Improviso e politicagem eleitoreira

 

CLAUDIO J. D. SALES

A forma truculenta e politizada adotada para implementar a renovação de concessões de energia e a destruição de valor provocada nas empresas do setor elétrico – várias delas listadas em Bolsa – deixaram um sabor amargo na boca de acionistas de companhias como a Eletrobrás e dúvidas gigantes na cabeça dos que pensam em investir no setor elétrico ou em outros setores de infraestrutura.

Aprisionado pelo discurso eleitoral de redução da tarifa de energia, o governo busca de qualquer forma impedir que a anunciada redução de tarifas seja diluída pela elevação dos custos ocasionada pelo intenso despacho térmico determinado pelo Comitê de Monitoramento do Sistema Elétrico para compensar a desconfortável situação dos reservatórios das hidrelétricas.

O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) tem posto em funcionamento todo o parque termoelétrico, mesmo de termoelétricas que não deveriam ser acionadas com base nos modelos computacionais que balizam a operação. Este mecanismo – chamado de "despacho fora da ordem de mérito econômico" – tem imposto um custo bilionário, que é consolidado no encargo tarifário ESS-SE, o Encargo de Serviço de Sistema, subitem "Segurança Energética".

O intenso despacho termoelétrico fora da ordem de mérito – que pode superar os R$ 6 bilhões em 2013 – tem provocado forte aumento de custos do ESS-SE, encargo que tinha outra ordem de grandeza (entre 2003 e 2007, o ESS médio foi de R$ 150 milhões). Por causa desse altíssimo sobrecusto, há intensa mobilização de alguns grupos de pressão para "socializar" essa despesa.

Já se temia que o governo pudesse apelar a artimanhas "criativas", como vem adotando na área macroeconômica. E o temor tornou-se realidade com a publicação da Resolução n.º 3 do Conselho Nacional de Política Energética, que promove profundas alterações nas regras que regem o mercado de energia.

O custo do acionamento termoelétrico era rateado entre os consumidores, que são os que se beneficiam da segurança energética proporcionada por tal acionamento. No entanto, preocupado com o impacto eleitoral da elevação da conta de luz por causa do "despacho fora da ordem de mérito", o governo impôs, sem nenhuma consulta ou audiência pública, que tais custos passem a ser arcados também pelos geradores de energia.

A regra não faz o menor sentido, inclusive porque determina que um gerador deva pagar pelo custo de outro gerador para atender ao consumo de outro agente. Além disso, por que os custos da comercialização de energia de um determinado mês devem ser rateados com base na comercialização de energia nos 12 meses anteriores? O pior é que as regras promulgadas agora já se aplicam às transações que serão liquidadas neste mês, referentes ao mês de janeiro.

A resolução também prevê a implantação de profundas alterações na metodologia utilizada para definição de preços do mercado de energia, o chamado "PLD".

A intempestividade dessas medidas pega os agentes no contrapé, pois eles já fizeram suas programações para o ano corrente e já comercializaram grandes volumes de energia sob as regras então estabelecidas.

Essa socialização de despesas feita de forma arbitrária e a posteriori se torna ainda mais chocante quando se considera que grande parte dos desequilíbrios de oferta de energia atuais foi ocasionada por improvisos governamentais, entre os quais a exposição involuntária das distribuidoras em razão da não realização do Leilão A-1 de 2012, o que as impediu de contratar energia para atendimento de seus mercados.

A leitura mais simples dessa medida é a seguinte: o governo está buscando no caixa dos geradores de energia um recurso para diminuir o impacto eleitoral negativo do aumento real da energia. Isso reforça a percepção de que o Brasil é um país onde o uso político-eleitoral predomina sobre contratos e onde vencem os que têm lobbies mais poderosos em Brasília.

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