EUA – Defesa, o fiel da balança na Virgínia

Flávia Barbosa


Um dos campos de batalha mais imprevisíveis das eleições americanas, a Virgínia, vai às urnas amanhã já temendo os resultados da próxima guerra entre os partidos Democrata e Republicano. Com quase 14% de sua economia atrelados a gastos militares, o estado pode ser seriamente afetado pelos cortes automáticos de US$ 500 bilhões em uma década no orçamento de Defesa, que entrarão em vigor em janeiro se governo e oposição não chegarem a um acordo para limitar o déficit público no longo prazo. O assunto é constante nos anúncios de TV, nos discursos nos comícios, no material de propaganda e foi destaque no debate final entre Barack Obama e Mitt Romney. Numa região de forte presença das Forças Armadas, tem mais chance de levar a Virgínia e seus 13 votos no Colégio Eleitoral o candidato que tiver vendido melhor a ideia de que vai evitar o chamado "abismo fiscal" e salvar estimados 136 mil empregos no estado.

Romney foi o mais agressivo. Escolheu a cidade-sede da maior base naval do mundo, Norfolk, para anunciar seu vice, o deputado e falcão do Orçamento Paul Ryan; vendeu a moderação de Obama com gastos de Defesa; inundou os lares da Virgínia com cartas antecipando desemprego e ameaça à segurança nacional.

Obama vem insistindo que a radicalização dos republicanos é a origem dos cortes automáticos, após a crise da dívida em 2011, e que está empenhado em evitá-los. Mas sua estratégia está concentrada no compromisso com os veteranos, assegurando a continuação de programas de inclusão, treinamento e recolocação aos retornados de Iraque e Afeganistão.

O setor de Defesa representa, só em gastos federais, US$ 56,9 bilhões circulando na Virgínia, onde estão o Pentágono, centros de pesquisa e tecnologia, fornecedores de serviços, fabricantes de equipamentos e estaleiros. É o estado de maior dependência militar dos EUA, com 178 mil servidores civis e de farda.

Com o planejamento afetado pela possibilidade de cancelamento e adiamento de contratos, gigantes da indústria de defesa desde julho alertam que, sem garantia de orçamento, terão de começar já neste fim de ano a enviar cartas a funcionários alertando sobre a possibilidade de dispensas em massa, uma obrigação perante a legislação americana.

Na região costeira de Tidewater, no Sudeste do estado, estão concentrados os estaleiros e fornecedores de equipamento das Forças Armadas. Carlton Hardy, de 68 anos, passou as últimas três décadas trabalhando com importação de equipamentos e bens para a indústria de defesa e vê ao menos nove cidades sob "crítica ameaça". Para ele, a incapacidade dos republicanos cederem nas discussões fiscais é a maior culpada pelo impasse. Por isso, seu voto será de Obama.

– Esta região é construída sobre o setor de Defesa. O impacto seria imenso. Infelizmente, conciliação virou uma palavra perigosa e envenenada hoje em dia. Romney fala qualquer coisa para ganhar a eleição. Ao menos Obama tem uma visão geral do Orçamento mais equilibrada, então acho que tem melhores condições de costurar um acordo – avalia Hardy.

Cargo de COMANDANTE-EM-CHEFE ganha peso

Stephen Morin, de 42 anos, dono da floricultura Norfolk, concorda com o tamanho do impacto para os negócios locais. Segundo ele, não há um único dia em que não atenda um cliente de alguma forma relacionado à indústria de defesa. Mas Morin discorda sobre culpados. Para ele, Obama quer pagar sua "agenda socialista ambiciosa" às custas dos militares:

– Nós já perdemos alguns navios que foram suspensos, o que freou a construção de novos condomínios de casas. Os republicanos querem garantir nosso poderio em vez de fazer caridade com o dinheiro público. Romney anunciou que pretende construir novos navios e expandir o quadro de militares; já Obama acha que está muito bom do jeito que está.

Mais do que o título de guardião do cofre militar, Obama e Romney disputam a percepção do eleitorado da Virgínia sobre qual dos dois está mais apto a ser comandante-em-chefe dos EUA. Os veteranos – vozes da experiência, com influência na vida comunitária – são peças essenciais na empreitada. Têm forte presença nos dois partidos, em grupos que organizam encontros e fazem ligações pedindo votos.

Do lado republicano, pesa a imagem dos EUA como superpotência e das Forças Armadas como instituição. David Davis dedicou 20 de seus 49 anos à Marinha. Acusa Obama de ter enxugado o orçamento militar a ponto de reduzir benefícios, limitar reajustes salariais e se resignar com a redução do papel americano no mundo. Mas ele se incomoda mesmo é com o "estilo celebridade" de Obama, que teria capitalizado pessoalmente a captura de Osama bin Laden em detrimento da força responsável pela ação:

– Servi sob o comando dos dois partidos, e os republicanos têm mais respeito pelos militares.

Veterana com participação na guerra do Vietnã, a enfermeira Ann Rawley, de 72 anos, está engajada na campanha de Obama justamente por considerar que respeito com as tropas foi a marca do governo democrata. Para ela, o presidente manteve a promessa de encerrar duas guerras, tocou uma política externa equilibrada e menos belicista, além de implementar programas de emprego e crédito a veteranos e de ajuda a mulheres e filhos de militares. Também "acabou com a hipocrisia" sobre homossexualidade.

– A maior parte da minha geração de militares passou por uma lavagem cerebral conservadora, moldada por uma realidade geopolítica que não existe mais. Os jovens têm uma mentalidade muito aberta e se interessam por uma política mais ampla. Obama tem uma agenda efetiva para as Forças Armadas – diz ela.

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