Notas Estratégicas EB – Leopard 2A6/ Marder 1A5 – A enigmática ou escabrosa oferta alemã

Após anos de estudos da parte técnica e da operacional do Exército Brasileiro na implantação do Programa Forças Blindadas surge uma oferta não solicitada como a alemã

Nelson Düring
Editor-Chefe DefesaNet

O portal Tecnologia & Defesa, com matéria do analista Paulo Bastos, publicou na última sexta-feira(07NOV2025),  um artigo informando que o Exército Brasileiro analisa com interesse a oferta não solicitada do Governo Alemão para o fornecimento de 65 unidades de tanques Carros de Combate Leopard 2A6 e 78 Viaturas de Combate de Infantaria Marder 1A5.

O simples fato dessa proposta ter sido levada em consideração causa preocupação, pois é uma clara intenção de sabotar o projeto Forças Blindadas, que vai definir o emprego operacional da Força Terrestre no Século XXI.

Leopard 2A6 em operação pelo Exército Alemão

Os Leopard 2A6 são modelos básicos produzidos durante os anos da Guerra Fria modernizados ao padrão A4 e depois ao A6. Os agora oferecidos ao Brasil estão há 20 anos fora de uso pelo Exército Alemão. Inicialmente produzidos na década de 80, essas células de 40 anos serviram como gap filler entre as células 2A4 e o 2A7, os 2A6 tem dificuldade em atualizações ou modernizações, além de não terem mais peças sobressalentes.  

Cerca de 18 veículos do mesmo lote foram entregues à Ucrânia onde tiveram uma experiência operacional decepcionante, principalmente pela falta de suporte logístico. Sua utilização no Brasil seria ainda pior já que a Ucrânia é prioritária em comparação ao Brasil além da tradicional dificuldade do planejamento logístico do Exército Brasileiro.

O preço de 15 milhões de euros por cada célula do Leopard 2A6 gera uma preocupação adicional, já que é o mesmo preço de um CV90, Tulpar, Ascod ou Lynx novos equipados com canhão de 120mm.  O valor do Leopard 2A6 nas atuais circunstâncias não deveria estar neste nível ou um mais exaltado diria que seria 500 mil euros, ou seu peso em aço derretido. 

Carros de combate Leopard 1A5BR da 5ª DE em operação Foto CMS

Seu peso de 62 toneladas obrigaria um investimento bilionário na construção de novas pontes no sul do Brasil, muitas delas derrubadas ou fragilizadas devido as enchentes. O Exército vai precisar fazer investimentos adicionais em pátios, garagens, pranchas e cavalos mecânicos. Causa surpresa que isso vai contra todos os requisitos e estudos realizados na última década. Além disso, o terreno do Conesul não é favorável ao emprego de Main Battle Tanks (MBT) pesados, por isso os argentinos optaram pelo desenvolvimento de uma família leve, no conceito Medium Main Battle Tank (MMBT). A munição do Leopard 2A6 (120mm/55cal) não possui compatibilidade com a do Centauro 2 BR (120mm/45cal) o que exigiria uma linha logística complementar, aumentando os custos. Ademais, a comunalidade da família Leopard só existe no nome, já que são veículos diferentes, exigindo a encomenda de um novo kit ferramental, custando dezenas de milhões de euros. Até os próprios veículos de engenharia e socorro deveriam ser trocados. 

Por esse valor seria mais fácil comprar um MBT turco Altay ou o sul coreano K2 Black Panther novos de fábrica, criando empregos e desenvolvendo tecnologia em solo brasileiro, mantendo um MBT puro sangue atualizado e pronto para operar pelas próximas 5 décadas.

Marder 1A5 en operação no Exército alemão

Com relação ao VBCI Marder 1A5, a situação é ainda pior. O veículo nunca teve uma vida operacional satisfatória no Exército Alemão, utiliza uma linha de manutenção completamente diferente do Leopard. Nos anos 70 a Argentina iniciou desenvolvimento do TAM, Tanque Argentino Mediano, baseado no Marder o que gerou uma família com: VBCI, Socorro e Obuseiro. Estaria o Brasil quase 60 anos depois seguindo a estratégia escolhida pela Argentina, querendo o mesmo veículo? Sobre o valor do Marder, a oferta não poderia ser superior a 150 mil euros, ao invés de 10 milhões de euros propostos por cada um. Algo está errado nesta oferta. As contas não batem com a realidade. O valor é igual a um IFV(Infantry Fighting Vehicle) novo. Causa surpresa que essa proposta tenha sido avaliada e tido parecer positivo por parte de generais e assessores da área.

O projeto Forças Blindadas nasceu para modernizar uma das mais importantes áreas de qualquer exército, necessária a manobra, o poder de choque e ocupação do terreno adversário. As Força Blindadas são como fragatas e aviões de caça, simbolizam o poder dissuasório e de combate de uma força militar. A guerra contemporânea exige equipamentos modernos, o emprego de tecnologia de ponta, e o sempre necessário suporte logístico integrado.

O fato dessa proposta ter assumido proporções midiáticas e ter corrido o mundo mostra o quão absurda ela é, já que representa uma tentativa descarada de sabotagem dos projetos iniciados, visando uma completa dependência do Brasil, não permitindo que o Exército tenha independência e capacidade operacional plena.

Depois da aquisição do Centauro 2 BR, o Exército deu um passo em direção ao futuro, assumiu uma posição de vanguarda tecnológica e poder de fogo únicos abaixo do Rio Grande. Seguir em projetos na área de blindados que sejam diferentes ou inferiores a essa escolha, que foi resultado de anos de estudos e avaliações.



Se existe o interesse de um Carro de Combate “raiz”, que ele seja adquirido novo. A título de informação, essa oferta custa a metade de um Leopard 2A8 novo e o mesmo preço de um K2 Black Panther. Ou seja, é irrealista e levanta sérias dúvidas e preocupações. Porque agora? A quem interessa?

Antes de pensar em adquirir novos meios, as Forças Armadas precisam honrar com os compromissos assumidos, para não perderem seu prestígio frente a governos e empresas estrangeiras. 

Como no mundo civil, ofertas tentadoras de última hora sempre escondem grandes prejuízos.

O brasileiro é conhecido por ter memória curta. Vale lembrar o embargo da fita de metralhadora do Leopard 1A5BR, do não fornecimento do chassi Mercedes-Benz  para o Astros II da AVIBRAS (hoje usando os Tatra); de lançadores de granadas fumígenas a munições variadas. Até quando vamos aceitar os sucessivos embargos da BAFA? Precisamos de autonomia e confiança nas nossas parcerias. No caso do boicote da Mercedes-Benz pavimentou o caminho para os franceses com o submarino Scorpène contra os até então imbatíveis submarinos alemães.  

Por trás dessas propostas, um ponto relevante é porque tais discussões acontecem nesse momento. Qualquer mudança no rumo do projeto Forças Blindadas, da forma como ele foi concebido, só interessa aos lobbies que pululam em Brasília, como o da indústria de defesa chinesa e quem a defende.

Diferente de um Carro de Combate pesado, o que precisamos nas nossas operações é o efeito surpresa. O conceito de Brigada Mecanizada criado pelo Exército é a única força capaz de surpreender o inimigo. A melhor manobra de blindados feita na guerra da Ucrânia, quando os ucranianos invadiram o território russo em Kursk acompanhou a doutrina desenvolvida pelo Brasil. Mobilidade tática, velocidade, poder de fogo e precisão, aliado a inteligência, vigilância, reconhecimento e aquisição de alvos proporcionada pelos drones. Esse é o conjunto de ferramentas necessárias ao sucesso no combate terrestre da atualidade.

Centauro 2BR em testes no Sul. Foto CMS

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