Rússia interrompe entrega de gás para Polônia e Bulgária

A Polônia e a Bulgária foram informadas nesta terça-feira (26/04) pela companhia estatal russa Gazprom que seu fornecimento de gás natural russo seria interrompido a partir desta quarta-feira. Os dois países, assim como outros da União Europeia, recusaram-se a pagar pelo gás natural em rublos, uma exigência de Moscou para estabilizar e impulsionar sua moeda diante das sanções do Ocidente.

Além disso, a Polônia tem oferecido grande apoio à Ucrânia – é a nação que acolheu o maior número de refugiados da guerra, serve de rota de transporte para armas enviadas por países do Ocidente à Ucrânia e, nesta semana, confirmou que enviará tanques para Kiev.

O primeiro-ministro polonês, Mateusz Morawiecki, afirmou que Moscou estava tentando chantageá-lo, mas garantiu que seu país havia se preparado e diversificado suas fontes de energia. Segundo ele, as instalações de armazenamento de gás polonesas estão 76% cheias.

A ministra do Clima da Polônia, Anna Moskwa, afirmou: "Não haverá falta de gás nos lares poloneses." A Polônia recebe mais de 45% de seu gás da Rússia por meio do gasoduto Yamal, mas sua geração de eletricidade depende mais da queima de carvão do que do gás. O Yamal transporta gás natural russo para a Polônia e a Alemanha, por meio de Belarus.

A empresa polonesa de gás natural PGNiG anunciou que a Gazprom deixaria de fazer entregas na Polônia a partir desta quarta-feira. No Twitter, a companhia escreveu: "A empresa monitora a situação e está preparada para vários cenários".

A Polônia também importa gás por meio de portos no Mar Báltico e planeja começar a receber gás da Noruega no final deste ano, após a conclusão de um gasoduto de 900 quilômetros – Varsóvia espera que a Noruega possa fornecer cerca da metade do gás de que o país necessita.

Primeiro-ministro búlgaro vai a Kiev nesta quarta

A Bulgária, que era aliada de Moscou até a troca de seu governo por um líder de perfil liberal em dezembro de 2021, também disse ter sido informada sobre a interrupção a partir de quarta-feira do fornecimento de gás russo, que chega ao país por meio do gasoduto TurkStream.

O governo búlgaro afirmou que não haverá restrições ao consumo de gás, apesar de 90% do suprimento de gás para o país vir hoje da Rússia.

Na segunda-feira, parlamentares da Bulgária anunciaram um acordo para substituir integralmente as importações de gás russo por meio de um gasoduto que passa pela Grécia, a partir do verão europeu deste ano.

A Bulgária tem hesitado em oferecer apoio militar à Ucrânia, mas o primeiro-ministro Kiril Petkov e membros de seu governo irão a Kiev nesta quarta-feira para conversar com integrantes do governo ucraniano sobre a possível ajuda ao país.

UE acusa Rússia de chantagem ao cortar gás a países europeus

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, recebeu com indignação o anúncio de que a Rússia interromperá a partir desta quarta-feira (27/04) seu fornecimento de gás natural para a Polônia e a Bulgária, ambos membros da União Europeia (UE), mas garantiu que o bloco já estava preparado para eventuais cortes e planeja uma resposta "coordenada".

"O anúncio da Gazprom [companhia estatal russa de energia] de que está interrompendo unilateralmente o fornecimento de gás a clientes na Europa é mais uma tentativa da Rússia de usar o gás como instrumento de chantagem", disse Von der Leyen em comunicado. Segundo a chefe do Executivo europeu, a medida é "injustificada e inaceitável" e "mostra mais uma vez a falta de confiabilidade da Rússia como fornecedora de gás".

Von der Leyen acrescentou que a UE fez planos de contingência para tal situação e que negociações de crise ocorrem neste momento em Bruxelas. "Estamos preparados para esse cenário. Estamos em estreito contato com todos os Estados-membros", declarou.

"Estamos elaborando nossa resposta coordenada da União Europeia. Também continuaremos trabalhando com parceiros internacionais para garantir fluxos alternativos. E continuarei trabalhando com líderes europeus e mundiais para garantir a segurança do abastecimento de energia na Europa", garantiu a presidente da Comissão Europeia.

"Os europeus podem confiar que estamos unidos e em total solidariedade com os Estados-membros impactados por esse novo desafio. Os europeus podem contar com o nosso total apoio." A Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês), sediada em Paris, também condenou o anúncio da Rússia, tachando a medida de "armamentização do fornecimento de gás".

"A decisão da Gazprom de cortar completamente o fornecimento de gás para a Polônia é mais um sinal da politização por parte da Rússia dos acordos existentes e só irá acelerar os esforços europeus para se afastar do fornecimento de energia russa", escreveu no Twitter o diretor executivo da IEA, Fatih Birol.

Cortes de gás

A Polônia e a Bulgária foram informadas na terça-feira pela russa Gazprom que seu fornecimento de gás natural russo seria interrompido a partir desta quarta. A medida de Moscou foi vista como uma escalada dramática em um conflito que está se tornando cada vez mais uma batalha contra o Ocidente.

Os dois países, assim como outros da União Europeia, recusaram-se a pagar pelo gás natural em rublos, uma exigência de Moscou para estabilizar e impulsionar sua moeda diante das sanções do Ocidente em meio à guerra na Ucrânia.

Além disso, a Polônia tem oferecido grande apoio à Ucrânia – é a nação que acolheu o maior número de refugiados da guerra, serve de rota de transporte para armas enviadas por países do Ocidente à Ucrânia e, nesta semana, confirmou que enviará tanques para Kiev. Já a Bulgária era aliada de Moscou até a troca de seu governo por um líder de perfil liberal em dezembro de 2021.

O país tem hesitado em oferecer apoio militar à Ucrânia, mas o primeiro-ministro Kiril Petkov e membros de seu governo irão a Kiev nesta quarta-feira para conversar com integrantes do governo ucraniano sobre possível ajuda ao país.

Enquanto a Polônia conta com amplo armazenamento de gás natural e em breve se beneficiará de dois novos gasodutos, a Bulgária obtém mais de 90% de seu gás da Rússia, mas autoridades do país disseram que já trabalham para encontrar outras fontes, como o Azerbaijão.

Como a Rússia busca substituir UE na venda de gás e petróleo

A Rússia é o maior exportador de petróleo e gás natural do mundo. De acordo com a Agência Internacional de Energia, 45% do orçamento russo em 2021 veio das receitas geradas por essas exportações. E a União Europeia (UE) é um dos melhores clientes dos russos.

No ano que terminou em outubro de 2021, a Administração de Informações sobre Energia dos Estados Unidos (EIA) afirmou que 49% do petróleo bruto e condensado russo foi exportado para países europeus da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Com relação ao gás natural, três quartos destas exportações foram para nações europeias neste mesmo período.

Apesar desta estreita relação comercial, a invasão da Ucrânia e as crescentes evidências de crimes de guerras levaram à UE a acelerar os planos de reduzir a dependência dos combustíveis fósseis russos. No entanto, ainda não está claro quão rápido e em qual extensão países europeus como a Alemanha e Itália podem fazer isso.

Porém, se os planos da Comissão Europeia para atingir a independência dos combustíveis russos "bem antes de 2030" derem certo, a Rússia precisará urgentemente de novos clientes.

Mercados asiáticos

Moscou provavelmente precisará se concentrar em aumentar as vendas para países que não lhe impuseram sanções, como a China. O país asiático já é o maior cliente russo fora da Europa, adquirindo a maioria dos 38% do petróleo russo exportado para a Ásia e Oceania em 2021.

A Rússia é atualmente o segundo maior fornecedor de petróleo da China, atrás da Arábia Saudita, mas especialistas acreditam que um dos principais objetivos de Moscou é ultrapassar o país do Oriente Médio no mercado chinês.

"A dinâmica mais interessante da perspectiva do mercado de energia que veremos neste ano é como a Rússia tenta deslocar as relações comerciais de longa data do Oriente Médio para o Leste Asiático", avalia Fernando Ferreira, analistas de risco geopolítico da Rapidan Energy Group.

Outro alvo de Moscou deve ser a Índia. O país de 1,38 bilhões de habitantes é o terceiro maior consumidor de petróleo do mundo e depende principalmente das importações. O Iraque, a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos são os maiores fornecedores do mercado indiano. Em 2021, a Rússia respondeu apenas por 2% das importações indianas.

A Índia não condenou a Rússia pela invasão da Ucrânia, e, em março e abril, aumentou significativamente a compra de petróleo russo. Como diversos países estão evitando e reduzindo as importações russas, as refinarias indianas viram uma oportunidade para conseguir bons descontos. De acordo com Margarita Balmaceda, pesquisadora associada do Centro Davis para Estudos Russos e da Eurásia da Universidade de Harvard, duas grandes refinarias indianas compraram recentemente uma carga de petróleo grande da Sokol depois dela ter sido rejeitada por vários países.

Há, porém, dúvidas sobre até que ponto a Índia e a China pode substituir a atual demanda europeia. Ferreira destaca que as relações comerciais entre o Oriente Médio e as nações asiáticas são cultivadas há décadas. "Ambos serão cautelosos em fechar completamente as portas aos países do Oriente Médio em favor dos barris russos".

O especialista acrescenta que outro problema será a capacidade da Rússia para comprar equipamentos e tecnologia necessários para a produção devido aos impactos das sanções.

Barreiras para a exportação de gás

Apesar destas dificuldades, será mais fácil para a Rússia achar compradores para seu petróleo do que para o gás, pois o país demanda de gasodutos para escoar o produto e sua capacidade de produção de GNL (gás natural liquefeito) ainda está muito aquém do a de seus concorrentes.

Aqui a China também é a maior aposta russa para substituir os mercados europeus. Em fevereiro, Pequim e Moscou anunciaram um contrato de 30 anos para a Rússia fornecer gás à China por meio de um novo gasoduto. Também foi acordado que as vendas serão feitas em euro.

Moscou investe ainda no Paquistão, onde assinou um contrato para construir um gasoduto para transportar GNL da cidade portuária Karachi até o norte do país. Como a vizinha Índia, o Paquistão não condenou a Rússia pela invasão da Ucrânia.

Balmaceda afirma que a retórica russa sobre mudar os volumes de exportação de gás do Ocidente para o Oriente não condiz com o que é verosímil. "Na realidade, esses projetos precisam de financiamento maciço, e se não houver financiamento, eles não saem do papel", acrescenta.

Segundo a especialistas, em teoria, a Rússia poderia construir a infraestrutura necessária para abastecer a China e a Índia, mas isso exigiria um alto investimento, algo que não parece realista dadas as perspectivas econômicas do país.

Para Ferreira, a única opção realista de mercado para o gás russo na Ásia é a China, por meio de gasodutos já existentes ou novos. "Isso vai demorar um pouco. Portanto, não há solução de curto prazo para o gás russo".

Perdendo poder

A longo prazo, Ferreira avalia que a Rússia deixará de ser um ator importante no mercado global de energia. "Eles deixarão de ser a potência energética que são atualmente. Não porque não tem recursos, mas porque simplesmente não terão acesso a mercados e tecnologias". Balmaceda, porém, não tem tanta certeza se esse realmente será o futuro da Rússia.

A especialista acredita que a energia russa pode voltar a ser uma opção para os mercados europeus, a menos que uma coalizão forte o suficiente de grupos de interesses contrários aos combustíveis fósseis russos – por exemplo, produtores de carvão, de GNL ou energias renováveis – possam convencer os políticos de ficarem longe da energia russa a longo prazo.

Ela cita o exemplo dos chamados custos irrecuperáveis – onde foi investido dinheiro que não pode ser recuperado – como um dos argumentos que algumas empresas podem usar como uma razão econômica para continuar importando gás da Rússia. Balmaceda também lembra que alguns países da Europa Central e Oriental, como Hungria e Sérvia, estão dispostos a continuar comprando gás russo.

Na quarta-feira, o primeiro-ministro húngaro, Vikto Orbán, disse que a Hungria está disposta a atender as exigências de Vladimir Putin e pagar pelo gás importando do país em rublos. "São países relativamente pequenos, mas ainda assim é perturbador que isso esteja acontecendo", afirma Balmaceda.

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