Sergei Lavrov: BRICS, parceria estratégica

Sergei Lavrov

Ministro das Relações Exteriores da Federação da Rússia

 

Entre amanhã (13) e quinta-feira (14), em Brasília, será realizada a 11ª Cúpula dos BRICS. Nas vésperas desse evento crucial para o nosso agrupamento, gostaria de compartilhar a visão russa sobre a parceria estratégica no âmbito do “quinteto”.

A atual presidência do Brasil nos BRICS conseguiu avançar significativamente em todas as principais direções de cooperação — política, econômica e humanitária. A Rússia apoia os amigos brasileiros na sua aspiração de fomentar impacto prático da interação multifacetada em nome da prosperidade dos nossos Estados e povos.

 

Saudamos a declaração feita pelo presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, em Osaka, sobre a importância de fortalecimento do diálogo dentro dos BRICS, o que permitirá aos países do “quinteto” usufruir da melhor maneira dos benefícios das mudanças globais em curso.

Hoje o alinhamento dos esforços dos nossos países adquire uma importância especial. A política global continua a vacilar. Várias regiões do planeta mantêm um potencial de conflito significativo. A arquitetura do controle de armas está sendo deliberadamente sacudida — a retirada unilateral dos EUA do Tratado sobre a Eliminação dos Mísseis de Alcance Intermediário e de Menor Alcance foi um passo extremamente perigoso.

Desequilíbrios estruturais na economia mundial ainda não foram ultrapassados. Práticas de concorrência desleal, como sanções econômicas unilaterais, protecionismo, guerras comerciais e flagrante abuso do status do dólar americano como moeda de reserva mundial representam uma séria ameaça ao crescimento econômico global. A comunidade internacional ainda tem que encontrar respostas eficientes a uma série de desafios perigosos da atualidade  — de terrorismo a mudanças climáticas.

Chegou ao ponto de tentarem substituir o sistema do direito internacional, estabelecido depois da Segunda Guerra Mundial com a Carta das Nações Unidas como a sua fonte principal, pela chamada “ordem baseada nas regras”, onde essas “regras” estão sendo inventadas secretamente, em “grupos pequenos” — e, depois, dependendo da conjuntura política, são impostas a todos os outros.

A multipolaridade não é receita para concorrência ou caos nas relações internacionais, como afirmam alguns dos nossos críticos. Pelo contrário, é a única ordem afinada às realidades atuais que deve promover o desenvolvimento compreensivo de todos os Estados — tanto grandes como pequenos— e a ampliação da cooperação mutuamente vantajosa entre eles na base de interesses compartilhados.

A Rússia, tal como outros países dos BRICS, rejeita imposições e pressão, chantagem e ameaças, tampouco o uso da força sem autorização do Conselho de Segurança da ONU. Ao contrário, propõe seguir pelo caminho do diálogo de respeito mútuo, destinado ao consenso que prevê a consideração dos interesses de todos os atores das relações interestatais.

Estamos convencidos de que quaisquer acordos sobre os assuntos mais importantes da agenda internacional devem ser atingidos com a participação mais ampla possível e igualitária de todas as partes interessadas e baseados nas normas legais universalmente reconhecidas. Os países dos BRICS estão firmemente empenhados na democratização da vida internacional e no seu desenvolvimento sob os princípios consagrados na Carta das Nações Unidas, de respeito pela diversidade cultural e civilizacional do mundo e do direito dos povos de decidirem os seus próprios destinos.

O importante é que as nossas abordagens aos principais assuntos globais e regionais coincidem ou são bastante semelhantes. Progressivamente, manifestamo-nos a favor de solução pacífica e político-diplomática de crises e conflitos em várias regiões do mundo. Mantemos um diálogo compreensivo em tais áreas, como combate ao terrorismo, segurança internacional da informação e combate ao crime organizado e à corrupção.

Pode-se afirmar com certeza que, tendo entrado na segunda década de seu funcionamento, o “quinteto”, uma das principais bases da nova ordem mundial multipolar e mais justa que está se formando, mantém um importante papel estabilizador nos assuntos globais. O agrupamento responde por quase um terço do PIB global (por paridade do poder de compra). No ano passado superou o G7 em termos deste indicador.

Os BRICS tornam-se centro de gravidade para muitas economias emergentes. São atraídas pelo fato de o agrupamento defender os valores de multipolaridade, apoiar a promoção de comércio internacional de caráter não discriminatório, aberto, livre e inclusivo, rejeitar a adoção de restrições econômicas unilaterais e medidas protecionistas em relações econômicas exteriores.

A declaração adotada por ocasião da reunião dos líderes dos BRICS às margens da cúpula do G20, em Osaka, registra, de forma clara, a intenção dos cinco países em defender os alicerces do sistema multilateral de comércio, baseado na igualdade de direitos, e frisa o papel da OMC (Organização Mundial do Comércio) na promoção da reforma do FMI.

Funciona com eficiência o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) criado pelos países dos Brics, um dos promissores institutos multilaterais de desenvolvimento. Apenas durante este ano o Conselho de Administração do NDB aprovou 12 novos projetos de investimento nos países do agrupamento. No total, desde o início das operações do banco, em 2015, foram aprovados 42 projetos de investimento com valores acima de US$ 11 bilhões.

O trabalho de consolidação do Arranjo Contingente de Reservas dos BRICS continua. O seu capital total, de US$ 100 bilhões, tem por objetivo garantir a estabilidade financeira do “quinteto” no caso de situações de crise.

Apreciamos altamente os esforços da Presidência brasileira para implementar as iniciativas dos cinco países nas áreas de economia, ciência, inovações e saúde. Com satisfação, constatamos o aumento sistemático da densidade dos intercâmbios humanitários — ganham força as cooperações nas áreas de cultura, educação, esporte e política de juventude, desenvolvem-se contatos entre pessoas.

Em 2020, a Rússia vai assumir o “leme” dos BRICS. O nosso objetivo é garantir a continuidade, uma transição harmoniosa da presidência. Continuaremos a política de aprofundamento progressivo e abrangente da parceria estratégica dos Estados do agrupamento.

Certamente estamos interessados em expandir a cooperação econômico-financeira dos países participantes, aumentar a eficiência da interação na esfera industrial e a cooperação prática no desenvolvimento e na implementação de novos projetos conjuntos nas áreas de energia, telecomunicações e tecnologias de ponta. As nossas prioridades incluem o fortalecimento da coordenação da política externa nas principais plataformas multilaterais — antes de mais nada, na ONU, que celebrará seu 75º aniversário no próximo ano.

Estou certo de que, no oceano tempestuoso da política mundial, o “navio” dos BRICS continuará a seguir o rumo escolhido e a contribuir significativamente para a manutenção da estabilidade internacional e do crescimento sustentável da economia global. A próxima cúpula dos BRICS, em Brasília, deve se tornar mais um marco significativo no caminho de intensificação da cooperação entre os cinco países, elevando-a a novos patamares.

Concluindo, gostaria de desejar paz, saúde, bem-estar e tudo de bom aos leitores e a todos os cidadãos dos países dos BRICS.

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