Avanços militares são trunfo rebelde na negociação em Minsk

Costuma-se dizer que diplomacia em tempos de guerra não se faz sem uma opção militar. As negociações em Minsk nesta quarta-feira (11/02) entre Ucrânia e Rússia – intermediadas por Alemanha e França – ocorrem sob a pressão do campo de batalha.

Na cidade oriental ucraniana de Debaltseve, o Exército ucraniano luta com, provavelmente, 5 mil soldados, contra ataques rebeldes vindos de três lados. Se o cerco já foi fechado realmente, com a interdição da estrada principal para o lugar, isso é, aparentemente, uma questão de interpretação.

O Exército ucraniano diz que não; os rebeldes, que sim. Ao longo do percurso, estariam ocorrendo batalhas entre tanques, segundo relatos da mídia local não confirmados. Mas basta que a via fique intransitável para que o cerco de Debaltseve seja, realmente, fato.

E isso parece ocorrer desde terça-feira, pontualmente um dia antes do começo das negociações em Minsk. Isso cria a ameaça de uma catástrofe humanitária na Ucrânia que superaria tudo o que já ocorreu.

Observadores independentes não conseguem no momento ter uma visão plena do que ocorre. Um general russo e um ucraniano, que fiscalizam na região o acordo de cessar-fogo fechado em setembro em Minsk, afirmam que ainda há "cerca de 5 mil civis em Debaltseve", informou no domingo Michael Bociurkiv, porta-voz da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE).

Ele observou, entretanto, que a missão de observação "não conseguiu confirmar esse número". Na sexta-feira passada, as armas se calaram por algumas horas, para que pessoas que estavam há mais de duas semanas escondidas em seus porões pudessem ser resgatadas e levadas a local seguro.

Cerca de 600 deixaram Debaltseve em um comboio que rumou em direção a oeste, para o território controlado pelo governo central de Kiev. Apenas 35 delas teriam seguido em direção à área sob controle dos rebeldes.
 

Tiros à esquerda e à direita

A espiral de violência da guerra no leste da Ucrânia gira cada vez mais rápido. Na terça-feira, o Exército ucraniano lançou uma investida contra Mariupol, e os rebeldes responderam com um foguete sobre Kramatorsk, sede do Estado-Maior ucraniano, matando dez pessoas.

Ainda no final de janeiro, a professora de dança Iryna Maljaeva conseguiu, com a ajuda de parentes, fugir de Debaltseve e, com um carro particular, percorrer três horas de estrada até Carcóvia. "Tivemos sorte, partimos de manhã cedo, não havia tiroteio na estrada", conta.

Entretanto, havia tiroteio à direita e à esquerda da via principal, onde, de acordo com informações não confirmadas, tanques de guerra estariam se enfrentando.

Hoje, Maljaeva vive em um campo de refugiados nos arredores de Carcóvia. Parentes também a ajudaram a encontrar vaga no lugar, nada foi organizado previamente. Se Debaltseve for tomada pelos rebeldes, a cidade pode se tornar um caos.

A administração pública ao longo da linha de frente está irremediavelmente sobrecarregada. Ajuda, geralmente, só vem a partir de voluntários, que fornecem diretamente medicamentos e alimentos a hospitais e a refugiados. É grande a insatisfação dos voluntários com o governo, empossado há dois meses e meio.
 

Interpretações dos fatos

Ainda no início da semana, o porta-voz do Exército ucraniano Andriy Lysenko alegava que suas tropas ainda conseguiam receber carregamentos em Debaltseve, enquanto os rebeldes afirmavam que haviam fechado completamente o cerco. A tática de interpretar os fatos conforme a conveniência é procedimento já bastante conhecido nesse conflito.

Já na semana passada, o porta-voz negou que a localidade de Vuhlehirsk, ao sul de Debaltseve, havia sido tomada pelos rebeldes, até que imagens que não deixavam dúvidas aparecessem na televisão de Kiev, mostrando um lugar devastado, com civis completamente traumatizados.

Ao mesmo tempo, um alto funcionário do governo ucraniano pediu: "Relatem, finalmente, que somos atacados pela Rússia e não somente pelos rebeldes". A liderança ucraniana está sob enorme pressão, de dentro e com a situação militar no leste do país. Isso limita o poder de barganha da delegação ucraniana em Minsk.

Uma testemunha, que visitou nesta semana Vuhlehirsk, relata que os rebeldes se encontram de moral alto e ganhando terreno na região. Ele também viu um canhão antiaéreo de construção russa, ladeado por um "instrutor", que pode operar o dispositivo.

Este é o ponto de partida para o principal interlocutor em Minsk: o presidente russo, Vladimir Putin. A situação militar está a seu favor e a favor do rebeldes apoiados pelos russos. É uma posição de negociação conveniente. Conveniente e às custas de mais de 5 mil civis em Debaltseve.

 

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