Relação Venezuela-Irã indefinida em caso de morte de Chávez

Larry Luxner

Sob a administração Chávez, a República Bolivariana da Venezuela se alinhou politicamente com a República Islâmica do Irã, uma das nações islâmicas mais conservadoras do mundo.

Chávez, 58 anos, também incentivou a crescente amizade do Irã com aliados como Bolívia, Cuba, Equador e Nicarágua. Todavia, com a permanência do presidente em um hospital em Havana, onde se recupera de um câncer, não se sabe se o Irã continuará a ter muita influência na América Latina a longo prazo.

Por enquanto, pelo menos, “tudo ficará na mesma”, disse o analista venezuelano Robert Bottome, editor do semanário VenEconomy, ao Diálogo em entrevista por telefone em Caracas.

“Todo mundo está falando sobre diferentes facções competindo pelo poder e, em um ano ou mais, isso pode fazer muita diferença”, disse Bottome referindo-se ao sucessor escolhido por Chávez, o vice-presidente Nicolás Maduro, e Diosdado Cabello, líder da Assembleia Nacional da Venezuela. “Porém, no curto prazo, todos eles têm um tremendo interesse em manter o status quo.”

Bottome acrescentou que “falando objetivamente, a Venezuela não está ganhando nada. Mas ao assumir somos um dos países que se opõem aos imperialistas, então a aliança com o Irã faz bastante sentido. Por que eles iriam querer mudar as relações com o Irã? É muito produtivo para ambos os lados”.

Em 10 de janeiro – o dia em que Chávez deveria ter assumido seu quarto mandato de seis anos – milhares de simpatizantes encenaram uma posse simbólica, com os ânimos exaltados pela presença de três chefes de Estado latino-americanos: Evo Morales, da Bolívia, Daniel Ortega, da Nicarágua, e José Mujica, do Uruguai.

Chávez visita Teerã com frequência

Por anos, a crescente amizade entre Chávez e o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, deixou os observadores apreensivos nos Estados Unidos e na América Latina, pois os dois líderes têm utilizado a riqueza do petróleo de seus países para disseminar uma mensagem antiocidente e, mais especificamente, anti-Israel.

No fim de dezembro, o presidente Barack Obama sancionou a Lei de Combate à Influência do Irã no Hemisfério Ocidental – que obriga o Departamento de Estado a desenvolver uma estratégia dentro de 180 dias “direcionada à crescente presença e atividade hostil do Irã” na região.
 

A lei também urge o Departamento de Segurança Interna a reforçar a vigilância nas áreas de fronteira dos EE.UU. com Canadá e México “para prevenir que militantes do Irã, a Guarda Revolucionária Iraniana, sua Força Quds, o Hezbollah e qualquer outra organização terrorista entrem nos Estados Unidos”. Além disso, a nova lei ressalta um plano de ação multiagências para proporcionar segurança nesses países, juntamente com um “plano antiterrorista e antirradicalização” para isolar o Irã e seus aliados.

Hoje, o Irã possui 11 embaixadas na região, quando em 2005 eram cinco, e 17 centros culturais; além da Venezuela, o país possui fortes laços com Bolívia, Equador e Nicarágua.

Analista: Mudança drástica na Venezuela é ‘improvável’

Desde que assumiu a presidência em 1999, Chávez fez nove viagens ao Irã. Seu governo assinou mais de 200 acordos com Ahmadinejad, incluindo joint ventures em uma fábrica de moldes plásticos, um banco binacional e um fundo binacional de US$1 bilhão (R$ 2 bilhões), assim como um acordo para treinar 200 iranianos como técnicos petrolíferos.

Além disso, o Irã investiu em uma fábrica de automóveis em Valencia e em outra fábrica de tratores em Ciudad Bolívar; reportagens também falam de contratos iranianos para a construção de apartamentos para moradores de baixa renda em Caracas. E, em 2007, os dois países estabeleceram voos regulares entre Caracas e Teerã através da Conviasa Airlines.

Jaime Daremblum, ex-embaixador da Costa Rica nos Estados Unidos e hoje diretor de programas latino-americanos do Instituto Hudson, concorda com Bottome.

“O Irã tem um papel importante na Venezuela e as pessoas que são próximas ao regime compartilham esse relacionamento”, disse. “Uma mudança muito drástica teria de ocorrer no governo venezuelano e eu não vejo isso ocorrendo por ora. Os chavistas, mesmo sem Chávez, provavelmente continuarão por algum tempo.”

Daremblum acrescentou: “Se Chávez vier a morrer e o regime continuar, eu não posso antecipar nenhuma mudança vis-à-vis com os outros países”, declarou. “Além disso, as relações que o Irã tem com outros países da América Latina não dependem de sua relação com a Venezuela”.

Presidente do Equador é considerado um ‘irmão e amigo’ do Irã

Um desses outros países é o Equador, que Ahmadinejad visitou em janeiro de 2012, cinco anos após sua primeira visita à região. Durante a viagem do ano passado, ele fez um sinal “V” de vitória para admiradores enquanto passava pelas ruas de Quito em um conversível.

Durante entrevista coletiva, Ahmadinejad chamou o presidente Rafael Correa de “um irmão e amigo”. Mais tarde, os dois líderes assinaram um acordo para estreitar a cooperação econômica e financeira.

O Irã abriu uma embaixada em Quito em 2009 e está investindo em diversos projetos, incluindo usinas hidrelétricas. Em contrapartida, o Equador recebeu preferências comerciais para exportações agrícolas ao Irã, enquanto Teerã prometeu fornecer a seu novo amigo até US$ 400 milhões (R$ 800 milhões) em derivados de petróleo.

“O benefício comercial das relações com o Irã tem sido pequeno”, disse Juan Carlos Donoso, professor de ciência política na Universidad San Francisco, em Quito. “Eu não acho que isso justifique enlamear o nome do Equador perante a comunidade internacional.”

Além do simbolismo de desafiar o Ocidente, esse estreitamento do Irã faz parte da vontade do Equador de abrir novos mercados, afirmou Donoso. Embora os Estados Unidos permaneçam como o principal parceiro comercial do Equador, a China tornou-se uma grande investidora no país, ao mesmo tempo em que o governo de Quito também está buscando a Rússia e outros parceiros comerciais com os quais não tem tradição.

Bolívia também se aproxima do Irã

Nos últimos anos, a Bolívia também tornou-se uma forte aliada tanto da Venezuela quanto do Irã. Em maio do ano passado, o ministro da Defesa iraniano, Ahmad Vahidi, visitou o país andino para inaugurar a nova Escola de Defesa da Alternativa Bolivariana para as Américas (ALBA), um bloco econômico comercial fundado por Chávez e pelo ex-líder de Cuba, Fidel Castro.

Em junho, Ahmadinejad fez sua terceira visita à Bolívia desde que os dois países estabeleceram relações diplomáticas em 2007, assinando um memorando de entendimento nas áreas de agricultura, hidrocarbonetos, petroquímicos e saúde. Morales visitou Teerã duas vezes, uma em 2008 e novamente em 2010.

Ilan Berman, vice-presidente do Conselho de Política Externa Americano, disse que o Irã enviou entre 50 a 300 membros da Guarda Revolucionária Islâmica à Bolívia para servir como treinadores na escola.

“O envolvimento do Irã com a escola da ALBA serve como um microcosmo da relação Irã-Bolívia tornado evidente”, advertiu Berman. “De fato, os especialistas regionais agora estimam que a Bolívia pode acabar tornando-se tão significativa quanto a Venezuela no Irã. Assim, ambos os países podem ser uma fonte de recursos estratégicos para expandir o programa nuclear iraniano e um centro onde o regime do país pode expandir atividades assimétricas nas Américas.”

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