I2C – Um novo sistema de vigilância marítima testado em Toulon

Nota DefesaNet

Republicamos o artigo "Un nouveau système de surveillance maritime testé à Toulon", publicado originalmente em Mer et Marine, sob especial permissão do autor  VINCENT GROIZELEAU.  Data original do artigo 30JUL2013.

Uma visão sobre tecnologias que poderão ser adotadas no Sistema de Gerenciamento da Amazonia Azul – SisGAAz.

O Editor


 

VINCENT GROIZELEAU
Met et Marine

No âmbito do projeto europeu I2C – analogia com o termo em inglês Eye to See –  o primeiro teste de um sistema de vigilância marítima inovador foi realizado em julho deste ano,  em Toulon, França. O objetivo do novo sistema é detectar e identificar em tempo real as atividades ilegais e criminais no meio marítimo, utilizando novos tipos de captura e diferentes fontes de informação.

Para isso, o sistema utiliza  diferentes meios de detecção no mar, no ar e no litoral, transmitindo os dados para um software. Dotado de algoritmos específicos, o software analisa de maneira dinâmica a trajetória e atividade dos navios, correlacionando as informações com diferentes bases de dados, como por exemplo, àquelas relativas ao sistema de identificação automática de navios (AIS), às movimentações portuárias ou ainda aos registros das empresas de classificação, que dão todas as características dos navios (identidade, matrícula, dimensões, carga, proveniência, proprietário, histórico de controlede avarias e acidentes), assim como fotos.

O Sistema I2C instalado no  CROSS Med   Foto : MER ET MARINE – V. GROIZELEAU


A DCNS à frente de um consórcio com 19 parcerias

Lançado em  outubro de 2010, o programa I2C, com duração de quatro anos, se beneficia de uma sigla simples para uma denominação complexa (Sistema Integrado para Sensores Interoperacionais & Fontes de Informação para Detecção de Comportamento Anormal de Navio  Comum & Identificação Colaborativa de Ameaça).  O programa reúne 19 parceiros europeus, reunidos em um consórcio comandado pela DCNS. O grupo naval francês atua efetivamente nos sistemas de informação dedicados à segurança marítima e a ação do Estado no mar. Seu novo software Marylin, destinado a aperfeiçoar a eficácia das operações de vigilância e de salvamento no mar,  acaba de ser instalado em  todos os centros regionais operacionais de vigilância e salvamento (CROSS) da França metropolitana. A DCNS utilizou sua experiência nesta área a fim de desenvolver os algoritmos do software do sistema I2C.
 
Alertas automáticos

Ao longo de vários anos de estudo e de desenvolvimento, a primeira fase de teste ocorreu em Toulon de 17 a 23 de julho. O software desenvolvido pelos engenheiros da DCNS, em Toulon, foi instalado em vários locais: o CROSS Mediterrâneo, em La Garde, no Pelotão de Segurança Marítima e Portuária (PSMP) da força policial marítima de Port-de-Bouc, perto de Fos-sur-Mer, bem como no Centro de Coordenação para a luta contra droga no Mediterrâneo (CeCLAD-Med), implantado em Toulon. Os dados recuperados foram compilados e analisados em Mourillon, que em seguida difundiu as informações em direção para os locais equipados.
 
O sistema, que oferece o acompanhamento da situação marítima, compreende os alertas automáticos, apresentados em função dos parâmetros previamente estabelecidos com as autoridades operacionais ou diretamente selecionados pelos operadores. “O alerta pode, por exemplo, ser acionado se o sistema detectar um navio em uma velocidade anormal ou comportamento errático”. Porém, de modo geral, cada administração irá estabelecer suas próprias regras, uma vez que o sistema, mesmo sendo comum, se adapta às missões específicas de diferentes operações que o utilizam”, como explica Jean-Manuel Erades, da divisão de Sistemas de Informação e Vigilância da DCNS. Os engenheiros do grupo naval fizeram com que cada administração, em função de suas necessidades e suas missões, pudesse dispor de informações pertinentes e específicas dentro de seu próprio campo de ação.

 
Monitoramento de um barco de pesca em uma zona interditada Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU
 
Ferramenta de ajuda para a tomada de decisão

O I2C serve como ferramenta de ajuda na tomada de decisão dos operadores, que são alertados sobre comportamentos suspeitos detectados no mar. Eles dispõem de informações confiáveis para avaliar a ameaça e, dessa forma, decidir e planejar as intervenções necessárias. No CROSS Med, onde o dispositivo foi instalado, é possível monitorar diretamente a situação em Toulon, e até mesmo além, graças a equipamentos como o AIS, que oferecem uma visão sobre o conjunto da faixa mediterrânea. Dessa forma, barcos pesqueiros podem ser surpreendidos sem dificuldade em áreas interditadas sem tomar conhecimento da ação. Como exemplo, na tela do sistema, a rota do barco foi monitorada durante 24 horas, mostrando seu porto de partida e sua incursão no setor protegido marcado por um polígono vermelho.

O pescador poderia argumentar que apenas passou por essa zona, mas a consulta de sua velocidade, dado também disponível, mostra claramente um atividade de pesca, com diminuições de velocidade significativas e constantes correspondentes ao lançamento n´água da rede de pesca. Por enquanto, o sistema ainda não está em operação e não possui valor jurídico. Mas em breve,  poderá servir às autoridades responsáveis pelo monitoramento das atividades de pesca. Dessa forma,  serão alertados que um barco entrou na zona interditada e poderão fornecer provas do delito, utilizando os meios náuticos ou aéreos dotados de câmeras sem se fazer notar.
 
 

Um barco à vela e um bote semi-rígido,operado como USV utilizado para o teste Foto – DCNS
 
Luta contra os tráficos ilícitos, o terrorismo e a poluição
 
O sistema  pode também ser utilizado para vigilância de outras atividades ilegais, como o contrabando e  tráfico de drogas. Como sempre, com o objetivo de auxiliar as administrações na tomada de decisão, há  a necessidade de efetuar  a triagem das informações recebidas, isolando aquelas que  sejam de real interesse. É a arte da inteligencia, aplicada a um software especializado, capaz de determinar, dentro de um fluxo de dados cada vez maior por causadodesenvolvimento dos meios de comunicação e vigilância, os fatores mais importantes. “Se o sistema detecta por exemplo um cargueiro apreendido por uma empresa anônima registrado sob uma pavilhão de conveniência  que pára durante duas horas em uma costa para uma bela noite sem luar, isso pode interessar os órgãos de combate ao narcotráfico. Um alerta pode ser gerado pelo sistema em função de seu gênero de critérios”, explica Michel Morel, engenheiro da DCNS.

O I2C também pode ser utilizado para indicar o autor de um vazamento marítimo. “O sistema integra as previsões metereológicas e dados oceanográficos. É possível então conhecer a origem de uma linha de hidrocarubaradores e, a partir daí, procurar os navios que passaram pela área de acordo com seu histórico de navegação”.O dispositivo visa, enfim, reagir contra as ameaças ligadas ao terrorismo marítimo, detectando as embarcações suspeitas posicionadas para uma emboscada ou se preparando para atacar.
 
 

O Zeppelin e o drone USV em Toulon Foto –  MER ET MARINE – V. GROIZELEAU

 
Cobrir toda a ZEE e as zonas de sombra do litoral
 
Em matéria de cobertura, o objetivo do I2C é colocar à disposição meios de vigilância dando cobertura a toda zona econômica exclusiva (ZEE), que se estende até 370 km da costa, com uma capacidade de monitoramento de 50.000 navios de diversos tamanhos, qualquer que sejam as condições metereológicas. Isso presupõe sensores de longa distância, mas também de precisão, assim como a possibilidade de controlar as zonas de sombra do litoral (ilhas ou baías visualmente mascaradas e aquelas nas quais os rochedos fazem barreiras às ondas dos radares). O sistema também deve detectar pequenas embarcações, como os barcos à vela ou semi-rígidos, dificilmente captados por radares tradicionais. (pois são de  baixa estatua sobre a água e dotados na maior parte do tempo de cascos feitos de materiais compostos)
 

O Zeppelin utilizado na campanha I2C Fotro – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU

 
Novos sensores testados
 
Na ocasião novos sensores foram testados.. É o caso de um radar de alta frequência instalado na ilha de Saint Mandrier. Graças as suas ondas, que acompanham a curvatura da Terra, este sensor oferece uma grande capacidade de cerca de 400km. A equipe testou também um radar FMCW (Frequency Modulated Continuous Wave), inicialmente concebido para emprego  no litoral, efetuando a cobertura das zonas de sombra dos grandes radares costeiros. No entanto, nesta ocasião, o radar foi utilizado em modo aeroportuário, sendo instalado em um dirigível da empresa alemã Zeppelin( Ver artigo em Mer et Marine)). O uso desse tipo de aparelho para missões de vigilância marítima é uma novidade na Europa. O grande balão, de 75 metros,apresenta a vantagem de ser econômico, sendo capaz de voar durante 24h com um campo de ação bastante amplo. A plataforma, muito estável e concebida para embarcar cerca de 2 toneladas de carga útil, é ideal para obter dados com imagens em alta resolução. Além do FMCW, o Zeppelin dispõe de uma estação eletro-ótica (câmeras de TV e infravermelho) Wescam MX15, que permite identificar um alvo tanto de dia quanto à noite, dentro de um raio de várias dezenas de kilômetros. A transmissão de imagens em direção a Terra foi realizada através de uma ligação de dados e, para o radar, pela rede 3G.

A cabine do Zeppelin – Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU

O radar FMCW e a estação Wescal no Zeppelin Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU


 
Posto de Operção da estação Wecam Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU
 

 
O teste com o I2C foi também a oportunidade de testar um novo radar de pesquisa e salvamento (SAR) desenvolvido pelo Onera. Abrangendo uma antena funcionando em banda S e duas antenas em banda X, esse sensor, concebido para a detecção de objetos no mar, foi utilizado no fim de junho em um avião Falcon 20 da empresa francesa Avdef. Enfim, sobre a água, foi encontrado um drone de superfície (Veículo de Superfície Automático – USV). Uma máquina semi-rígida de 9.5 metros, fornecido pelo faricante norueguês Maritime Partners e dotado de um kit de “dronização” desenvolvido pela Sirhena, filial da DCNS. Capaz de atingir a velocidade de 40 nós, o drone foi dotado de um radar, um receptor AIS e uma estação optrônica com câmera multi-spectral. O emprego de um USV visa, notadamente, especificar as informações coletadas pelo sistema de vigilância, afim de confirmar a imagem de uma situação, enriquecendo o sistema de outras informações recolhidas ao longo de uma patrulha. Graças a esses captadores, o USV, pilotado por um operador, pode ser conduzido rapidamente em direção a uma zona a ser investigada para validar as informações e identificar as ameaças potenciais. Um meio discreto e durador (12 horas de autonomia), muito útil para dar cobertura a uma situação sem pôr em risco um equipamento, por exemplo, no caso de uma operação envolvendo terroristas e traficantes armados. Esse tipo de drone pode também levar os meios de guerra eletrônica, permitindo escutar as comunicações. No momento, para transmitir essas informações o USV utiliza apenas um sistema Wifi estendido, o que limita seu raio de ação. Porém esse contratempo poderá ser superado com a instalação de uma rede de dados,

 
O USV testado durante a experiência com o I2C Foto – Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU
 

Posto de comando e de controle USV
Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU
 
 
As imagens enviadas pela câmera TV/IR do USV
Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU
 
 
Um primeiro sucesso na espera de uma segunda campanha no próximo ano

Após uma curta semana de testes, destinada essencialmente o testar na prática diferentes meios e verificar seu bom funcionamento em rede com o novo sistema, a equipe da DCNS encarregada do projeto declarou estar muito satisfeita.

“O programa foi realizado e nós colhemos todos os dados desejados. Foiconsiderado um verdadeiro sucesso. A partir de agora nós sabemos que o sistema funciona”, comemora Jean-Maniel Erades. Os dados coletados serão analisados a fim de avaliar as reais performances do dispositivo e melhorá-lo, caso necessário. Essa fase irá permitir também avaliar a eficácia de sensores, como o radar FMCW instalado no Zeppelin. “ Nós registramos muitos dados com esse radar, concebido originalmente para ser utilizado no solo. A bordo do dirigível, ele é móvel e nós podemos fazer uma varredura, com alteração de algoritmos de rastreamento. Iremos trabalhar com foco nesse ponto”.

Essa é a perspectiva de uma nova campanha de testes, que irá ocorrer em outubro de 2014 e encerrará o projeto. Nessa ocasião, a DCNS e seus parceiros desejam expor o I2C em cenários operacionais, como a luta contra os traficantes de droga ou ainda a vigilância do santuário de Pelagos, zona de proteção dos mamíferos marinhos localizada ao redor da Córsega até a Itália.


O Zeppelin visto do CROSS Med
Foto – MER ET MARINE – V. GROIZELEAU

Integrado a um programa europeu mais vasto

Com um custo de 15,9 milhões de euros, 55% do orçamento foi financiado pela Europa, o I2C faz parte de num programa de pesquisa mais vasto: o escudo marítimo do EUROSUR (Vigilância Europeia). Ele tem como objetivo desenvolver um sistema de vigilância de fronteiras comuns, multinacional e interoperável. Para isso, o projeto europeu PERSEUS visa conectar os sistemas de vigilância marítima de diferentes países da União Europeia, uma rede que ofereça a cada país uma visão global da situação graças ao compartilhamento de informações detectadas e analisadas pelos sistemas nacionais, como o spationav francês. Por sua vez, o I2C se propõe a melhorar os dispositivos de vigilância marítima existentes com dados provenientes de múltiplas fontes de informação e de novas tecnologias, permitindo otimizar as capacidades de detecção e de identificação.
 

 
 
 

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