Diretor-Geral da AIEA elogia projetos do setor nuclear do Brasil

 


Nelza Oliveira
Exclusivo para DefesaNet

O diretor geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Yukiya Amano, chegou ao Brasil no final de novembro para cumprir uma extensa agenda oficial voltada a conhecer os projetos brasileiros no setor nuclear.

A programação incluiu uma ida, no dia 23, a Iperó, interior de São Paulo, para conhecer o Centro Tecnológico da Marinha (CTMSP), que está desenvolvendo o projeto do primeiro submarino com propulsão nuclear do Brasil, e o Centro Experimental de Aramar,onde será construído o Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), que produzirá radioisótopos com aplicações na saúde, indústria, meio ambiente e agricultura.

No dia 24, Amano teve audiência em Brasília com o Ministro de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicação (MCTIC), Gilberto Kassab. O encontro contou com a presença do presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), Renato Cotta. Amano dedicou o último dia de agenda, 25 de novembro, para conhecer as instalações das usinas nucleares brasileiras na Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto (CNAAA), em Angra dos Reis, região da Costa Verde do Rio de Janeiro.

“Estou muito feliz. Pude conversar com líderes políticos, engenheiros e cientistas e tive a chance de aprender mais sobre o setor no país. Por outro lado, também pude explicar as prioridades da AIEA. Isso tornará possível uma cooperação de modo integrado”, disse o diplomata japonês, de 69 anos, que está em seu segundo mandato à frente da AIEA.

A Agência Internacional da Energia Atómica, que comemora 60 anos em 2017, é uma organização internacional autônoma, ligada à Organizações das Nações Unidas (ONU), para estimular a cooperação científica e técnica no campo nuclear para uso seguro e fins pacíficos, contribuindo para a paz e a segurança internacionais.

Um dos objetivos estratégicos da visita de Amano ao Brasil era acompanhar a situação do vírus da zika no país e avaliar o impacto do auxílio prestado pela agência no combate à doença. A AIEA anunciou no início do ano que ajudaria países da América Latina e Caribe, incluindo o Brasil, no combate ao vírus através de tecnologia nuclear que possibilita um diagnóstico rápido da zika e de esterilização por irradiação do mosquito transmissor da doença. Um projeto piloto já está sendo desenvolvido para o Brasil e a ideia é que o programa seja implementado no próximo ano. Antes do Brasil, Amano esteve em Cuba, outro país que recebe apoio técnico para o planejamento e implementação das técnicas de esterilização de mosquitos para combater a doença.

Brasil autossuficiente em radiofármacos

Outra área de discussão da agenda de Amano no Brasil foi o fortalecimento dos serviços de radioterapia e de recursos humanos para o tratamento do câncer e outras doenças não transmissíveis, além da importância de garantir produção de alta qualidade de fontes de braquiterapia (radioterapia interna), imagens moleculares acuradas e treinamento abrangente para pessoal médico usando aplicações clínicas de medicina nuclear.

Na reunião em Brasília, o Diretor da AIEA destacou a importância do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), que permitirá ao país alcançar autonomia em matéria de radioisótopos, elementos ativos dos radiofármacos empregados, por exemplo, como agentes no diagnóstico e no tratamento de câncer e de outras doenças.

Amano disse que o “RMB é essencial em um país de grande dimensão e população”.

O presidente da CNEN, Renato Cotta, revelou que a próxima etapa do RMB será a assinatura de um contrato de colaboração com a Argentina. O objetivo, segundo ele, é que o reator brasileiro ofereça a base da radiofarmácia para toda a América Latina. Para Cotta, o fundo de cooperação técnica da AIEA é o grande motor dessas relações multilaterais na área de energia nuclear.

“É o que faz os países se falarem numa área tão sensível. É o que faz nós avançarmos de uma maneira mais uniforme, independente de situação política e econômica”, afirmou Cotta.

O presidente da CNEN explicou que o Brasil produz atualmente uma série de radiofármacos de meia-vida curta, com efetiva aplicação por um período de duas horas, mas ainda é dependente de importação do mercado internacional no radioisótopo de vida-longa, que pode durar até 60 horas. O RMD reduzirá essa dependência e a demanda reprimida pelos medicamentos. Cotta explicou que a medicina nuclear no Brasil é responsável por dois milhões de procedimentos médicos, o que representa apenas um terço da demanda real por tratamentos desse tipo.

Cotta lembrou que a atual gestão do MCTIC conseguiu normalizar a situação de contribuição financeira do Brasil à Agência Internacional de Energia Atômica, tanto no fundo de cooperação técnica quanto na dotação anual. Yukiya Amano agradeceu o gesto feito pelo Brasil, mesmo com a atual conjuntura econômica, destacando que a iniciativa brasileira serve de incentivo para outros países.

Para o ministro Gilberto Kassab, a visita de Amano possibilitará a avaliação das ações desenvolvidas no país na área de energia nuclear e também para consolidar a cooperação com a agência.

"A presença do Brasil será sempre solidária e cooperativa para um mundo cada vez mais pacífico, com mais saúde e sustentabilidade”, reforçou o ministro Kassab.

Durante o encontro, Yukiya Amano lembrou a atuação da agência na aplicação pacífica da energia nuclear em vários setores e citou o trabalho no combate ao vírus zika e ao ebola. Ele ressaltou que, atualmente, uma das grandes preocupações da AIEA é com a segurança físico-nuclear e convidou o Brasil para participar de uma conferência internacional sobre o tema, que está sendo organizada para o período de 5 a 9 de dezembro, na sede da Agência, em Viena, na Áustria. O Ministro Kassab disse que enviará uma delegação de técnicos além de representantes da CNEN.

Visita as usinas nucleares em Angra dos Reis

Yukiya Amanovisitou as usinas nucleares de Angra dos Reis acompanhado por outros integrantes da AIEA, além de representantes do Ministério das Relações Exteriores e do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Os diretores da Eletronuclear João Carlos da Cunha Bastos e Leonam dos Santos Guimarães, além de outros executivos da empresa, também acompanharam a visita. O grupo foi recepcionado, no Centro de Informações de Itaorna, pelo presidente da Eletronuclear, Bruno Barretto, que fez uma breve palestra sobre a matriz elétrica brasileira e o papel da energia nuclear no país.

A programação começou com uma visita a Angra 2, que está atualmente desligada para reabastecimento e manutenções periódicas. Yukiya Amano, que nunca tinha visitado uma usina de projeto alemão, teve a oportunidade de conhecer a sala de controle e a turbina. O diretor geral da AIEA se mostrou bastante interessado e fez perguntas sobre sistemas, funcionamento e situações de emergência.

“Estou muito impressionado com a segurança e a dedicação de todas as pessoas que estão tocando o projeto nuclear no Brasil. Atualmente, este tipo de fonte é responsável por cerca de 3% da matriz do país, mas, no futuro, certamente o Brasil irá precisar de mais energia e a nuclear pode ser uma das opções”, afirmou Amano.

Em seguida, os representantes da AIEA conheceram as instalações da primeira usina nuclear brasileira, Angra 1. O grupo teve acesso à sala de controle. Mais uma vez, Amano disse que ficou bastante impressionado com o que viu.

Para o presidente da Eletronuclear Bruno Barretto, essa visita marca uma nova etapa da cooperação da empresa com a AIEA.

“Eu diria que há um aspecto simbólico e prático nessa visita. O simbólico é que, pela primeira vez, recebemos um diretor-geral da AIEA nas nossas usinas e estamos muito orgulhosos disso. O segundo aspecto é que isso reforça a intensa cooperação que já temos com a agência. Nós participamos de programas conjunto interpaíses, de missões em outras nações, visitas técnicas e, sobretudo, de treinamentos que fazem com que nossos especialistas estejam sempre no estado da arte da tecnologia”, destacou Barretto.

De volta à cidade do Rio de Janeiro, na parte da tarde, Amano participou de reunião na Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC). Encerrando seus compromissos oficiais no Brasil, Amano passou na sede da CNEN para receber pela AIEA o prêmio Octacílio Cunha, concedido pela Comissão desde 1981 a instituições que contribuem para o desenvolvimento do setor nuclear brasileiro.
 

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