AMRJ – STJ nega concessão de anistia a grevistas demitidos em 85

Bárbara Mengardo

Site Jota

publicado 04 Junho 2017

Uma decisão do Ministério da Justiça que não homologou a anistia de 82 pessoas foi mantida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). De acordo com as partes do processo, foi a única vez que o ministro da Justiça não confirmou uma decisão da Comissão de Anistia.

O entendimento foi proferido pela 1ª Seção do tribunal, responsável por pacificar a jurisprudência das turmas que julgam direito público no STJ. Por oito votos a um, os ministros confirmaram decisão do ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que considerou que, por serem ex-trabalhadores do Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro, as partes não teriam direito à anistia.

No STJ, a maioria dos ministros entendeu que o Arsenal pode ser considerado um órgão militar. Seus ex-funcionários, dessa forma, não teriam direito a anistia.

Demitidos e perseguidos

A questão foi discutida nos mandados de segurança 20.367 e 20.361. Os ex- trabalhadores do Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro foram demitidos após iniciarem uma greve em 1985.

De acordo com Moisés da Fonseca dos Santos, que participou do movimento grevista e foi demitido, os trabalhadores enfrentavam um tratamento muito rígido de seus superiores, sendo submetidos a violência física, inclusive. Paralelamente a isso, viam a desvalorização de seus salários.

“Nosso salário descia cada vez mais, e não tínhamos como negociar”, contou Santos ao JOTA, após o julgamento do STJ. 

 

Os funcionários optaram por iniciar a greve e foram demitidos em seguida por justa causa. A partir de então, segundo Fonseca dos Santos, sofreram perseguição política, e tiveram dificuldade em encontrar novos empregos. “Nunca mais conseguimos um salário decente”, disse.

Em 2004, os autores da ação no STJ acionaram a Comissão de Anistia, entidade responsável por julgar os requerimentos de reparação econômica pelas violações aos direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988. O órgão reconheceu que houve perseguição política aos trabalhadores.

De acordo com a advogada Camila Gomes, do Cezar Britto e Advogados Associados, que atua em um dos processos, a comissão chegou a realizar sessão pública anistiando os trabalhadores. “Foi feito um pedido de desculpas”, lembrou a advogada.

Apesar da recomendação da comissão, o Ministério da Justiça não homologou a anistia. Em 2013, José Eduardo Cardozo, então ministro da Justiça, se pautou no artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias(ADCT) para negar o benefício a qualquer pessoa que trabalhasse no Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro.

Pelo parágrafo 5º do dispositivo, pode ser concedida anistia aos “servidores públicos civis e aos empregados em todos os níveis de governo ou em suas fundações, empresas públicas ou empresas mistas sob controle estatal, exceto nos Ministérios militares”. Para Cardozo, o quadro do Arsenal da Marinha entraria na exceção.

Os autores da ação no STJ, porém, questionam o posicionamento. Fonseca dos Santos, que era celetista e não militar, diz que realizava reparos e a construção de navios de guerra.

Órgão militar

No STJ os processos foram relatados pelo ministro Mauro Campbell Marques, que entendeu que o Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro era um órgão militar. Segundo ele, a entidade era “estabelecimento industrial destinado aos serviços de construção e reparos de navios e embarcações da Marinha do Brasil (MB), subordinado militar, técnica e administrativamente à Marinha do Brasil”.

Pela peculiaridade, segundo o ministro, os autores não teria direito à anistia. “Se tratando o Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro – AMRJ de mero órgão militar, subordinado ao Ministério da Marinha e integrante da Administração Direta, não restam dúvidas de que os impetrantes não fazem jus à anistia política pretendida, carecendo, assim, de direito líquido e certo”, diz Marques em seu voto.

Ficou vencido o ministro Napoleão Nunes Maia Filho.

Para Camila, a decisão do STJ representa “um retrocesso no direito à reparação”. “Cria-se uma categoria de pessoas que foram perseguidas, mas que não tem direito à reparação”, afirma.

O advogado João Bosco Filho, do escritório que leva seu nome e que defende os trabalhadores em um dos processos em tramitação no STJ, afirmou que recorrerá da decisão ao Supremo Tribunal Federal (STF).

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