ONU e a vingança da Venezuela

Por Colum Lynch – Thexto do Foreign Policy

Tradução, adaptação e edição – Nicholle Murmel

 
A Venezuela foi eleita na última quinta-feira (16OUT14) para um mandato rotativo de dois anos no Conselho de Segurança das Nações Unidas, após forte oposição dos Estados Unidos à presença do país no painel internacional. A vitória venezuelana na votação pode significar atritos em questões desde a Síria até a Ucrânia.
 
O ministro venezuelando das Relações Exteriores, Rafael Ramírez, disse a repórteres no lado de fora do prédio da Assembleia Geral da ONU que o fato de o país ter recebido 181 votos entre os 193 membros da organização “mostra claramente o amplo apoio que a comunidade internaional dá à nossa revolução”.

“Este triunfo é dedicado ao comandante Hugo Chávez”, acrescentou Ramírez, relembrando a campanha do então presidente da Venezuela em 2007 por um assento no Conselho de Segurança após a votação desfavorável de 2006, resultado de manobras diplomáticas americanas. A homenagem é sinal do papel duradouro de Chávez na mitologia política venezuelana. A filha do falecido presidente, María Gabriela Chávez, recentemente indicada como vice-embaixadora de Caracas na ONU, se reuniu com a delegação do país para comemorar a vitória. Enquanto isso, o atual presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, também atribuiu a “vitória a Hugo Chávez Frías” durante pronunciamento em rede nacional na televisão. “Chávez continua a vencer batalhas pelo mundo”, acrescentou.

A Venezuela tomará seu assent no 15a Edição do Conselho de Segurança em janeiro de 2015, junto com Angola, Malásia, Nova Zelândia e Espanha. A Turquia, favorita de longa data a um lugar no CS, perdeu a corrida contra a Nova Zelândia, que venceu na primeira rodada de votação com 145 votos, e contra a Espanha na rodada final por 132 votos a favorde Madri. Em eleição anterior ao Conselho, em 2008, Ancara conseguiu 151 votos e venceu facilmente na primeira rodada.

Diplomatas do Conselho afirmam que a Turquia ficou de fora provavelmente pela alienação em relação a potências-chave como o Egito, que se ressete dos laços próximos de Ancara com o Hamas e a Irmandade Muçulmana. Mas segundo esses mesmos diplomatas, as nações influentes do Golfo, especialmente a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, é que podem ter dado o golpe final na candidatura turca. Esses governos recebem mal a relutância da Turquia em apoiar totalmente a coalizão militar contra o Estado Islâmico.

Sauditas e Emirados, segundo fonte da comunidade árabe, fizeram lobby contra a Turquia. “Pensei que [Ancara] perderia votos, mas o tamanho da perda me surpreende. Muito.”, declarou um diplomata europeu. “Parece que a Turquia foi morta pelo Conselho de Cooperação do Golfo (GCC na sigla em inglês), que inclui todas as monarquias do Golfo Pérsico. Outro diplomata do Conselho de Segurança sugere que a derrota turca é resultado da postura débil do país no cenário internacional.

Ainda não está claro se os Estados Unidos apoiaram a campanha turca por um assento no CS. Washingron mostrou abertamente frutração pela recusa de Ancara em intervir militarmente na Síria em favor dos combatentes curdos que defenderam a cidade de Kobani, na fronteira, contra as forças bem equipadas do ISIS. Apesar das diferenças, os EUA precisam do apoio da Turquia para confrontar o Estado Islâmico, seja pela permissão de uso do espaço aéreo ou por acesso às bases militares turcas.
Nesse contexto, a vitória da Venezuela foi ainda mais impactante porque os Estados Unidos, que tentaram com todas as forças vetar campanhas anteriores de Caracas, dessa vez não atrapalharam.

Diplomatas baseados nos EUA dizem que os americanos não lutaram contra, sabendo que, provavelmente, seria causa perdida. “Acho que eles pensaram ser inútil, já que não teria dado certo”, explica outro diplomata europeu. Mais um diplomata a serviço do Conselho de Segurança disse que os EUA empreenderam uma campanha “meia boca” para barrar Caracas, apesar de “saberem que não ia funcionar”. O diplomata diz ainda que Washington enviou a vários governos, inclusive o americano, uma nota oficial declarando que a Venezuela é um “país com o qual não se pode trabalhar”.
 
As relações entre Estados Unidos e Venezuela são instáveis desde que Hugo Chávez, antigo oficial do Exército venezuelano e político populista, chegou ao poder em 1999, onde permaneceu até sua morte, em 2013. O presidente se incomodava com o que entendia como fortes pressões de George W. Bush para derrubar seu governo. Em 2006, Chávez fez um discurso amargo na Assembleia Geral da ONU, onde denunciava Bush como um demônio imperialista e racista. No final do mesmo ano, os EUA, se vigaram barrando a candidatura da Venezuela ao Conselho de Segurança.

Dessa vez, Caracas pôde reivindicar assento no CS sem oposições porque a América Latina, como a maioria dos grupos na ONU, seleciona seus candidatos de forma rotativa antes do voto na Assembleia Geral. A Venezuela, que não ocupava assento desde o começo dos anos 1990, foi a principal escollha das nações latino americanas. A votação de 2006  acabou em um beco sem saída, dando oportunidade ao Panamá, candidato fruto de concessão, assumisse o posto. Mas para silenciar o alarde regional, os países latinos fizeram um acordo que daria à Guatemala o lugar no Conselho de Segurança em 2012, e à Venezuela agora.

Após a votação do dia 16, um representante do governo americano disse que Washington tinha “meio limitados para afetar a decisão latino-americana”, já que não vota junto com o bloco. “Sim, os EUA têm preocupações óbvias acerca da escolha da Venezuela para o Conselho de Segurança”, acrescenta o representante. “Nossa apreensão por conta do histórico de Caracas em termos de direitos humanos e governança democrática é bem conhecida, e vêm sendo comunicada à região. Dada a longa história venezuelana de mau comportamento… Os EUA têm sérias preocupações com a disposição de Caracas para ser um membro produtivo do Conselho de Segurança”.

Mas o representante do governo americano declarou também que Washington tem uma longa história de trabalho com países com os quais tem divergências – citando a Síria em 2001 e a Líbia em 2007, então governada por Muammar al-Gaddafi. “Agiremos da mesma forma nesse caso”, disse.

Em declaração official, a embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Samantha Power, disse que “a cartilha da ONU deixa claro que candidatos a membros do Conselho de Segurança devem contribuir para a manutenão da paz e segurnaça internacional, e apoiar outros propósitos da Organização, incluindo promover o respeito univrsal aos direitos humanos… A conduta da Venezuela na ONU vem sendo contrária a esse espírito, e suas violaçãos dos direitos humanos em seu p´roprio território batem de frente com o texto das Nações Unidas”.

Em todo caso, a eleição da última quinta marcou o fim de uma temporada intensa de lobby em Turtle Bay. Em uma última campanha por votos, o ministro turco das Relações Exteriores, Mevlut Cavusoglu, fez uma recepção de gala no Starlight Room do Aldorf Astoria para tentar uma última jogada com os delegados da ONU. Convidados que incluíram o embaixador saudita e o ministro das Relações Exteriores e embaixador na ONU representando a Espanha, foram recepcionados com hors d'oeuvres de folha de parreira, baklava coberta com mel e mini-bombas de chocolate. Ao final da noite, os convidados recberam um pacote marrons com lembrancinhas – copos térmicos pintados com imagens em aquarela de Istambul.

Claramente, essa gentileza turca não foi sufuciente.

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