Petróleo – O fim que custa a chegar.

Nota DefesaNet

Interesante artigo do WSJ. A busca por fontes de petróleo pautou a  geopolítica mundial pós 2ª Guerra Mundial e vem até aos nossos dias.

O Editor

Russell Gold
The Wall Street Journal
Colaborou Luis Garcia


Há décadas, ela vem inspirando cenários apocalípticos na imaginação das pessoas: a produção mundial de petróleo chega ao máximo e então começa inexoravelmente a declinar, fazendo os preços dispararem e forçando países a impor racionamentos e lutar por reservas cada vez mais escassas.

A produção de petróleo dos Estados Unidos, por exemplo, chegou mesmo a um pico nos anos 70 e despencou pelas décadas seguintes. Mas então aconteceu algo que a teoria não previu: A produção começou a subir novamente em 2009 e não parou mais, graças ao avanço das tecnologias de exploração.

Para os adeptos do pico do petróleo, trata-se apenas de uma alta passageira antes do declínio inevitável. Um grande número de especialistas da indústria, porém, argumenta que a teoria aborda a situação da forma errada. As verdadeiras restrições que enfrentamos são tecnológicas e econômicas, dizem eles. Estamos limitados não pela quantidade de petróleo no subsolo, mas pela nossa capacidade de explorar novas fontes e pelo quanto estamos dispostos a pagar.

“A tecnologia avança tão rápido hoje que qualquer eventual escassez de recursos não será mais que um pequeno obstáculo”, diz Phil Verleger, economista do setor de petróleo.

A ocorrência ou não do pico do petróleo é mais que um acalorado debate intelectual. A questão — e como nós a consideramos — também tem possíveis efeitos significativos para governos, petrolíferas e pessoas comuns em todo o mundo, já que todos seriam afetados por uma disparada nos preços e pela escassez.

 

Os defensores do pico do petróleo argumentam que, em vez de gastar dinheiro com novos campos, devemos conservar o petróleo que temos e investir em fontes alternativas de energia como preparação para uma queda na oferta. Muitos dos oponentes da teoria concordam que não devemos depender do petróleo para sempre, mas acreditam que é mais inteligente investir em tecnologias para continuar expandindo a oferta. Quando isso se tornar caro demais, eles estão confiantes de que seremos capazes de encontrar uma alternativa economicamente viável.

O “pico do petróleo” foi mais amplamente popularizado por M. King Hubbert, um geólogo brilhante — e, segundo alguns, egocêntrico — que trabalhou anos para a Shell Oil. Num ensaio publicado em 1956, ele previu que a produção de petróleo nos EUA iria atingir um máximo, provavelmente no início dos anos 70, e depois cair, de modo semelhante a uma curva gaussiana.

Essa teoria veio a se chamar pico de Hubbert e, mais tarde, pico do petróleo. A ideia ganhou grande popularidade quando a produção dos EUA chegou mesmo a um pico no começo da década de 70 e se afirmou numa época em que o país passou a esperar pelo pior. Carros formavam longas filas nos postos e os EUA se sentiam sob o jugo da Opep. Estudiosos como Paul Ehrlich ficaram famosos com previsões catastróficas sobre superpopulação e esgotamento dos recursos naturais.

A disseminação da teoria ajudou a justificar investimentos crescentes em energias alternativas e influenciou o pensamento de especialistas sobre o futuro da energia. Alguns anos atrás, o interesse por ela reviveu depois que os preços do petróleo subiram e se mantiveram altos.

“Bem-vindos ao mundo além do pico de Hubbert”, escreveu Kenneth Deffeyes, um partidário do pico do petróleo, em 2008.

Mas aí a produção se desviou da curva gaussiana. Em 2008, os EUA produziram uma média de cinco milhões de barris por dia. Em 2009, a produção começou a subir — a princípio devagar e, depois, rapidamente. Ela está subindo até hoje. No primeiro semestre, ficou numa média de 8,3 milhões de barris diários.

O que aconteceu? Uma inovação tecnológica que a teoria do pico não previu. As empresas de petróleo combinaram as técnicas do chamado fraturamento hidráulico (ou “fracking”) e da perfuração horizontal para extrair petróleo de formações supercompactas na América do Norte. A indústria descobriu que bombear uma mistura de água, químicos e areia em formações de xisto pode abrir milhares de fraturas na rocha, cada uma formando uma minúscula via de escoamento para as moléculas de petróleo chegarem até o poço.

Agora, embora analistas digam que seja difícil replicar as condições — geológicas, econômicas, regulatórias e de infraestrutura — que propiciaram o boom do xisto nos EUA, outros países estão começando a usar as mesmas técnicas. Na Argentina, por exemplo, a estatal YPF SA já fez parcerias com a malasiana Petroliam Nasional Bhd., ou Petronas, e a americana Chevron Corp. para explorar sua imensa formação de xisto de Vaca Muerta.

O boom do xisto fortaleceu os argumentos que a teoria do pico subestima o poder da inovação. Muitos especialistas em petróleo dizem que o setor costuma encontrar novas fontes justamente quando as perspectivas parecem desoladoras.

Um século atrás, as petrolíferas descobriram novos campos gigantes no Texas e na Califórnia, justo quando se agravavam os temores de que a produção tinha chegado ao auge. Quando a produção nos EUA começou a declinar, outras regiões elevaram as suas: Mar do Norte, Nigéria e Arábia Saudita. Inovações técnicas, como a sísmica marítima, que usa ondas sonoras para localizar depósitos através de milhares de quilômetros de água e rocha, provocaram um surto de perfuração em águas profundas.

De uma forma mais geral, argumentam os opositores do pico do petróleo, a teoria encara o problema de um ponto de vista errado: priorizando as reservas físicas em vez de nossa capacidade de explorá-las. “Tem que haver um limite finito” para o petróleo e o gás, diz George King, consultor global de tecnologia da Apache Corp. Mas a restrição de quanto petróleo pode ser produzido não é geológica, diz ele. “Nos deparamos acima de tudo com limites técnicos e econômicos.”

Esse argumento é bem ilustrado na América Latina, onde países com grandes reservas ainda inexploradas estão vendo sua produção recuar por falta de investimentos e capacidade tecnológica. A Venezuela, às voltas com uma crise econômica, produziu uma média diária de 2,5 milhões de barris no ano passado, 28% a menos que em 2000, segundo dados da Administração de Informação sobre Energia (EIA, na sigla em inglês).

Após quase 80 anos de monopólio estatal, o México está abrindo seu setor de petróleo para a concorrência privada na esperança de atrair bilhões de dólares em investimentos e reverter o declínio de sua produção, que recuou de um pico de 3,8 milhões de barris diários em 2004 para 2,9 milhões de barris no ano passado, de acordo com a EIA.

No Brasil, a produção de petróleo chegou a cair em 2012 e 2013, mas agora deve crescer por um bom período, segundo a Agência Nacional do Petróleo. Em uma palestra na Rio Oil & Gas 2014, em setembro, a diretora-geral da ANP, Magda Chambriard, disse que a produção do país, hoje em 2,2 milhões de barris por dia, vai chegar ao dobro desse volume entre 2020 e 2022.

É verdade que mesmo os que negam o pico do petróleo não creem que devemos abraçar totalmente a ideia de um petróleo eterno, a ponto de não tentar acelerar uma transição para alternativas em antecipação a uma escassez da oferta. Afinal, políticas de energia equivocadas podem ter consequências funestas. Nos anos 70, por exemplo, os EUA acreditaram que ia faltar gás natural e o Congresso proibiu a construção de novas usinas a gás. Em vez disso, foram construídas muitas usinas a carvão, que deixaram um legado de poluição em algumas cidades. Isso sem falar que, nos últimos anos, os EUA descobriram novas e volumosas reservas de gás natural.

Embora não creiam que a oferta vai minguar tão cedo, os oponentes do pico do petróleo reconhecem que os limites econômicos continuam pesando. Quando a indústria supera um obstáculo e amplia a produção de petróleo, os custos geralmente sobem. Essa alta abre uma porta para fontes melhores e mais baratas de energia alternativa, que acabarão por substituir o petróleo.

Assim, vai chegar uma hora que os custos de extrair cada vez mais petróleo vão ficar tão altos que os compradores não vão mais poder — ou querer — pagar pelo produto.

Essa questão foi examinada por Morris Adelman, um falecido economista do setor. “Nenhum mineral, incluindo o petróleo, vai se exaurir um dia. Se e quando o custo de encontrar e extrair [um mineral] subir acima do preço que os consumidores estão dispostos a pagar, a indústria começará a desaparecer”, escreveu ele no livro “O gênio fora da garrafa: petróleo mundial desde 1970” (em tradução livre), publicado em 1995. Adelman, ex-professor emérito de economia do Instituto Tecnológico de Massachusetts, morreu em maio, aos 96 anos.

Algumas questões econômicas já estão promovendo mudanças. Apesar da abundância que o fracking está gerando, os preços globais do petróleo continuam altos. Isso tem encorajado o desenvolvimento de fontes alternativas de energia e investimentos para elevar a eficiência dos combustíveis. O gás natural há anos toma participação de mercado do petróleo. Décadas atrás, a calefação nos EUA era à base de óleo; hoje, usa-se o gás natural. E, tal como carros elétricos, o gás está penetrando no setor de transporte, sendo usado em caminhões e trens.

Além do mais, as mudanças climáticas têm alterado os cálculos. Mais defensores de energias alternativas estão clamando por combustíveis com baixos níveis de carbono para reduzir as emissões de dióxido. Eles argumentam que a possibilidade de faltar petróleo não é a única razão para diminuir o seu uso; eles receiam, inclusive, que a expansão da oferta seja perigosa, pois prejudica as iniciativas para combater a ameaça de longo prazo das mudanças climáticas.

“Haverá o pico do petróleo, mas será um pico de consumo”, diz Michael Shellenberger, presidente do Instituto Breakthrough, um centro de estudos de energia na Califórnia. “O que queremos é mudar para fontes melhores, mais baratas e mais limpas.”

Shellenberger suspeita que o domínio do petróleo no transporte seja mais tênue que a maioria imagina. Quando algo melhor aparecer, o petróleo estará com os dias contados, diz ele. “Vamos deixar um monte de petróleo no solo, assim como estamos deixando um monte de carvão”.

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Energia e Defesa  2000 Prof Fernando Sampaio Link

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