BR-PY – Brasil e Paraguai vão renegociar energia de Itaipu quando pandemia permitir

Felipe Frazão
Portal Estadão
17 de março de 2021


BRASÍLIA – Os chanceleres do Brasil, Ernesto Araújo, e do Paraguai, Euclides Acevedo, postergaram nesta quarta-feira, dia 17, o início da renegociação do Anexo C do Tratado de Itaipu, que vence em 2023 e trata da comercialização e dos preços da energia gerada pela usina binacional. Após reunião bilateral entre os países em Brasília, os ministros das Relações Exteriores disseram que pretendem começar as discussões “em breve”, quando a pandemia da covid-19 permitir. Eles não fixaram data.

“Reiteramos por parte do Brasil que estamos prontos a começar discussões sobre a revisão do anexo C do Tratado de Itaipu no mais breve prazo, tão logo as circunstâncias da pandemia minimamente o permitam”, disse o ministro Araújo. “Isso é compromisso nosso de iniciar esse diálogo no mais breve prazo.”

“Apesar da pandemia, vamos iniciar as conversas para a revisão, a renegociação e a utilização de Itaipu para outras obras na região, obras hidroelétricas, abordar a hidrovia, o corredor bioceânico, para que a integração não seja uma formulação teórica, mas uma realidade prática, economicamente previsível, politicamente estupenda e diplomaticamente fascinante.”
O chanceler paraguaio disse que as conversas sobre o uso da energia gerada em Itaipu devem respeitar “direitos legítimos de dois sócios-irmãos e paritários”.

Assinado em 1973 pelos governos militares, o Anexo C prevê que cada país tem direito à metade da energia gerada pela usina e venda ao outro o que não utilizar. O Paraguai defende, por exemplo, que o excedente possa ser comercializado com outros países e argumenta que o Brasil paga barato pela energia a mais que compra. O anexo será revisto porque a dívida de construção da usina estará quitada.

O assunto é tratado como “causa patriótica“ no Paraguai e já opôs os dois governos. Em 2019, os países assinaram um acordo secreto estabelecendo a compra da energia até 2022. Na prática, os termos acordados elevariam custos à Ande, estatal de energia paraguaia, em cerca de US$ 200 milhões. Por isso, levou a um pedido de impeachment do então presidente paraguaio Mario Abdo Benítez.

A negociação com a Eletrobrás foi refeita, sem elevação de custos tarifários no ano passado aos paraguaios, que vêm aumentando o consumo mais do que os brasileiros. Até então, os países estabeleciam a quantidade de energia prevista que necessitam ao longo do ano – essa cota de energia garantida é mais cara. Caso precisem de mais do que o previsto, a energia fornecida por Itaipu pode ser comprada de forma excedente, sendo mais barata.

<header class=”graphic-header” role=”banner”>

Disputa por energia

Brasil e Paraguai têm diferentes preços para energia de Itaipu

Aceno

Acevedo disse que encontraria ainda nesta quarta-feira o presidente Jair Bolsonaro para levar uma saudação do “amigo” Mario Abdo Benítez. O presidente paraguaio, também de direita, busca respaldo político internacional e enfrenta questionamentos e um pedido de impeachment apresentado pela oposição nesta quarta-feira ao Congresso. A denúncia foi apresentada contra o presidente e seu vice, Hugo Velázquez, acusando os dois de inépcia e má gestão durante a pandemia. Protestos com choques violentos em Assunção já levaram à queda de ministros.

O chanceler Araújo disse que os valores dos dois governos unem o Brasil ao Paraguai e defendeu a vigência de instituições democráticas e as liberdades fundamentais. “A democracia é fundamental para nosso processo de integração e de inserção no mundo”, afirmou o ministro.

Vacinas

Num gesto político, Araújo prometeu que o governo brasileiro dará prioridade ao Paraguai quando puder começar a distribuir vacinas produzidas no País. A falta de imunizantes e o recrudescimento da pandemia, com hospitais superlotados, desestabilizaram politicamente o governo de Abdo Benítez. Há marchas cobrando a queda do governo.

Diplomatas brasileiros ouvidos pelo Estadão falaram em boa vontade com o país vizinho, mas disseram, reservadamente, que a situação de escassez interna de vacinas impede qualquer gesto como uma doação concreta ao Paraguai no momento. “Assim que estivermos prontos a começar a cooperar internacionalmente no provimento de vacinas o Paraguai será nossa prioridade número um”, disse Araújo, mais uma vez sem dar prazos, nem fixar quantidades.

A reunião entre os ministros terminou sem que o Brasil anunciasse doação efetiva de vacinas ao Paraguai. Do lado paraguaio, havia expectativa de receber doses, como já havia pedido o governo Abdo Benítez. O paraguaio defendeu que haja cooperação dentro das possibilidades e pediu a troca de informações. “É conhecida a posição do Paraguai sobre a desigualdade na distribuição das vacinas. Vamos encarar isso conjuntamente, para que esse direito universal alcance a todos nós”, disse o chanceler Acevedo.

Mercosul

O paraguaio defendeu dar uma “nova velocidade” ao Mercosul, em linha com o discurso do governo brasileiro, que busca flexibilizar regras e dar mais liberdade a países-membros para negociar acordos bilaterais com outros blocos e nações individualmente, além de reduzir a tarifa externa comum. Araújo conversou sobre o tema com o chanceler argentino, Felipe Solá, nesta terça-feira, dia 16.

A impressão de diplomatas brasileiros é que a Argentina se isolou na resistência à abertura. O tema deverá ser discutido na próxima reunião de cúpula que marca os 30 anos do bloco, no dia 26. “Essa transfusão de sangue ao Mercosul é através de intercâmbios, planos comuns e, de outro lado, a liberdade de exercermos nossos direitos bilaterais, sempre à serviço da região”, disse Acevedo.

Compartilhar:

Leia também

Inscreva-se na nossa newsletter