SEPROD – Comentários à troca de Comando

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A new era for the relationship between Brazil and the Defense Industry Link

O Editor

por Observer
Especial para DefesaNet


Na quinta-feira, dia 14 de janeiro, tomou posse a nova Secretária de Produtos de Defesa (SEPROD). A troca de comando na SEPROD, ao lado das mudanças na Secretaria-Geral, onde o General Silva e Luna sucedeu à Eva Chiavon; e no Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (EMCFA), onde o Almirante Ademir Sobrinho encerrou o período do General-de-Exército De Nardi, dá indicações da mudança de estilo e principais tranformações à serem imprimidas pelo atual Ministro da Defesa, Aldo Rebelo, em sua gestão à frente da pasta.
 
A ex-deputada, e ex-presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, Perpétua Almeida, substitui o Dr. Murilo Marques Barboza, no cargo desde 2011, e que já havia ocupado o cargo de presidente da INFRAERO.
 
Pinçamos trechos da fala da Profª. Perpétua Almeida, quando da cerimônia em que tomou posse na SEPROD, e fizemos uma análise das consequencias práticas que podemos esperar deste novo comando, nesta que é uma das mais importantes Secretarias do Ministério da Defesa, e com maior impacto quanto à disponibilização de bens, informação e serviços às Forças Armadas, e quanto ao desenvolvimento científico e industrial da área de Defesa no Brasil:
 
Este Ministério da Defesa diferencia-se dos demais, entre outros aspectos, por ser um Ministério de Estado e como tal estar no cerne de um projeto nacional de desenvolvimento e de fortalecimento do Estado nacional; e por extensão, ter no planejamento e na visão estratégica um elemento fundamental a pautar sua ação.
 
Destaca-se aqui o reconhecimento que à Defesa deva ser aplicada uma Política de Estado, distinguida de uma Política de Governo. Assim sendo todas as ações a ela relacionadas devam gozar de planejamento eficiente, que tenha na continuidade e visão estratégica de longo prazo a eficácia no cumprimento de seus objetivos.
 
O desenvolvimento e a consolidação de uma robusta Base Industrial de Defesa, a partir do fomento de um complexo industrial-militar de Inovação, pode se configurar num vetor de grande importância para a reindustrialização nacional de novo tipo, baseada no conhecimento e no transbordamento de produtos e processos para a área civil, impulsionando a economia nacional na retomada do desenvolvimento. Precisamos, ao lado de uma agricultura forte e de um setor primário com maior valor agregado, fomentar intensamente o segmento de alta tecnologia industrial. Portanto essa é uma grande contribuição que a Defesa Nacional poderá dar a transformação de nossa economia. Os países desenvolvidos utilizam-se largamente de pesquisas e investimentos na Base Industrial de Defesa como vetor de desenvolvimento nacional. Exemplo claro é o da internet, que nasceu nos laboratórios de pesquisa das Forças Armadas Norte Americanas. Precisamos, estudar melhor estas experiências internacionais visando alcançar a condição de país desenvolvido.
 
A importância dada à Indústria de Defesa suportada pela inovação tecnológica, é apontada pela nova Secretária como elemento de relevância para a recuperação e transformação econômica, destacado o transbordo dos investimentos em Defesa, e o uso dual de tecnologias. Também é destaque aqui, a visita, sem falsos pudores nem xenofobia, às práticas bem sucedidas alcançadas por modelos adotados por outros países e seus respectivos ministérios/departamentos de Defesa, e sua relação com sua base industrial.
 
Um país desenvolvido, precisa ter crescente autonomia no domínio e na produção de tecnologias críticas e sensíveis, tendo em vista o regime de restrições internacionais para acesso a este tipo de conhecimento. Para assegurar nossos interesses, como dizem os documentos estratégicos de Defesa, seria imprudente imaginar que não podemos sofrer antagonismos ao perseguir nossos objetivos.
 
Este trecho traz às claras, sem tabus ou reservas, o reconhecimento da dependência tecnológica a ser combatida. Também observa-se a sobriedade de reconhecer que o choque de interesses, ainda mais em um cenário geopolítico de grande ebulição, e com o surgimento de novas ameaças oriundas de conflitos políticos, financeiros, étnicos e religiosos, não nos ofereça sempre uma perspectiva eterna de relações pacíficas e concordância tácita por parte de outras nações, blocos econômicos ou grupos sociais com os interesses nacionais.
 
O momento de dificuldades econômicas traz o risco que profissionais qualificados e treinados durante longos anos estão sendo demitidos ou cooptados pelo mercado externo e, consequentemente, algumas empresas nacionais, ligadas ao setor de defesa, estão interrompendo suas linhas de produção ou vem sendo adquiridas por empresas estrangeiras. Precisaremos enfrentar o problema da descontinuidade no fluxo de recursos e cumprimento dos prazos de entrega dos Projetos Estratégicos das Forças Armadas. Sabemos – e os Comandantes das Forças tem alertado a respeito, inclusive em audiências no Congresso Nacional – que a postergação dos investimentos nesses Projetos terão efeitos não apenas sob nossa capacidade de Defesa Nacional, mas também há o risco destes produtos e sistemas em desenvolvimento se tornarem obsoletos.
 
O discurso demonstra a preocupação com o risco de desmantelamento da capacidade industrial em Defesa, e principalmente o esvaziamento de profissionais capacitados. Aponta de forma incisiva os prejuízos do não cumprimento de cronogramas, o que além de representar, de fato, perda de dinheiro por investir-se em tecnologias eventualmente ultrapassadas por outras mais modernas, pode representar pagamento de contratos assumidos sobre produtos sem efetiva utilidade para as Forças à época de sua conclusão.
 
Quando presidi a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, em 2012, me empenhei na aprovação da Lei 12.598, que estabelece normas especiais para as compras de produtos de defesa e dispõe sobre as regras de incentivo à área estratégica de defesa. Esta Lei define dentre outros, o conceito de Empresa Estratégica de Defesa, e institui o Regime Especial Tributário para a Indústria de Defesa, o RETID, já experimentado por algumas empresas. No entanto, precisamos dar novos passos no sentido de atualizar a legislação e suprimir os entraves para que mais empresas sejam habilitadas no RETID.
 
Neste trecho, registra-se o propósito de adequar o diploma legal a fim de estender os benefícios fiscais a um maior número de empresas.
 
No cumprimento de nossa missão na SEPROD, especial importância terá a interlocução com a ABIMDE (Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança) e com as Federações das Indústrias, várias das quais possuem Comissões e Departamentos da Indústria de Defesa.
 
A Secretária Perpétua Almeida aqui demonstra nominalmente o reconhecimento às instituições representativas da Indústria de Defesa, e manifesta seu interesse em manter diálogo com tais entidades.
 
O financiamento deste sistema [Sistema de Inovação em Defesa] será fundamental; … recompor a capacidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para que o Estado brasileiro, sobretudo por meio do instrumento “subvenção econômica”, tenha capacidade de correr o risco da "Inovação disruptiva", base para os progressos tecnológicos em Defesa nacional. Como sabemos, os produtos e equipamentos nacionais de Defesa, desde os aviões da EMBRAER aos mísseis da AVIBRAS e da MECTRON, assim como as câmeras de satélites da Opto, tiveram forte aporte de recursos não reembolsáveis do Estado brasileiro, sobretudo por meio da FINEP.
 
O financiamento de projetos que permitam às empresas enveredar pela inovação que promova a vantagem competitiva dos produtos nacionais deve ocupar espaço importante na pauta da SEPROD sob o comando de Perpétua.
 
Ao focar na organização da Base Industrial de Defesa, estaremos consolidando as mais de 60 Empresas Estratégicas de Defesa, podendo ser necessário que um passo adicional seja dado: a criação de conglomerados e adensamento das cadeias produtivas por segmento, sobretudo aqueles elencados no Livro Branco de Defesa Nacional. Para isso, o Estado brasileiro precisará responder a uma pergunta: em que áreas e segmentos de Defesa o Brasil almeja ter autonomia e domínio tecnológico na produção de equipamento e sistemas? Respondendo a esta questão, decisões estratégicas quanto à organização da Base Industrial e das próprias Empresas Estratégicas de Defesa, deverão ser tomadas.
 
O discurso, neste ponto, revela ponto central dentro do que se pode esperar de avanços do Ministério da Defesa, no que diz respeito às importantes funções da Secretaria de Produtos de Defesa.
 
Preocupa-nos, em especial, por um lado, riscos de desnacionalização de nossas Empresas Estratégicas e por outro lado, riscos de descontinuidade derivados da inconstância das encomendas do Estado para as empresas. As empresas estrangeiras sempre serão bem vindas. Serão bem vindas quando firmarem conosco parcerias que nos proporcionem tecnologias e novos mercados.
 
A nova Secretária não se esquivou de questão que certamente muito interessa aos fabricantes estrangeiros, e aqui fica clara sua posição.
 
Percebo que se faz urgente estruturar na SEPROD, em cooperação com o setor de Planejamento do Gabinete do Ministro, uma área que chamaria de “inteligência tecnológica” quanto as tendência da guerra moderna e do futuro.
 
Outro ponto alto da fala da Profª. Perpétua, foi a percepção desta lacuna grave na estrutura de Defesa Nacional, determinante para qualquer planejamento estratégico e otimização de recursos ao longo prazo.
 
No que diz respeito às compras públicas, necessitamos urgentemente incentivar a aquisição do produto nacional. Não deve ser uma opção a compra do material importado, quando há produtos nacionais similares no mercado, salvo em situações excepcionais. As importações desnecessárias trazem impactos negativos sobre o balanço de pagamentos e causam danos à base industrial, inclusive, impedindo a redução sustentável dos preços a longo prazo. A SEPROD deve cuidar de apresentar a todos os órgãos do setor público o portfólio de produtos desenvolvidos pela BID e deve trabalhar na revisão e adequação das legislações pertinentes às compras e licitações. Por sua vez, os órgãos públicos devem ser incentivados a assumir mais compromissos com a BID, a partir de uma visão de país em seu desenvolvimento a longo prazo.
 
Neste ponto, talvez se possa dizer que pela primeira vez, de forma palpável e cartesiana, apresenta-se uma destinação mais clara do transbordo tecnológico para produção de produtos de uso civil. A estruturação de linhas de produtos, que oriundos da pesquisa, desenvolvimento e produção de bem, informação ou serviço de Defesa, possam ter aplicação comercial civil, estendendo as aquisições do Estado para além das Forças Armadas, fortalecendo a Base Industrial de Defesa. Como exemplo, uma empresa que produz trajes balísticos, cujas características especiais de fibras e tecidos garantem proteção contra ataques armados, possa transbordar parte dessa tecnologia para produção de trajes funcionais de proteção individual (EPE) para construção civil, ou serviços elétricos, etc., a gozarem de preferência de aquisição por outros órgãos do setor público, ou de empresas vencedoras de licitações por estes abertas.
 
Ainda como tarefa da SEPROD, junto com a captação de recursos para o financiamento e a organização da Base Industrial, devemos valorizar a importância de avançarmos no sistema de estímulos à exportação de equipamentos e sistemas de Defesa. Sabemos que esta é outra face de sustentabilidade de nossa Base Industrial: o mercado externo.
 
Já concluindo seu discurso, a Secretária enalteceu a importância das exportações dos produtos de Defesa de origem brasileira.
 
Do discurso à prática, sabe-se há longo caminho. Mas a acertividade das proposições, e a franqueza do reconhecimento dos problemas a serem enfrentados, apresentados por Perpétua, causaram na comunidade de Defesa muito boa impressão.
 
A nós, pelo bem do Brasil, nos cabe desejar boa sorte à SEPROD e seu novo comando.
 

 

 


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