios, poderiam ter oferecido óbices aos seus interesses financeiros.

Do outro lado dofront, a quinta-essência da segurança pública, composta pelas forças de segurança do Estado, continua a sua faina cotidiana de lutar pelo decréscimo dos indicadores de roubos outros, roubos de veículos, latrocínios, roubo a bancos, furtos de veículos, furtos outros, estupros, além, é claro, dos homicídios dolosos, cuja taxa encontra-se, atualmente, abaixo de 9 (nove) incidências por 100.000 habitantes, dados estes trabalhados e submetidos a extremado rigor metodológico.  

Por fim, direcionando a discussão para um jogo de palavras, recorro-me à anatomia para desconstruir a pretendida Hipótese PCC, pelo que a denominaria de Hipófise PCC com a analogia e adaptação pessoal de que esta  seria um tipo de “glândula criminal” que tentaria atingir e regular a atividade de outras glândulas da ordem social,  porém sem qualquer comprovação fática, restando a sua classificação como simples subproduto das crenças em detrimento dos fatos, gestada pela hodierna mania de se recorrer à pós-verdade

 


[1]É Doutor e mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, diplomado em Política, Estratégia e Defesa pela ESG e em Investigações de Ameaças Terroristas pelo Departamento de Estado Americano. É autor do livro “As ações terroristas do crime organizado”, Livrus, 2017, e um dos autores do livro “Terrorismo-Complexidades, Reflexões, Legislação e Direitos”, Juruá, 2017.

[2]SOUSA, José Pedro Galvão; GARCIA, Clóvis Lema; CARVALHO, José Fraga Teixeira de. Dicionário de política. São Paulo: T. A. Queiroz, 1999, p202. 

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