Diálogo de paz na “última ditadura da Europa”

"Não se preocupe com o evento em Minsk", afirmou o presidente de Belarus, Alexander Lukashenko, ao seu colega russo, Vladimir Putin, durante uma reunião realizada em Sochi no fim de semana. Segundo ele, a cúpula sobre o conflito na Ucrânia, marcada para quarta-feira em Minsk, será muito bem organizada.
 
Além do chefe do Kremlin, participarão do encontro o presidente ucraniano, Petro Poroshenko, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e o presidente francês, François Hollande.
 
Na conversa com Putin, Lukashenko lembrou da reunião em Minsk do chamado "grupo de contato", composto por representantes de Ucrânia, Rússia e da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE). "Fiz tudo como você pediu, não houve reclamações", ressaltou o presidente bielorrusso. Aquilo soou como se ele estivesse entregando um relatório.
 
Mais até do que Berlim, Minsk se tornou o ponto central dos esforços diplomáticos para encerrar o conflito no leste da Ucrânia. No final de agosto de 2014, Putin e Poroshenko se encontraram pela primeira vez na capital de Belarus. Em setembro, os representantes do governo em Kiev e dos separatistas pró-russos do leste da Ucrânia, reunidos na cidade, chegaram a um acordo sobre uma espécie de plano de paz. O acerto não durou muito, mas serviu indiretamente para legitimar os líderes das autoproclamadas repúblicas de Donetsk e Lugansk.
 
Minsk não virou um centro das negociações por acaso. Desde o início da crise da Ucrânia, há cerca de um ano, Belarus se posicionou como um país neutro. No final de fevereiro de 2014, pouco antes da anexação da península da Crimeia pela Rússia, Lukashenko apelou para a preservação da integridade territorial da Ucrânia.
 
Ao contrário da Rússia, ele reconheceu logo a nova liderança ucraniana. Lukashenko, que felicitou Poroshenko no final de maio, logo após a vitória eleitoral, também foi convidado para a posse do novo chefe de Estado em Kiev. Em dezembro de 2014, visitou novamente a capital ucraniana para negociar com Poroshenko.
 
Neutralidade aparente
 
Mas, na verdade, Lukashenko é um aliado próximo e de longa data de Moscou. Hoje quase ninguém se lembra que a Rússia e Belarus fundaram, em 1997, um Estado unificado que, do ponto de vista puramente formal, ainda existe. Belarus e Rússia também são membros fundadores da União Econômica Eurasiática, que inclui o Cazaquistão e existe legalmente desde 1° de janeiro de 2015.
 
É verdade que ambos os países têm regularmente disputas por causa de questões comerciais. A Rússia restringiu recentemente importações de produtos alimentícios bielorrussos, irritando Lukashenko. Mas nada disso afeta a aliança entre Moscou e Minsk.
 
Militarmente, ambos trabalham em estreita colaboração. Eles são membros da Organização do Tratado de Segurança Coletiva, dominada pela Rússia. A Rússia opera uma estação de radar em Belarus e tem estacionados, no país, aviões de combate e helicópteros. Até 2016, Moscou quer construir uma base aérea própria na cidade bielorussa de Babruisk, a cerca de 250 quilômetros ao norte da fronteira com a Ucrânia.
 
A especialista Astrid Sahm, do Instituto Alemão de Relações Internacionais e de Segurança (SWP, na sigla original), diz que a recente "amizade" de Belarus com a Ucrânia não é algo novo. "Lukashenko manteve, apesar de sua rejeição às chamadas 'revoluções coloridas', já a partir de 2004 bons contatos com o então presidente ucraniano, Viktor Yushchenko", explica. A analista destaca que foi por causa disso que Lukashenko foi procurado por políticos ucranianos em busca de apoio também após a mudança de governo em Kiev.
 
O próprio Lukashenko, no entanto, sublinhou que não gosta da palavra "mediação". Ele prefere "ajuda". "Não somos pacificadores, não nos candidatamos a esse papel", disse recentemente.
 
"Último ditador da Europa"
 
A Rússia não se pronuncia sobre o curso incrivelmente amigável de Lukashenko em relação aos novos governantes em Kiev. Observadores suspeitam que Moscou quer manter aberta uma porta de acesso direto a Kiev. São poucos os políticos em Moscou que acusam Lukashenko de estar do lado errado.
 
E o próprio Lukashenko parece se beneficiar de seus serviços diplomáticos na crise da Ucrânia. O presidente bielorrusso, que governa autoritariamente, é visto no Ocidente como "o último ditador da Europa", e a União Europeia lançou sanções contra ele e representantes do governo bielorrusso. Agora ele tem a oportunidade de apertar as mãos de Merkel e Hollande, como anfitrião do encontro de cúpula.
 
E não só isso: a Letônia, que ocupa a presidência rotativa da UE, não descartou um convite a Lukashenko para participar da cúpula de parceria oriental da UE, programada para ocorrer em Riga em maio de 2015. Até agora, ele era considerado indesejado nessas reuniões de líderes europeus.
 
Tudo isso deve beneficiar Lukashenko também em relação ao seu eleitorado. Em setembro, o presidente bielorrusso, que está no cargo desde 1994, quer ser eleito novamente para a chefia de Estado.

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