Aviação faz campanha para descriminalizar acidentes

Andy Pasztor e Daniel Michaels

Especialistas em segurança aérea internacional estão intensificando uma campanha contra o tratamento criminal de acidentes aéreos, depois que a justiça francesa ameaçou processar a Airbus e a Air France pelo desastre fatal no voo 447, em 2009.

A decisão do magistrado deixa ambas as companhias, e potencialmente alguns de seus altos executivos, sob investigação criminal formal por homicídio involuntário no acidente com o Airbus A330 operado pela Air France, que atravessou uma forte tempestade no trajeto Rio-Paris, matando todas as 228 pessoas a bordo.

A controvérsia desencadeada pela criminalização do erro deve ser o foco das atenções durante uma conferência sobre segurança que ocorre esta semana em Madri, patrocinada por um braço da Organização das Nações Unidas e com a participação de representantes da indústria, bem como reguladores dos Estados Unidos e da Europa.

As sessões têm como objetivo avaliar como processos criminais – e a divulgação ao público de dados confidenciais – ameaçam reduzir o nível de segurança ao aumentar à resistência à divulgação voluntária de equívocos. A melhora da segurança aérea cada vez mais depende da análise de incidentes que fornecem pistas de ameaças incipientes.

Mas "os processos criminais jogam uma nuvem negra sobre aqueles que pretendem participar de programas voluntários de informações de segurança", diz Kenneth Quinn, que lidera o departamento de aviação no escritório de advocacia Pillsbury Winthrop Shaw Pittman LLP, de Washington. "Não só estamos vendo mais investigações criminais", mas "cada vez mais tornou-se norma sempre que um grande acidente acontece na Europa." Quinn também é consultor geral da organização não governamental Fundação para Segurança de Voo, uma das entidades contrárias à criminalização.

As últimas medidas destacam o aumento das preocupações de líderes de sindicatos de pilotos e especialistas em segurança sobre a tendência mundial de responsabilizar criminalmente pilotos, executivos, mecânicos e outras pessoas por acidentes fatais. Críticos alegam que processos desse tipo frequentemente fazem com que os agentes de justiça busquem – e tornem públicos – dados de segurança anteriormente confidenciais.

A Organização de Aviação Civil Internacional, um braço das ONU que estabelece padrões internacionais de segurança e políticas de aviação comercial, está criando uma força-tarefa para recomendar formas de proteção de dados. Uma meta é "educar e sensibilizar juízes e promotores sobre os perigos dos longos processos criminais", de acordo com Quinn, que participa do programa.

As causas do acidente com a Air France em junho de 2009 permanecem um mistério. Os investigadores ainda não identificaram a provável causa, em parte porque os dados do voo e os gravadores da cabine, mais conhecidos como caixas-pretas, não foram recuperados.

Fernand Garnault, um advogado da Air France, disse na sexta-feira que o magistrado francês deu a entender que a companhia pode ter tido alguma responsabilidade por não ter alertado os pilotos antes do acidente sobre as potenciais falhas dos sensores de velocidade aérea. Um porta-voz da aérea, que pertence à Air France-KLM SA, afirmou que não existe "nenhuma base" para a decisão do magistrado, que estava a um passo de processar formalmente a empresa.

"Nossa preocupação é que a companhia seja responsabilizada antes que haja evidências" de especialistas confiáveis, disse um porta-voz da Airbus, uma unidade da European Aeronautic Defence & Space Co. "Para proteger nossa imagem, temos que explicar para as pessoas em outros países que é assim que as coisas funcionam na França."

Entre 1989 e 2009, ocorreram 41 processos criminais resultantes de acidentes com companhias aéreas ou jatos executivos no mundo todo, de acordo com o livro "Flying in the Face of Criminalization", publicado em 2010 e co-escrito por Andreas Mateou, um piloto comercial. Pelo menos 20 investigações foram conduzidas na última década.

Os acidentes aéreos se tornaram tão raros que, quando um acontece, a "sociedade exige a prestação de contas de uma forma ou de outra", disse Mateo durante uma conferência recente em Istambul.

Antes da queda do avião da Air France em 2009, a aeronave enviou uma série de mensagens automáticas revelando problemas com certos sensores de velocidade, seguidas por vários sinais de outros sérios problemas com os computadores e controles de voo. Uma nova busca das caixas-pretas está programada para começar em breve.

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