Tema para debate: censores da liberdade de pensamento

Publicdo Jornal Zero Hora 10 julho 2011


Luiz Carlos da Cunha
Escritor


“A gênesis das raças mestiças do Brasil é um problema que muito tempo ainda desafiará o esforço dos melhores espíritos.” Euclydes da Cunha (Os Sertões)

O jornal Zero Hora trouxe a público curioso episódio acadêmico ocorrido no curso de História da UFRGS. Trabalho escolar em que o autor expôs sua tese sobre as causas das diferenças culturais e raciais que determinam qualidades de pessoas ou grupos causou tal rebuliço que, em vez de deflagrar um seminário de altos estudos, terminou em caso de polícia.

Destaca-se no lamentável episódio, independente do acerto ou falsidade da tese, a reação patrulhadora do pensamento. Alguns se arvoram em fiscais da “política correta” no entender a natureza. Todos devem se enquadrar no modelo por eles assumido. Nas ciências matemáticas, biológicas e, de relevo, as chamadas humanas, não existe uma só resposta definitiva e eterna a problemas.

Na arcada universitária situam-se a atmosfera protetora do contraditório, o embate das ideias e a liberdade de pensar. Se isto não existir, não há clima científico. O livre pensar e de expressão amalgamou as nações mais produtivas e democráticas na era moderna. Esculpiu o mundo moderno que reconhecemos enfático – a civilização ocidental.


As teorias raciais, apontando nas raças as diferenças qualitativas da espécie humana, surdiram fortes nos séculos 18 e 19, justamente na França e Inglaterra – nações colonialistas à época.

As explicações sobre os fenômenos sociais e econômicos que marcaram saltos de qualidade criadora na história da civilização, nas ciências e nas artes, são díspares e, muitas vezes, eivadas de tiques nacionalistas, torcidas pelo vezo político, tendenciosas pelo cunho religioso. Não há respostas matemáticas na interpretação da história.

O que fez a grandeza da Grécia Clássica? A raça? Por que em cinco séculos reuniu a pujança filosófica que forjou o pensamento ocidental até o presente?

E como explicar a glória do Renascimento Italiano? Seria um fator genético? Que razões distingue no cinquecento reunir gênios de Galileu a Da Vinci? Uma casualidade geográfica? E a Revolução Industrial irrompida na Inglaterra, alastrando-se pela Europa e atingindo a culminância criativa na América, lista centenas de interpretações díspares, ora eivadas de tiques nacionalistas, ora obscurecidas pelo vezo político ou religioso.

O que paralisou a África no atraso? Estudar e pesquisar as razões da enorme distância cultural e socioeconômica que nos separa das nações africanas, ou mesmo as propriedades cerebrais de uma raça e outra, são estímulos de interesse científico, cujo conhecimento pode contribuir à evolução e ao aprimoramento da humanidade.

A tese provocadora daquele estudante pode ser resumida na opção do fator determinante (entre muitos) que diferencia as raças humanas: 1 – Fator genético e, portanto, hereditário; ou, 2 – Cultural, desenhado pelo meio ambiente. Ambas interpretações reúnem vasta bibliografia e experimentos acadêmicos, notadamente em universidades americanas.

Murray e Herrnstein respondem pela primeira. O meio ambiente influindo na inteligência tem a melhor expressão no “efeito Flynn” – tese do psicólogo neozelandês que mostra a ascendência do QI em todo mundo. As afirmações do aluno, pomo da discórdia, antes de criminalização, merecem pelo desafio instigante desencadear um fórum de confrontos conceituais.

Reunir expoentes cientistas, algum do quilate de James Watson ou Francis Crick – descobridores da estrutura do DNA. Prêmios Nobel de Medicina de 1968. Jamais se admite no bojo universitário condenar o aluno ousado pela livre expressão de seu pensamento. Desmereceria a Universidade.

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